Tenta cativar por aquilo que o teu silĂȘncio contĂ©m.
Passagens sobre SilĂȘncio
845 resultadosSobre um Poema
Um poema cresce inseguramente
na confusĂŁo da carne,
sobe ainda sem palavras, sĂł ferocidade e gosto,
talvez como sangue
ou sombra de sangue pelos canais do ser.Fora existe o mundo. Fora, a esplĂȘndida violĂȘncia
ou os bagos de uva de onde nascem
as raĂzes minĂșsculas do sol.
Fora, os corpos genuĂnos e inalterĂĄveis
do nosso amor,
os rios, a grande paz exterior das coisas,
as folhas dormindo o silĂȘncio,
as sementes Ă beira do vento,
– a hora teatral da posse.
E o poema cresce tomando tudo em seu regaço.E jå nenhum poder destrói o poema.
InsustentĂĄvel, Ășnico,
invade as Ăłrbitas, a face amorfa das paredes,
a miséria dos minutos,
a força sustida das coisas,
a redonda e livre harmonia do mundo.– Em baixo o instrumento perplexo ignora
a espinha do mistério.
– E o poema faz-se contra o tempo e a carne.
SilĂȘncio
Assim como do fundo da mĂșsica
brota uma nota
que enquanto vibra cresce e se adelgaça
atĂ© que noutra mĂșsica emudece,
brota do fundo do silĂȘncio
outro silĂȘncio, aguda torre, espada,
e sobe e cresce e nos suspende
e enquanto sobe caem
recordaçÔes, esperanças,
as pequenas mentiras e as grandes,
e queremos gritar e na garganta
o grito se desvanece:
desembocamos no silĂȘncio
onde os silĂȘncios emudecem.Tradução de Luis Pignatelli
Ele merece o meu silĂȘncio.
Aleluia
Se cantas, nasce o dia;
A luz segreda Ă flor: Ave, Maria!Tudo Ă© silĂȘncio, espanto,
Quando vaga no Azul o teu encanto…Passas e deixas no ar
O perfume das rosas de toucar!Creio em ti, como em Deus;
Viver Ă tua luz Ă© estar nos CĂ©us!Verdes enleios de hera
Cingem de amor teu vulto, Ăł Primavera!Nos perdidos caminhos,
Voam gorjeios, mĂșsicas dos ninhos…A Terra em nĂ©voas de ouro
Ascende a Deus em teu olhar de choro!Senhora da Harmonia,
Em ti a minha vida principia!Se voas pela Altura,
Gravas no Azul a tua formosura!Teu voo Ă© um longo adeus:
O caminho das almas para os CĂ©us…Longe, saudosa, adejas,
E pairas sobre mim… bendita sejas!
Se Te Pertenço
Se te pertenço, separo-me de mim.
Perco meu passo nos caminhos de terra
E de DionĂsio sigo a carne, a ebriedade.
Se te pertenço perco a luz e o nome
E a nitidez do olhar de todos os começos:
O que me parecia um desenho no eterno
Se te pertenço Ă© um acorde ilusĂłrio no silĂȘncio.E por isso, por perder o mundo
Separo-me de mim. Pelo Absurdo.
Para um poeta, o silĂȘncio Ă© uma resposta aceitĂĄvel, atĂ© mesmo um elogio.
Eu Vi Dos PĂłlos O Gigante Alado
Eu vi dos pĂłlos o gigante alado,
Sobre um montĂŁo de pĂĄlidos coriscos,
Sem fazer caso dos bulcÔes ariscos,
Devorando em silĂȘncio a mĂŁo do fado!Quatro fatias de tufĂŁo gelado
Figuravam da mesa entre os petiscos;
E, envolto em manto de fatais rabiscos,
Campeava um sofisma ensangĂŒentado!â “Quem Ă©s, que assim me cercas de episĂłdios?”
Lhe perguntei, com voz de silogismo,
Brandindo um facho de trovĂ”es serĂłdios.â “Eu sou” â me disse, â “aquele anacronismo,
Que a vil coorte de sulfĂșreos Ăłdios
Nas trevas sepultei de um solecismo…”
Quem fala de Amor nĂŁo ama verdadeiramente: talvez deseje, talvez possua, talvez esteja realizando uma Ăłptima obra literĂĄria, mas realmente nĂŁo ama; sĂł a conquista do vulgar Ă© pelo vulgar apregoado aos quatro ventos; quando se ama, em silĂȘncio se ama.
O som aniquila a grande beleza do silĂȘncio.
Afirmação
A essĂȘncia das coisas Ă© senti-las
tĂŁo densas e tĂŁo claras,
que nĂŁo possam conter-se por completo
nas palavras.A essĂȘncia das coisas Ă© nutri-las
tĂŁo de alegria e mĂĄgoa,
que o silĂȘncio se ajuste Ă sua forma
sem mais nada.
Do Fim dos Segredos
Quando se conta a outrem um segredo este
desmaia: a palavra
torna-se pele
sem leĂŁo lĂĄ dentro.NĂŁo Ă© mais segredo e nĂŁo o sendo
finge ser lembrança
de fabrico imperfeito:
um cliqueti no silĂȘncio escancaraa dantes inamovĂvel porta
e virada a pĂĄgina acha-se apenas
uma moeda
que nĂŁo corre jĂĄ.
Medo
Quem dorme Ă noite comigo?
Ă meu segredo, Ă© meu segredo!
Mas se insistirem lhes digo.
O medo mora comigo,
Mas sĂł o medo, mas sĂł o medo!E cedo, porque me embala
Num vaivém de solidão,
Ă com silĂȘncio que fala,
Com voz de mĂłvel que estala
E nos perturba a razĂŁo.Que farei quando, deitado,
Fitando o espaço vazio,
Grita no espaço fitado
Que estĂĄ dormindo a meu lado,
LĂĄzaro e frio?Gritar? Quem pode salvar-me
Do que estĂĄ dentro de mim?
Gostava até de matar-me.
Mas eu sei que ele hĂĄ-de esperar-me
Ao pé da ponte do fim.
No silĂȘncio forma-se o talento. Mas o carĂĄter, no turbilhĂŁo do mundo.
Sou companhia, mas posso ser solidĂŁo. Tranquilidade e inconstĂąncia, pedra e coração. Sou abraços, sorrisos, Ăąnimo, bom humor, sarcasmo, preguiça e sono. MĂșsica alta e silĂȘncio.
O silĂȘncio cura todos os aborrecimentos.
O SilĂȘncio
Peço apenas o teu silĂȘncio,
como uma criança pede uma flor
ou um velho pedinte um bocado de pĂŁo.
Um silĂȘncio
onde a tua alma se embrulha, friorenta,
trémula, à aproximação das invernias.
Um silĂȘncio com ressonĂąncias de antigas primaveras,
de outonos descoloridos
e da chuva a cair no negrume da noite.– VĂĄ, motorista de tĂĄxi,
transporta-me
através das ruas da cidade inextricåvel,
vertiginosamente,
buzinando, buzinando,
abafando o ruĂdo de um outro silĂȘncio!
VocĂȘ nĂŁo sabe a energia que reside no silĂȘncio
Foste Tu que me Desvendaste o Amor
Querida: estamos sozinhos Ă mesa nesta noite infinita em que a chuva cai lĂĄ fora com um ruido monĂłtono de chĂŽro. Estamos sĂłs nesta noite de saudade e nunca foi maior a nossa companhia, porque cada vez me sinto mais perto dos mortos. Rodeiam-nos, chegam-se para mim e sentam-se ao nosso lume. SĂŁo legiĂŁo… Mais perto, que eu faço uma labareda que nos aqueça a todos. A velha mesa da consoada foi-se despovoando com o tempo, mas hoje estĂŁo aqui sentadas todas as figuras que conheço desde que me conheço… Tu, toda branca, e que mesmo atravĂ©s do tĂșmulo me transmites sonho; tu, mais longe, mais apagada e sumida; e tu, que vens de volta, e encostas os teus cabelos brancos aos meus cabelos brancos, para me dizeres baixinho: â Menino!âPois ainda me chamas menino?! â Outro acolĂĄ sorri e outro tenta falar… Dois vivos e tantos mortos sentados Ă roda desta mesa que veio de meu pai, foi de meu avĂŽ e pertenceu jĂĄ a outras geraçÔes desconhecidas, mas que estĂŁo aqui tambĂ©m comigo, escutando e sorrindo, enquanto as pinhas se transformam em flores maravilhosas e as vides que plantei se reduzem a cinza!… Nunca estive tĂŁo acompanhado como hoje nesta ceia religiosa de fantasmas,
SubmissĂŁo
1.
no topo desta escada
tem um chefe
que te olha.
na curva desta estrada
tem um dono
que me manda.2.
mais desço quando subo,
a cada passo,
se me movo
para cima e para baixo,
mais volto quando ando,
a cada passo,
para frente e para os lados,
na curva desta estrada,
se me curvo
sem mais nada.3.
no caminho em que caminho
cruzo os braços
a cada passo
e, mudo, avanço
no caminho sem recuo
que me leva
nesta escada,
nesta estrada
a cada curva que me curva
tĂŁo curvada.4.
a cada passo,
mais tropeço
se começo
nesta dança
sob o peso
desta canga
que jĂĄ levo
sobre os ombros;
sobre os ombros
jĂĄ tĂŁo curvos
jĂĄ tĂŁo duros
no silĂȘncio em que me escondo.5.
a cada passo, em cada curva
sĂł te vejo tĂŁo curvado,
que dependo da procura procurada
na ida desta volta,