Sonetos sobre Cinzas de Carlos Pena Filho

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Sonetos de cinzas de Carlos Pena Filho. Leia este e outros sonetos de Carlos Pena Filho em Poetris.

Soneto das Metamorfoses

A Edmundo Morais

Carolina, a cansada, fez-se espera
e nunca se entregou ao mar antigo.
Não por temor ao mar, mas ao perigo
de com ela incendiar-se a primavera.

Carolina, a cansada que então era,
despiu, humildemente, as vestes pretas
e incendiou navios e corvetas
já cansada, por fim, de tanta espera.

E cinza fez-se. E teve o corpo implume
escandalosamente penetrado
de imprevistos azuis e claro lume.

Foi quando se lembrou de ser esquife:
abandonou seu corpo incendiado
e adormeceu nas brumas do Recife.

Soneto para Greta Garbo

(Em louvor da decadência bem comportada)

Entre silêncio e sombra se devora
e em longínquas lembranças se consome;
tão longe que esqueceu o próprio nome
e talvez já nem saiba porque chora.

Perdido o encanto de esperar agora
o antigo deslumbrar que já não cabe,
transforma-se em silêncio, porque sabe
que o silêncio se oculta e se evapora.

Esquiva e só como convém a um dia
despregado do tempo, esconde a face
que já foi sol e agora é cinza fria.

Mas vê nascer da sombra outra alegria:
como se o olhar magoado contemplasse
o mundo em que viveu, mas que não via.