Eu gosto daquilo que não faz sentido, porque acorda as células cerebrais. A fantasia é um ingrediente necessário à vida.
Passagens sobre Sentidos
1026 resultadosA Razão da Minha Esperança
Meu bom amigo,
Sei que tens sofrido bastante.
Não posso esquecer que um dia me ensinaste: que leal é quem não abandona; que devemos procurar ser pessoas dignas de confiança, mais do que tentar encontrar alguém assim; e, que a vontade de amar já é, em si mesma, amor.
Permite-me que partilhe contigo, hoje, algumas ideias a respeito dos momentos difíceis…
São muitas as provas que na vida servem para testar quem somos, a força que temos em nós e o nosso valor. Algumas vezes uma pedra gigante vem cair mesmo diante de nós… outras vezes são séries infindáveis de pequenos obstáculos no caminho… longas etapas que nos obrigam a seguir adiante sem descansar, em percursos onde quase nunca se vê o horizonte.
A agitação permanente em que vivemos leva muitos a desistir de encontrar referências mais adiante, mas é preciso que nos afastemos do tempo para assim encontrarmos a posição mais segura, elevando-nos acima dos momentos passageiros para os compreender melhor. No meio da confusão é preciso ver para além do que se pode olhar… estabelecer os alicerces sobre o que é sólido, ainda que seja preciso escavar muito mais fundo do que o normal…
O Pressuposto Indispensável para se Ser um Grande-Escritor
O pressuposto indispensável para se ser um grande-escritor é, então, o de escrever livros e peças de teatro que sirvam para todos os níveis, do mais alto ao mais baixo. Antes de produzir algum bom efeito, é preciso primeiro produzir efeito: este princípio é a base de toda a existência como grande-escritor. É um princípio miraculoso, eficaz contra todas as tentações da solidão, por excelência o princípio goethiano do sucesso: se nos movermos apenas num mundo que nos é propício, tudo o resto virá por si. Pois quando um escritor começa a ter sucesso dá-se logo uma transformação significativa na sua vida. O seu editor pára de se lamentar e de dizer que um comerciante que se torna editor se parece com um idealista trágico, porque faria muito mais dinheiro negociando com tecidos ou papel virgem. A crítica descobre nele um objecto digno da sua actividade, porque os críticos muitas vezes até nem são más pessoas, mas, dadas as circunstâncias epocais pouco propícias, ex-poetas que precisam de um apoio do coração para poderem pôr cá fora os seus sentimentos;são poetas do amor ou da guerra, consoante o capital interior que têm de aplicar com proveito, e por isso é perfeitamente compreensível que escolham o livro de um grande-escritor e não o de um comum escritor.
O Amor não Acontece. Decide-se.
Há quem julgue que o amor é alheio à vontade humana, algo superior que elege, embala e conduz… e que quase nada se pode fazer perante tamanha força. Isso é uma mera paixão no seu sentido menos nobre. E, nesse caso, sim, o amor acontece… Ao contrário, amar é estar acima das paixões e dos apetites. Mesmo quando o amor nasce de uma espontaneidade, resulta de um claro discernimento.
O amor decorre de uma decisão. De um compromisso. Constrói-se de forma consciente. Através do heroísmo de alguém livre que decide ser o que poucos ousam. Escolhe para fim de si mesmo ser o meio para a felicidade daquele a quem ama. Sim, decide-se amar e, sim, decide-se a quem amar.
O amor autêntico é raro e extraordinário, embora o seu nome sirva para quase tudo… a maior parte das vezes designa egoísmos entrelaçados, cada vez mais comuns. São poucos os que se aventuram, os que arriscam tudo, os que se dispõem a amar mesmo quando sabem que poucos sequer perceberão o que fazem, o seu porquê e o para quê.
O amor não supõe reciprocidade. Amar é dar-se por completo e aceitar tudo… não se contabilizam ganhos e perdas,
A esperança não será a prova de um sentido oculto da Existência., uma coisa que merece que se lute por ela?
Comparação de Obras de Arte
À questão de saber se se devem ou não fazer comparações quando se observam diferentes obras de arte gostaríamos de dar a resposta que se segue. O conhecedor que tem formação adequada deve comparar: a ideia paira à sua frente, apreendeu o conceito relativo ao que pode e ao que deve ser produzido. O amador, que é apanhado ainda no trajecto da sua formação, só tem a ganhar se não fizer comparações e se observar em separado cada realização: é assim que o seu gosto e o seu sentido do geral se irão formando a pouco e pouco. Quanto à comparação levada a cabo pelo não iniciado é apenas uma solução de facilidade que dispensa qualquer juízo.
A Alma do Amor
Quando um homem, quer tenda para os rapazes ou para as mulheres, encontra aquele mesmo que é a sua metade, é um prodígio como os transportes de ternura, confiança e amor os tomam. Eles não desejariam mais separar-se, nem por um só instante. E pensar que há pessoas que passam a vida toda juntas, sem poder dizer, diga-se de passagem, o que uma espera da outra; pois não parece que seja o prazer dos sentidos que lhes faça encontrar tanto encanto na companhia uma da outra. É evidente que a alma de ambas deseja outra coisa, que não pode dizer, mas que adivinha e deixa adivinhar.
É verdadeiro no mais puro sentido da palavra quem é verdadeiro em palavra, pensamento e acto
É verdadeiro no mais puro sentido da palavra quem é verdadeiro em palavra, pensamento e acto.
A Noite Suavemente Descia
A noite
Suavemente descia;
E eu nos teus braços deitádo
Até sonhei que morria.E via
Goivos e cravos aos mólhos;
Um Christo crucificado;
Nos teus olhos,
Suavidade e frieza;
Damasco rôxo, cinzento,
Rendas, velludos puídos,
Perfumes caros entornados,
Rumôr de vento em surdina,
Insenso, rézas, brocados;
Penumbra, sinos dobrando;
Vellas ardendo;
Guitarras, soluços, pragas,
E eu… devagar morrendo.O teu rosto moreninho,
Eu achei-o mais formoso,
Mas, sem lagrimas, enxuto;
E o teu corpo delgado,
O teu corpo gracioso,
Estava todo coberto de lucto.Depois, anciosamente,
Procurei a tua boca,
A tua boca sadía;
Beijámo-nos doidamente…
– Era dia!E os nossos corpos unidos,
Como corpos sem sentidos,
No chão rolaram… e assim ficaram!…
O Significado da Vida
Terá a vida algum significado, algum sentido ou valor? A pergunta é: a vida, viver, terá algum propósito? Será que viver nos fará chegar, um dia, a algum lado? Viver é um meio. A meta, o objetivo, esse lugar muito distante situado algures, é o fim. E é esse fim que lhe confere sentido. Se não houver um fim, a vida não terá, certamente, sentido, e será preciso criar um Deus para lhe dar sentido.
Primeiro, foi preciso separar os fins dos meios. Isto divide a nossa mente. A nossa mente está sempre a perguntar porquê? Para quê? E tudo o que não consegue dar uma resposta à pergunta «Para quê?» vai perdendo lentamente valor para nós. Foi assim que o amor se tornou algo sem valor. Que sentido faz o amor? Onde poderá levar-nos? Que alcançaremos com ele? Chegaremos a alguma utopia, a algum paraíso? É evidente que, encarado dessa maneira, o amor não faz nenhum sentido. É vão.Que sentido tem a beleza? Contemplamos um pôr do sol e ficamos deslumbrados com a sua grande beleza, mas qualquer idiota pode perguntar-nos, «Que significa um pôr do sol?», e não teremos uma resposta para lhe dar.
Para Além do Hoje
Cada vez mais se vive o momento. Fugimos do passado e temos medo do futuro, o que implica que somos forçados a viver um presente demasiado pequeno.
Os tempos de descanso devem ser ocasião de trabalho interior. Mas, vai sendo cada vez mais raro encontrar gente com memória, assim com também é raro encontrar pessoas com discernimento suficiente para se comprometerem em projetos a longo prazo.
Navega-se à vista… sem riscos, sem sucessos nem fracassos… sem sentido. Vamos dando as respostas mínimas ao mundo e aos outros, em vez de sermos protagonistas dos nossos sonhos e heróis apesar das nossas derrotas.
O passado e o futuro não são mentira. São partes da verdade. Sou o que fui e o que serei. Uma identidade que vive no tempo, uma coerência que se constrói através diferentes espaços e tempos, amando o que há de eterno em cada momento. Elevando o espírito acima da realidade concreta do mundo.Uma existência autêntica – uma vida com valor – constrói-se com uma estrutura sólida, equilibrada e aberta a horizontes mais longínquos em termos temporais. Um presente maior, com mais passado e mais futuro. Sermos quem somos, de olhos abertos.
O que é um Romance?
Um romance é aquilo que o autor quiser que seja. O Herberto Helder tem razão quando diz que está tudo misturado: não se sabe quando é que a poesia não dá origem a um romance, quando é que um ensaio não é um romance, quando é que no interior de um ensaio não aparece um poema… Não vejo por que é que essas coisas hão-de ser catalogadas. Há páginas de grandes romances que são grandes páginas de poesia. Bom, mas isto é mais um pressentimento que uma certeza, que o início de uma teoria… É uma interrogação. O meu problema é que sempre li mais prosa que poesia. Na verdade, a poesia aborrece-me mais. Não é bem isso… é no sentido de que ocupa um espaço muito menor nas minhas leituras.
A insensatez da juventude. Medo da juventude, medo da insensatez, do surgir sem sentido de uma vida inumana.
A Esperança da Humanidade
A vida política, porém, veio como um trovão desviar-me dos meus trabalhos. Regressei uma vez mais à multidão.
A multidão humana foi a maior lição da minha vida. Posso chegar a ela com a inerente timidez do poeta, com o receio do tímido; mas, uma vez no seu seio, sinto-me transfigurado. Sou parte da essencial maioria, sou mais uma folha da grande árvore humana.Solidão e multidão continuarão a ser deveres elementares do poeta do nosso tempo. Na solidão, a minha vida enriqueceu-se com a batalha da ondulação no litoral chileno. Intrigaram-me e apaixonaram-me as águas combatentes e os penhascos combatidos, a multiplicação da vida oceânica, a impecável formação dos «pássaros errantes», o esplendor da espuma marítima.
Mas aprendi muito mais com a grande maré das vidas, com a ternura vista em milhares de olhos que me viam ao mesmo tempo. Pode esta mensagem não ser possível a todos os poetas, mas quem a tenha sentido guardá-la-á no coração, desenvolvendo-a na sua obra.
É memorável e desvanecedor para o poeta ter encarnado para muitos homens, durante um minuto, a esperança.
Devo-te
Devo-te tanto como um pássaro
deve o seu voo à lavada
planície do céu.Devo-te a forma
novíssima de olhar
teu corpo onde às vezes
desce o pudor o silêncio
de uma pálpebra mais nada.Devo-te o ritmo
de peixe na palavra,
a genesíaca, doce
violência dos sentidos;
esta tinta de sol
sobre o papel de silêncio
das coisas – estes versos
doces, curtos, de abelhas
transportando o pólen
levíssimo do dia;
estas formigas na sombra
da própria pressa e entrando
todas em fila no tempo:
com uma pergunta frágil
nas antenas, um recado invisível, o peso
que as deixa ser e esquece;
e a tua voz que compunha
uma casa, uma rosa
a toda a volta – ó meu amor vieste
rasgar um sol das minhas mãos!
Cada Leitura é Única
Muitos autores são ao mesmo tempo os seus próprios leitores – à medida que escrevem -, e é por isso que tantos vestígios do leitor aparecem nos seus escritos – tantas observações críticas – tanto que pertence à província do leitor e não à do autor. Travessões – palavras em maiúsculas – passagens grifadas – tudo isso pertence à esfera do leitor. O leitor põe a ênfase como tem vontade – ele de facto faz de um livro o que deseja. Não é todo o leitor um filólogo? Não existe uma única leitura válida somente, no sentido usual. A leitura é uma operação livre. Ninguém me pode prescrever como e o que lerei.
A Perfeição
O que me tranquiliza é que tudo o que existe, existe com uma precisão absoluta. O que for do tamanho de uma cabeça de alfinete não transborda nem uma fração de milímetro além do tamanho de uma cabeça de alfinete. Tudo o que existe é de uma grande exatidão. Pena é que a maior parte do que existe com essa exatidão nos é tecnicamente invisível. Apesar da verdade ser exata e clara em si própria, quando chega até nós se torna vaga pois é tecnicamente invisível. O bom é que a verdade chega a nós como um sentido secreto das coisas. Nós terminamos adivinhando, confusos, a perfeição.
Anda-Me A Alma
Anda-me a alma inteira de tal sorte,
Meus gozos, meu pesar, nos dela unidos
Que os dela são também os meus sentidos,
Que o meu é também dela o mesmo norte.Unidos corpo a corpo — um elo forte
Nos prende eternamente — e nos ouvidos
Sentimos sons iguais. Vemos floridos
Os sons do porvir, em azul coorte…O mesmo diapasão musicaliza
Os seres de nos dois — um sol irisa
Os nossos corações — dá luz, constela…Anda esta vida, espiritualizada
Por este amor — anda-me assim — ligada
A minha sombra com a sombra dela.
A poesia é toda aquela forma da arte literária em que se recebe uma emoção estética por motivos independentes do sentido da frase.
Quando se usam palavrões sem ser com o sentido concreto que têm, é como se estivéssemos a desinfectá-los, a torná-los decentes, a recuperá-los para o convívio familiar.