O Lázaro Da Pátria
Filho podre de antigos Goitacases,
Em qualquer parte onde a cabeça ponha,
Deixa circunferências de peçonha,
Marcas oriundas de úlceras e antrazes.Todos os cinocéfalos vorazes
Cheiram seu corpo. À noite, quando sonha,
Sente no tórax a pressão medonha
Do bruto embate férreo das tenazes,Mostra aos montes e aos rígidos rochedos
A hedionda elefantíasis dos dedos…
Há um cansaço no Cosmos… Anoitece,Riem as meretrizes no Casino,
E o Lázaro caminha em seu destino
Para um fim que ele mesmo desconhece!
Sonetos sobre Dedos de Augusto dos Anjos
4 resultadosAo Luar
Quando, à noite, o Infinito se levanta
A luz do luar, pelos caminhos quedos
Minha tactil intensidade é tanta
Que eu sinto a alma do Cosmos nos meus dedos!Quebro a custódia dos sentidos tredos
E a minha mão, dona, por fim, de quanta
Grandeza o Orbe estrangula em seus segredos,
Todas as coisas íntimas suplanta!Penetro, agarro, ausculto, apreendo, invado,
Nos paroxismos da hiperestesia,
O Infinitésimo e o Indeterminado…Transponho ousadamente o átomo rude
E, transmudado em rutilância fria,
Encho o Espaço com a minha plenitude!
Idealização Da Humanidade Futura
Rugia nos meus centros cerebrais
A multidão dos séculos futuros
– Homens que a herança de ímpetos impuros
Tornara étnicamente irracionais! –Não sei que livro, em letras garrafais,
Meus olhos liam! No húmus dos monturos,
Realizavam-se os partos mais obscuros,
Dentre as genealogias animais!Como quem esmigalha protozoários
Meti todos os dedos mercenários
Na consciência daquela multidão…E, em vez de achar a luz que os Céus inflama,
Somente achei moléculas de lama
E a mosca alegre da putrefação!
O Martírio Do Artista
Arte ingrata! E conquanto, em desalento,
A órbita elipsoidal dos olhos lhe arda,
Busca exteriorizar o pensamento
Que em suas fronetais células guarda!Tarda-lhe a idéa! A inspiração lhe tarda!
E ei-lo a tremer, rasga o papel, violento,
Como o soldado que rasgou a farda
No desespero do último momento!Tenta chorar e os olhos sente enxutos!…
É como o paralítico que, à mingua
Da própria voz e na que ardente o lavraFebre de em vão falar, com os dedos brutos
Para falar, puxa e repuxa a língua,
E não lhe vem à boca uma palavra!