A Nossa Casa
A nossa casa, Amor, a nossa casa!
Onde está ela, Amor, que não a vejo?
Na minha doida fantasia em brasa
Constrói-a, num instante, o meu desejo!Onde está ela, Amor, a nossa casa,
O bem que neste mundo mais invejo?
O brando ninho aonde o nosso beijo
Será mais puro e doce que uma asa?Sonho… que eu e tu, dois pobrezinhos,
Andamos de mĂŁos dadas, nos caminhos
Duma terra de rosas, num jardim,Num paĂs de ilusĂŁo que nunca vi…
E que eu moro – tĂŁo bom! – dentro de ti
E tu, Ăł meu Amor, dentro de mim…
Sonetos sobre Doidos
28 resultadosFloriram por Engano as Rosas Bravas
Floriram por engano as rosas bravas
No inverno: veio o vento desfolhá-las…
Em que cismas, meu bem? Porque me calas
As vozes com que há pouco me enganavas?Castelos doidos! TĂŁo cedo caĂstes!…
Onde vamos, alheio o pensamento,
De mĂŁos dadas? Teus olhos, que um momento
Perscrutaram nos meus, como vĂŁo tristes!E sobre nĂłs cai nupcial a neve,
Surda, em triunfo, pétalas, de leve
Juncando o chĂŁo, na acrĂłpole de gelos…Em redor do teu vulto Ă© como um vĂ©u!
Quem as esparze _quanta flor! _do céu,
Sobre nĂłs dois, sobre os nossos cabelos?
Irineu
Num dia turvo assim foi que partiste
Cheio de dor e de tristeza cheio.
Eu fiquei a chorar num doido anseio
Olhando o espaço merencório, triste.Não sei se mágoa mais profunda existe
Que esta saudade que me oprime o seio,
Pois a amargura que ferir-me veio
Naquele dia, Ăł meu irmĂŁo! persiste.Os anos que se foram! Entanto, eu cismo
A todo o instante, no profundo abismo
Que veio a morte entre nĂłs dois abrir.Mas cada noite, n’asa de uma prece,
Ou num raio de sol quando amanhece,
Vejo tu’alma para o cĂ©u subir…
Anseios
Meu doido coração aonde vais,
No teu imenso anseio de liberdade?
Toma cautela com a realidade;
Meu pobre coração olha cais!Deixa-te estar quietinho! Não amais
A doce quietação da soledade?
Tuas lindas quimeras irreais
NĂŁo valem o prazer duma saudade!Tu chamas ao meu seio, negra prisĂŁo!…
Ai, vê lá bem, ó doido coração,
NĂŁo te deslumbre o brilho do luar!NĂŁo estendas tuas asas para o longe…
Deixa-te estar quietinho, triste monge,
Na paz da tua cela, a soluçar!…
Intimidade
Quando, sorrindo, vais passando, e toda
Essa gente te mira cobiçosa,
És bela – e se te nĂŁo comparo Ă rosa,
É que a rosa, bem vĂŞs, passou de moda…Anda-me Ă s vezes a cabeça Ă roda,
Atrás de ti também, flor caprichosa!
Nem pode haver, na multidĂŁo ruidosa,
Coisa mais linda, mais absurda e doida.Mas Ă© na intimidade e no segredo,
Quando tu coras e sorris a medo,
Que me apraz ver-te e que te adoro, flor!E nĂŁo te quero nunca tanto (ouve isto)
Como quando por ti, por mim, por Cristo,
Juras – mentindo – que me tens amor…
Soneto do Maior Amor
Maior amor nem mais estranho existe
Que o meu, que nĂŁo sossega a coisa amada
E quando a sente alegre, fica triste
E se a vê descontente, dá risada.E que só fica em paz se lhe resiste
O amado coração, e que se agrada
Mais da vida eterna aventura em que persiste
Que de uma vida mal-aventurada.Louco amor meu, que quando toca, fere
E quando fere vibra, mas prefere
Ferir a fenecer – e vive a esmoFiel à sua lei de cada instante
Desassombrado, doido delirante
Numa paixĂŁo de tudo e de si mesmo.
Salomé
InsĂłnia rĂ´xa. A luz a virgular-se em mĂŞdo,
Luz morta de luar, mais Alma do que a lua…
Ela dança, ela range. A carne, alcool de nua,
Alastra-se pra mim num espasmo de segrĂŞdo…Tudo Ă© capricho ao seu redĂłr, em sombras fátuas…
O arĂ´ma endoideceu, upou-se em cĂ´r, quebrou…
Tenho frio… Alabastro!… A minh’Alma parou…
E o seu corpo resvala a projectar estátuas…Ela chama-me em Iris. Nimba-se a perder-me,
Golfa-me os seios nus, ecĂ´a-me em quebranto…
Timbres, elmos, punhais… A doida quer morrer-me:Mordoura-se a chorar–ha sexos no seu pranto…
Ergo-me em som, oscilo, e parto, e vou arder-me
Na bĂ´ca imperial que humanisou um Santo…
Navios-Fantasmas
O arabesco fantástico do fumo
Do meu cigarro traça o que disseste,
A azul, no ar, e o que me escreveste,
E tudo o que sonhaste e eu presumo.Para a minha alma estática e sem rumo,
A lembrança de tudo o que me deste
Passa como navio que perdeste,
No arabesco fantástico do fumo…Lá vĂŁo! Lá vĂŁo! Sem velas e sem mastros,
TĂŞm o brilho rutilante de astros,
Navios-fantasmas, perdem-se a distância!Vão-me buscar, sem mastros e sem velas,
Noiva-menina, as doidas caravelas,
Ao ignoto PaĂs da minha infância…