Sonetos sobre Casais

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Sonetos de casais escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

5A E 6A Sombras – Cândida E Laura

Como no tanque de um palácio mago,
Dous alvos cisnes na bacia lisa,
Como nas águas que o barqueiro frisa,
Dous nenĂşfares sobre o azul do lago,

Como nas hastes em balouço vago
Dous lĂ­rios roxos que acalenta a brisa,
Como um casal de juritis que pisa
O mesmo ramo no amoroso afago….

Quais dous planetas na cerĂşlea esfera,
Como os primeiros pâmpanos das vinhas,
Como os renovos nos ramais da hera,

Eu vos vejo passar nas noites minhas,
Crianças que trazeis-me a primavera…
Crianças que lembrais-me as andorinhas! …

Paisagem Ăšnica

Olhas-me tu: e nos teus olhos vejo
Que eu sou apenas quem se vĂŞ: assim
Tu tanto me entregaste ao teu desejo
Que Ă© nos teus olhos que eu me vejo a mim.

Em ti, que bem meu corpo se acomoda!
Ah! quanto amor por os teus olhos arde!
Contigo sou? — perco a paisagem toda…
Longe de ti? — sou como um dobre Ă  tarde…

Adeuses aos casais dessas Marias
Em cuja graça o meu olhar flutua,
Tudo o que amei ao teu amor o entrego.

Choupos com ar de velhas Senhorias,
Castelo moiro donde nasce a Lua,
E apenas tu, a tudo o mais sou cego.

Horas de Saudade

Vou de luar em rosto, descontente:
Meus olhos choram lágrimas de sal.
— Adeus, terras e moças do casal,
— Adeus, ó coração da minha gente.

A hora da saudade Ă© uma serpente:
Quero falar, nĂŁo posso, e antes que fale
Ela enlaça-me a voz tão cordial
Que as coisas mais me lembram fielmente.

Olhos de amora, e uma ave na garganta
Para enfeitiçar a alma quando canta,
Moças com sua parra de avental;

Graça, Beleza, um verso sem medida,
A Saudade desterrou-me a vida …
Sou um eco perdido noutro vale.

Longus

É de manhã, no outono. À luz, o orvalho
doira os mirtais de trĂŞmulas capelas.
e, sobre o solo, recobrindo o atalho,
há milhares de folhas amarelas…

A Filetas, ao pé de amplo carvalho,
ouvem as narrações e pastorelas,
um rapaz, aindaingĂŞnuo e sem trabalho,
e a mais linda de todas as donzelas…

É a narrativa do florir dos prados,
que o mais doce dos velhos barbilongos
conta ao casal de jovens namorados…

SilĂŞncio… Ouvi-lhe o beijo dos ditongos,
os silábicos sons, que musicados,
cantam na amável pastoral de Longus…

Carta

Aqui, tudo Ă© bonito e quieto, a gente
vai vivendo uma vida sempre igual…
– Há um dia que o regato de cristal
de águas turvas ficou devido Ă  enchente…

Os dias tĂŞm passado, lentamente,
e um tédio sinto em mim, de um modo tal,
que às vezes, fico até sentimental,
lembrando-me de ti, saudosamente…

Quando estavas aqui, – tudo era lindo…
Como um doce casal de beija-flores,
vivĂ­amos os dois sempre sorrindo…

Por que nĂŁo voltas?… Vem!… – Se tu voltares
o cĂ©u há de cobrir-se de outras cores…
– as flores voltarĂŁo pelos pomares!..

Lembrança

Fui Essa que nas ruas esmolou
E fui a que habitou Paços Reais;
No mármore de curvas ogivais
Fui Essa que as mĂŁos pálidas poisou…

Tanto poeta em versos me cantou!
Fiei o linho Ă  porta dos casais…
Fui descobrir a ĂŤndia e nunca mais
Voltei! Fui essa nau que nĂŁo voltou…

Tenho o perfil moreno, lusitano,
E os olhos verdes, cor do verde Oceano,
Sereia que nasceu de navegantes…

Tudo em cinzentas brumas se dilui…
Ah, quem me dera ser Essas que eu fui,
As que me lembro de ter sido… dantes!…

Noitinha

A noite sobre nĂłs se debruçou…
Minha alma ajoelha, põe as mãos e ora!
O luar, pelas colinas, nesta hora,
É água dum gomil que se entornou…

Não sei quem tanta pérola espalhou!
Murmura alguĂ©m pelas quebradas fora…
Flores do campo, humildes, mesmo agora.
A noite, os olhos brandos, lhes fechou…

Fumo beijando o colmo dos casais…
Serenidade idĂ­lica de fontes,
E a voz dos rouxinĂłis nos salgueirais…

Tranquilidade… calma… anoitecer…
Num ĂŞxtase, eu escuto pelos montes
O coração das pedras a bater…

Quem Rasgou os Meus Lençóis de Linho

Quem poluiu, quem rasgou os meus lençóis de linho,
Onde esperei morrer, meus tão castos lençóis?
Do meu jardim exĂ­guo os altos girassĂłis
Quem foi que os arrancou e lançou no caminho?

Quem quebrou (que furor cruel e simiesco!)
A mesa de eu cear, d tábua tosca de pinho?
E me espalhou a lenha? E me entornou o vinho?
– Da minha vinha o vinho acidulado e fresco…

Ă“ minha pobre mĂŁe!… NĂŁo te ergas mais da cova.
Olha a noite, olha o vento. Em ruĂ­na a casa nova…
Dos meus ossos o lume a extinguir-se breve.

NĂŁo venhas mais ao lar. NĂŁo vagabundes mais,
Alma da minha mĂŁe… NĂŁo andes mais Ă  neve,
De noite a mendigar Ă s portas dos casais.

Noite

Há na expressão do céu um mágico esplendor
e em ĂŞxtase sensual, a terra está vencida…
– deixa enlaçar-te toda… A sombra nos convida,
e uma noite como esta Ă© feita para o amor…

Assim… – Fica em meus braços, trĂŞmula e esquecida,
e dá-me do teu corpo esse estranho calor,
– ao pĂłlen que dá vida, em fruto faz-se a flor,
e o teu corpo Ă© uma flor que nĂŁo conhece a vida…

Há sussurros pelo ar… Há sombras nos caminhos…
E à indiscrição da Lua, em seu alto mirante,
encolhem-se aos casais, os pássaros nos ninhos…

Astros fogem no cĂ©u… ninguĂ©m mais pode vĂŞ-los…
procuram, para amar, a noite mais distante,
e eu, para amar, procuro a noite em teus cabelos!…