Sonetos sobre Asas de Machado de Assis

3 resultados
Sonetos de asas de Machado de Assis. Leia este e outros sonetos de Machado de Assis em Poetris.

Gonçalves Crespo

Esta musa da pátria, esta saudosa
Niobe dolorida,
Esquece acaso a vida,
Mas nĂŁo esquece a morte gloriosa.

E pálida, e chorosa,
Ao Tejo voa, onde no chĂŁo caĂ­da
Jaz aquela evadida
Lira da nossa América viçosa.

Com ela torna, e, dividindo os ares,
Trépido, mole, doce movimento
Sente nas frouxas cordas singulares.

NĂŁo Ă© a asa do vento,
Mas a sombra do filho, no momento
De entrar perpetuamente os pátrios lares.

O Desfecho

Prometeu sacudiu os braços manietados
E sĂşplice pediu a eterna compaixĂŁo,
Ao ver o desfilar dos séculos que vão
Pausadamente, como um dobre de finados.

Mais dez, mais cem, mais mil e mais um biliĂŁo,
Uns cingidos de luz, outros ensangĂĽentados…
SĂşbito, sacudindo as asas de tufĂŁo,
Fita-lhe a água em cima os olhos espantados.

Pela primeira vez a vĂ­scera do herĂłi,
Que a imensa ave do céu perpetuamente rói,
Deixou de renascer Ă s raivas que a consomem.

Uma invisĂ­vel mĂŁo as cadeias dilui;
Frio, inerte, ao abismo um corpo morto rui;
Acabara o suplĂ­cio e acabara o homem.

Maria

Maria, há no seu gesto airoso o nobre,
Nos olhos meigos e no andar tĂŁo brando,
Um nĂŁo sei que suave que descobre,
Que lembra um grande pássaro marchando.

Quero, Ă s vezes, pedir-lhe que desdobre
As asas, mas não peço, reparando
Que, desdobradas, podem ir voando
Levá-la ao teto azul que a terra cobre.

E penso entĂŁo, e digo entĂŁo comigo:
“Ao cĂ©u, que vĂŞ passar todas as gentes
Bastem outros primores de valia.

Pássaro ou moça, fique o olhar amigo,
O nobre gesto e as graças excelentes
Da nossa cara e lĂ©pida Maria”.