Passagens sobre Razão

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Frases sobre razão, poemas sobre razão e outras passagens sobre razão para ler e compartilhar. Leia as melhores citações em Poetris.

Os Gostos

A palavra «gosto» tem vários significados e é fácil o engano. Há uma diferença entre aquele gosto que nos leva a escolher coisas e aquele que nos leva a conhecer e discernir as qualidades quando se segue as regras. Podemos gostar de comédias sem ter um gosto tão apurado e delicado que nos permita ajuizar do seu valor, como podemos ter o bom gosto para emitir juízos sobre as comédias, sem gostar desse género dramático. Existe um tipo de gosto que nos aproxima imperceptivelmente do que temos à nossa frente, há outros que nos prendem pela sua força e duração.
Também há pessoas que têm mau gosto em tudo, outras só nalgumas coisas, mas ambos os casos têm esse direito, no que toca ao alcance que cada um tem. Outros ainda têm gostos particulares, que sabem que são maus, sem deixarem de segui-los. Há aqueles que têm gostos imprecisos e estes deixam que o acaso decida por eles. Mudam com ligeireza e ficam contentes ou maçam-se com o que os seus amigos dizem. Outros são sempre previstos, sendo escravos de todos os seus gostos, respeitando-os em todas as matérias. Há quem seja sensível ao bem e que se choque com o que é mau.

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O Amor é a Mais Forte das Paixões

Por que é que gozamos com cada nova beleza que descobrimos no que amamos? Porque cada nova beleza nos dá a inteira e total satisfação de um desejo. Se a queremos sensível ela será sensível. Se em seguida a queremos orgulhosa como a Émilie de Corneille, embora estas duas qualidades sejam provavelmente incompatíveis, ela aparece imediatamente com uma alma romana. É esta a razão moral porque o amor é a mais forte das paixões. Nas outras, os desejos têm que se acomodar às tristes realidades; nesta, são as realidades que se apressam a identificar-se com os desejos; ela é, portanto, a paixão em que os desejos violentos têm uma maior realização.

O Peso Bruto da Irritação

Se fôssemos contabilizar as paixões desta vida, os ódios e os amores, os grandes sobressaltos, as comoções, os transtornos, os arrebatamentos e os arroubos, os momentos de terror e de esperança, os ataques de ansiedade e de ternura, a violência dos desejos, os acessos de saudade e as elevações religiosas e se as somássemos todas numa só sensação, não seria nada comparada com o peso bruto da irritação. Passamos mais tempo e gastamos mais coração a sermos irritados do que em qualquer outro estado de espírito.
Apaixonamo-nos uma vez na vida, odiamos duas, sofremos três, mas somos irritados pelo menos vinte vezes por dia. Mais que o divórcio, mais que o despedimento, mais que ser traído por um amigo, a irritação é a principal causa de «stress» — e logo de mortalidade — da nossa existência.
É a torneira que pinga e o colega que funga, a criança que bate com o garfinho no rebordo do prato, a empregada que se esquece sempre de comprar maionnaise, a namorada que não enche o tabuleiro de gelo, o namorado que se esquece de tapar a pasta dentrífica, a nossa própria incompetência ao tentar programar o vídeo, o homem que mete um conto de gasolina e pede para verificar a pressão dos pneus,

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Segundo a definição dos estóicos, a sabedoria consiste em ter a razão por guia; a loucura, pelo contrário, consiste em obedecer às paixões; mas para que a vida dos homens não seja triste e aborrecida Júpiter deu-lhe mais paixão que razão.

A Arte da Retórica Floresce nas Sociedades Decadentes

Um retórico do passado dizia que o seu ofício era fazer que as coisas pequenas parecessem grandes e como tais fossem julgadas. Dir-se-ia um sapateiro que, para calçar pés pequenos, sabe fazer sapatos grandes. Em Esparta ter-lhe-iam dado a experimentar o azorrague por professar uma arte trapaceira e mentirosa. E creio que Arquidamo, que foi seu rei, não terá ouvido sem espanto a resposta de Tucídides, ao qual perguntara quem era mais forte na luta, se Péricles, se ele: «Isso será difícil de verificar, pois quando o deito por terra, ele convence os espectadores que não caiu, e ganha». Os que, com cosméticos, caracterizam e pintam as mulheres fazem menos mal, pois é coisa de pouca perda não as ver ao natural, ao passo que estoutros fazem tenção de enganar, não já os olhos, mas o nosso juízo, e de abastardar e corromper a essência das coisas. Os Estados que longamente se mantiveram em boa ordem e bem governados, como o cretense e o lacedemónio, não tinham em grande conta os oradores.
Aríston definiu sabiamente a retórica como a ciência de persuadir o povo; Sócrates e Platão, como a arte de enganar e lisonjear; e aqueles que isto negam na sua definição genérica,

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Oh, a dedicação, a estima, a generosidade. A razão fundamental por que os cães são estimados é que a sua carne não é boa para comer.

Sou Lúcido

Cruzou por mim, veio ter comigo, numa rua da Baixa
Aquele homem mal vestido, pedinte por profissão que se lhe vê na cara,
Que simpatiza comigo e eu simpatizo com ele;
E reciprocamente, num gesto largo, transbordante, dei-lhe tudo quanto tinha
(Exceto, naturalmente, o que estava na algibeira onde trago mais dinheiro:
Não sou parvo nem romancista russo, aplicado,
E romantismo, sim, mas devagar…).

Sinto uma simpatia por essa gente toda,
Sobretudo quando não merece simpatia.
Sim, eu sou também vadio e pedinte,
E sou-o também por minha culpa.
Ser vadio e pedinte não é ser vadio e pedinte:
É estar ao lado da escala social,
É não ser adaptável às normas da vida,
‘As normas reais ou sentimentais da vida –
Não ser Juiz do Supremo, empregado certo, prostituta,
Não ser pobre a valer, operário explorado,
Não ser doente de uma doença incurável,
Não ser sedento da justiça, ou capitão de cavalaria,
Não ser, enfim, aquelas pessoas sociais dos novelistas
Que se fartam de letras porque tem razão para chorar lagrimas,
E se revoltam contra a vida social porque tem razão para isso supor.

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Dostoievski Mais Moderno Que Tolstoi

Qual a razão porque sentimos que o romance de Dostoievski é mais moderno, por exemplo, que o de Tolstoi? Porque os personagens de Tolstoi quase nunca são o próprio Tolstoi, enquanto os personagens de Dostoievski são quase sempre o próprio Dostoievski. Por outras palavras, interessamo-nos mais pelo escritor que pelas suas criaturas. Procurar-se-ia inútilmente em Dostoievski a descrição completa duma sociedade como em Guerra e Paz. O grande problema para ele é o de dar consistência humana aos seus mais misteriosos e contraditórios instintos. É um facto que recentemente tem havido um grande falatório acerca do subconsciente a propósito de Dostoievski. Mas não acreditamos que a psicanálise tenha alguma coisa a ver com a arte, todavia a tentativa de exegese psicanalítica indica a validade de elementos puramente subjectivos perante os quais cai qualquer hipótese de verosimilhança.

Ocupação Feliz

Resolvi examinar as diversas ocupações que as pessoas têm na vida, procurando escolher a melhor entre elas; e, sem desejar dizer algo a respeito delas, concluí que não poderia fazer nada melhor do que continuar naquela que encontrei para mim, ou seja, ocupando toda a minha vida no cultivo da razão e na busca do conhecimento da verdade, seguindo o Método que prescrevi a mim mesmo. Eu senti um contentamento tão profundo desde que comecei a usar esse Método, que não acreditava que alguém pudesse obter algo mais doce ou mais inocente nesta vida; e, ao continuar a descobrir, a cada dia, por meio dele, verdades que me pareciam dotadas de certa importância e das quais os outros não estavam em geral cientes, a satisfação que senti preencheu a minha mente de maneira tão plena que nada mais de modo nenhum me afectava.

Os homens receiam a morte pela mesma razão por que as crianças têm medo das trevas: porque não sabem do que se trata.

Xácara do Infinito

Fazia papa-luaça
com lama azul dos paúis;
e embaciava a vidraça;
ou de olhos baços, azuis,
parados, largos, serenos,
como o silêncio dos mudos,
ou fitos, picos, pequenos,
venenos de ângulos agudos.

Ou gargalhava estridente
como um riscar de repente
de uma faúlha de luz
em escuros de urros e uuus
que arrefecia os cabelos!
E a dissonância em novelos
rolava fundo e medonho
a meio do chão:.. Catrapuz!…
como um vómito de luz
a estoirar dentro dum sonho!

Ou escancarava a vidraça
a rir pedradas de lata;
mas logo o feixe-desfeixe
porque a lata se desata
e cai em pata de pata
na lájea das cousas mortas
das mortas noites sem portas!

E logo a Noite corria,
e a vista via… – não via:
porque entre o ver e o não ver
há uma distância a correr
que pode ser… – ou não ser
uma distância a valer!

Aquele espaço intervalo
dum cabelo ou duma unha
à sensação de ter unha
é uma distância a cavalo
como a distância da unha
ao movimento da unha!

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As Verdadeiras Necessidades não Têm Gostos

Nenhum conselho me parece mais útil para te dar do que este (e que nunca é demais repetir!): limita sempre tudo aos desejos naturais que tu podes satisfazer com pouca ou nenhuma despesa, evitando, contudo, confundir vícios com desejos. Porventura te interessa saber em que tipo de mesa, em que baixela de prata te é servida a refeição, ou se os escravos te servem com bom ritmo e solicitude? A natureza só necessita de uma coisa: a comida. (…) A fome dispensa pretensões, apenas reclama ser saciada, sem cuidar grandemente com quê. O triste prazer da gula vive atormentado na ânsia de continuar com vontade de comer mesmo quando saciado, de buscar o modo como atulhar, e não apenas encher o estômago, de achar maneira de excitar a sede extinta logo à primeira golada! Tem, por isso toda a razão Horácio quando diz que a sede não se interessa pela espécie de copo ou pela elegância da mão que o serve.
Se achas que têm para ti muita importância os cabelos encaracolados do escravo, ou a transparência do copo que te põe à frente, é porque não estás com sede. Entre outros benefícios que devemos à natureza conta-se este,

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Aborrecido de Estudar

Enfastiavam-me as aulas, salvo as de literatura — que aprendia de cor — e tinha nelas um protagonismo único. Aborrecido de estudar, deixava tudo à mercê da boa sorte. Tinha um instinto próprio para pressentir os pontos álgidos de cada matéria e quase adivinhar os que mais interessavam aos professores para não estudar o resto. A realidade é que não entendia por que devia sacrificar engenho e tempo em matérias que não me interessavam e, pela mesma razão, não me iam servir para nada numa vida que não era minha.

Atrevi-me a pensar que a maioria dos meus professores me classificava mais pela minha maneira de ser do que pelos meus exames. Salvavam-me as minhas respostas imprevistas, as minhãs ideias dementes, as minhas invenções irracionais. No entanto, quando acabei o quinto ano, com sobressaltos académicos que não me sentia capaz de superar, tomei consciência dos meus limites. O bacharelato tinha sido até então um caminho empedrado de milagres, mas avisava-me o coração que no final do quinto me esperava uma muralha intransponível. A verdade sem adornos era que me faltava já a vontade, a vocação, a ordem, o dinheiro e a ortografia para embarcar numa carreira académica. Melhor dizendo: os anos voavam e não fazia a mínima ideia do que ia fazer da minha vida,

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Ouvir a Voz Interior

Não preste atenção ao que os outros dizem, ao que eles lhe dizem para ser. Escute sempre a sua voz interior, aquilo que gostaria de ser; de outro modo desperdiçará toda a sua vida. A sua mãe quer que seja engenheiro, o seu pai quer que seja médico e você quer ser poeta. Que fazer? É evidente que a mãe tem razão, porque ser engenheiro é mais interessante do ponto de vista económico e financeiro. O pai também tem razão; ser médico é uma boa mercadoria, tem um valor de mercado. Um poeta? Enlouqueceste? És doido? Os poetas são uma raça maldita. Ninguém os quer. Não há necessidade nenhuma deles; o mundo pode existir sem poesia — não haverá qualquer problema lá por não haver poesia. O mundo não pode existir sem engenheiros; o mundo precisa de engenheiros. Quando se é necessário, tem-se um valor. Quando não se é necessário, não se tem qualquer valor.

Mas se você quiser ser poeta, seja poeta. Poderá ser um pedinte – óptimo. Poderá não vir a ser muito rico, mas não se preocupe – porque de outro modo poderá vir a ser um grande engenheiro e poderá ganhar muito dinheiro, mas nunca se sentirá realizado.

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