CamÔes II
Quando, transposta a lĂșgubre morada
Dos castigos, ascende o florentino
A regiĂŁo onde o clarĂŁo divino
Enche de intensa luz a alma nublada,A saudosa Beatriz, a antiga amada,
A mĂŁo lhe estende e guia o peregrino,
E aquele olhar etéreo e cristalino
Rompe agora da pålpebra sagrada.Tu que também o Purgatório andaste
Tu que rompeste os cĂrculos do Inferno,
CamÔes, se o teu amor fugir deixaste,Ora o tens. como um guia alto e superno
Que a Natércia da vida que choraste
Chama-se GlĂłria e tem o amor eterno.
Sonetos sobre CĂrculos
14 resultadosEm Busca Da Beleza III
SĂł que puder obter a estupidez
Ou a loucura pode ser feliz.
Buscar, querer, amar… tudo isto diz
Perder, chorar, sofrer, vez apĂłs vez.A estupidez achou sempre o que quis
Do cĂrculo banal da sua avidez;
Nunca aos loucos o engano se desfez
Com quem um falso mundo seu condiz.Hå dois males: verdade e aspiração,
E hĂĄ uma forma sĂł de os saber males:
Ă conhecĂȘ-los bem, saber que sĂŁoUm o horror real, o outro o vazio –
Horror nĂŁo menos – dois como que vales
Duma montanha que ninguém subiu.
DecadĂȘncia
Iguais Ă s linhas perpendiculares
CaĂram, como cruĂ©is e hĂłrridas hastas,
Nas suas 33 vértebras gastas
Quase todas as pedras tumulares!A frialdade dos cĂrculos polares,
Em sucessivas atuaçÔes nefastas,
Penetrara-lhe os prĂłprios neuroplastas,
Estragara-lhe os centros medulares!Como quem quebra o objeto mais querido
E começa a apanhar piedosamente
Todas as microscĂłpicas partĂculas,Ele hoje vĂȘ que, apĂłs tudo perdido,
SĂł lhe restam agora o Ășltimo dente
E a armação funerĂĄria das clavĂculas!
Eu Como, Eu Bebo, Eu Durmo
Eu como, eu bebo, eu durmo e a vida passo
Ora bem, ora mal, como sucede:
Tomo tabaco, e chĂĄ; e se mo pede
O génio alguma vez, eu Nize abraço:As vezes jogo, as vezes versos faço,
Que mais que a arte a natureza mede:
E talvez por saber como procede
Em se mover o Sol cĂrculos traço.Alguma vez me agrada a soledade,
Outras vezes a nobre companhia;
E desta sorte vou passando a idade:E espero assim que venha a morte fria
Com o manto da eterna escuridade
Encobrir-me de todo a luz do dia.
Tortura Eterna
ImpotĂȘncia cruel, Ăł vĂŁ tortura!
Ă Força inĂștil, ansiedade humana!
Ă cĂrculos dantescos da loucura!
Ă luta, Ă luta secular, insana!Que tu nĂŁo possas, Alma soberana,
Perpetuamente refulgir na Altura,
Na Aleluia da Luz, na clara Hosana
Do Sol, cantar, imortalmente pura.Que tu nĂŁo posses, Sentimento ardente,
Viver, vibrar nos brilhos do ar fremente,
Por entre as chamas, os clarĂ”es supernos.Ă Sons intraduzĂveis, Formas, Cores!…
Ah! que eu nĂŁo possa eternizar as cores
Nos bronzes e nos mĂĄrmores eternos!
A Ingaia CiĂȘncia
A madureza, essa terrĂvel prenda
que alguém nos då, raptando-nos, com ela,
todo sabor gratuito de oferenda
sob a glacialidade de uma estela,a madureza vĂȘ, posto que a venda
interrompa a surpresa da janela,
o cĂrculo vazio, onde se estenda,
e que o mundo converte noma cela.A madureza sabe o preço exato
dos amores, dos Ăłcios, dos quebrantos,
e nada pode contra sua ciĂȘnciae nem contra si mesma. O agudo olfato,
o agudo olhar, a mĂŁo, livre de encantos,
se destroem no sonho da existĂȘncia.
Mater Dolorosa
Quando se fez ao largo a nave escura,
na praia essa mulher ficou chorando,
no doloroso aspecto figurando
a lacrimosa eståtua da amargura.Dos céus a curva era tranquila e pura;
Das gementes alcĂones o bando
Via-se ao longe, em cĂrculos, voando
Dos mares sobre a cérula planura.Nas ondas se atufara o Sol radioso,
E Lua sucedera, astro mavioso,
De alvor banhando os alcantis das fragas…E aquela pobre mĂŁe, nĂŁo dando conta
Que o sol morrera, e que o luar desponta,
A vista embebe na amplidĂŁo das vagas…
Velho
EstĂĄs morto, estĂĄs velho, estĂĄs cansado!
Como um sulco de lĂĄgrimas pungidas,
Ei-las, as rugas, as indefinidas
Noites do ser vencido e fatigado.Envolve-te o crepĂșsculo gelado
Onde vai soturno amortalhando as vidas
Ante o responso em mĂșsicas gemidas
No fundo coração dilacerado.A cabeça pendida de fadiga,
Sentes a morte taciturna e amiga
Que os teus nervos cĂrculos governa.EstĂĄs velho, estĂĄs morto! Ă dor, delĂrio,
Alma despedaçada de martĂrio,
à desespero da Desgraça eterna!
VolĂșpia
No divino impudor da mocidade,
Nesse ĂȘxtase pagĂŁo que vence a sorte,
Num frĂȘmito vibrante de ansiedade,
Dou-te o meu corpo prometido Ă morte!A sombra entre a mentira e a verdade…
A nuvem que arrastou o vento norte…
– Meu corpo! Trago nele um vinho forte:
Meus beijos de volĂșpia e de maldade!Trago dĂĄlias vermelhas no regaço…
São os dedos do sol quando te abraço,
Cravados no teu peito como lanças!E do meu corpo os leves arabescos
VĂŁo-te envolvendo em cĂrculos dantescos
Felinamente, em voluptuosas danças…
Sempre O Sonho
Para encantar os cĂrculos da Vida
Ă ser tranqĂŒilo, sonhador, confiante,
Sempre trazer o coração radiante
Como um rio e rosais junto de ermida.Beber na vinha celestial, garrida
Das estrelas o vinho flamejante
E caminhar vitorioso e ovante
Como um deus, com a cabeça enflorescida.Sorrir, amar para alargar os mundoe
Do Sentimento e para ter profundos
Momentos de momentos soberanos.Para sentir em torno Ă terra ondeando
Um sonho, sempre um sonho além rolando
Vagas e vagas de imortais oceanos.
Afrodite I
Móvel, festivo, trépido, arrolando,
Ă clara voz, talvez da turba iriada
De sereias de cauda prateada,
Que vĂŁo com o vento os carmes concertando,O mar, – turquesa enorme, iluminada,
Era, ao clamor das ĂĄguas, murmurando,
Como um bosque pagĂŁo de deuses, quando
Rompeu no Oriente o pĂĄlio da alvorada.As estrelas clarearam repentinas,
E logo as vagas sĂŁo no verde plano
Tocadas de ouro e irradiaçÔes divinas;O oceano estremece, abrem-se as brumas,
E ela aparece nua, Ă flor de oceano,
Coroada de um cĂrculo de espumas.
Soneto 549 Tematizado
De duas coisas todo bom poeta
dever tem de falar para ser posto
no cĂrculo dos grandes e no gosto
do povo ser mais um que se projeta:de estrelas e de rosas. Nada veta
que seja seu soneto sĂł composto
de pétalas que espelhem-lhe o desgosto
do amor que feneceu e nos afeta.TambĂ©m ninguĂ©m proĂbe que as estrelas
figurem esperanças ou paixÔes
e todos os sonetos tentem lĂȘ-las.NĂŁo morre um de Bilac ou de CamĂ”es,
mas falta o que um poeta mede pelas
(dum cego) fantasias e visĂ”es…
Cruzada Nova
Vamos saber das almas os segredos,
Os cĂrculos patĂ©ticos da Vida,
Dar-lhes a luz do Amor compadecida
E defendĂȘ-las dos secretos medos.Vamos fazer dos ĂĄridos rochedos
Manar a ĂĄgua lustral e apetecida,
Pelos ansiosos coraçÔes bebida
No silĂȘncio e na sombra d’arvoredos.Essas irmĂŁs furtivas das estrelas,
Se nĂŁo formos depressa defendĂȘ-las,
MorrerĂŁo sem encanto e sem carinho.Paladinos da lĂmpida Cruzada!
Conquistemos, sem lança e sem espada,
As almas que encontrarmos no Caminho.
Repouso
A cabeça pendida docemente
Em sonhos, sonha o sonhador inquieto,
Repousa e nesse repousar discreto
Ă sempre o sonho o seu bordĂŁo clemente.Cego desta PrisĂŁo impenitente
Da Terra e cego do profundo Afeto,
O sonho Ă© sempre o seu bordĂŁo secreto
O seu guia divino e refulgente.Nem no repouso encontra a paz que espera,
Para lhe adormecer toda a quimera,
Os cĂrculos fatais do seu Inferno.Entre a calma aparente, a estranha calma,
O seu repouso Ă© sempre a febre d’alma,
O seu repouso Ă© sonho, e sonho eterno.