LXXXIII
Polir na guerra o bárbaro gentio,
Que as leis quase ignorou da natureza,
Romper de altos penhascos a rudeza,
Desentranhar o monte, abrir o rio;Esta a virtude, a glória, o esforço, o brio
Do Russiano HerĂłi, esta a grandeza,
Que igualou de Alexandre a fortaleza,
Que venceu as desgraças de Dario:Mas se a lei do heroĂsmo se procura,
Se da virtude o espĂrito se atende,
Outra idéia, outra máxima o segura:Lá vive, onde no ferro não se acende;
Vive na paz dos povos, na brandura:
VĂłs a ensinais, Ăł Rei; em vĂłs se aprende.
Sonetos sobre Desgraças de Cláudio Manuel da Costa
3 resultadosLXXVIII
Campos, que ao respirar meu triste peito
Murcha, e seca tornais vossa verdura,
Não vos assuste a pálida figura,
Com que o meu rosto vedes tĂŁo desfeito.VĂłs me vistes um dia o doce efeito
Cantar do Deus de Amor, e da ventura;
Isso já se acabou; nada já dura;
Que tudo à vil desgraça está sujeito.Tudo se muda enfim: nada há, que seja
De tão nobre, tão firme segurança,
Que não encontre o fado, o tempo, a inveja.Esta ordem natural a tudo alcança;
E se alguĂ©m um prodĂgio ver deseja,
Veja meu mal, que só não tem mudança.
XXVI
NĂŁo vĂŞs, Nise, este vento desabrido,
Que arranca os duros troncos? NĂŁo vĂŞs esta,
Que vem cobrindo o céu, sombra funesta,
Entre o horror de um relâmpago incendido?Não vês a cada instante o ar partido
Dessas linhas de fogo? Tudo cresta,
Tudo consome, tudo arrasa, e infesta,
O raio a cada instante despedido.Ah! não temas o estrago, que ameaça
A tormenta fatal; que o CĂ©u destina
Vejas mais feia, mais cruel desgraça:Rasga o meu peito, já que és tão ferina;
Verás a tempestade, que em mim passa;
Conhecerás entĂŁo, o que Ă© ruĂna.