Sonetos sobre Emoções

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Sonetos de emoções escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Dualidade

Sei que é Amor, meu amor…porque o desejo
o meu próprio desejo tão violento,
dir-se-ia ter pudor, ter sentimento,
quando estás junto a mim, quando te vejo.

É um clarim a vibrar como um harpejo,
misto de impulso e de deslumbramento.
Sei que é Amor, meu amor…porque o desejo
é desejo e ternura a um só momento.

Beijo-te a boca, as mãos, e hei de beijar-te
nessa dupla emoção, (violento e terno)
em que a minha alma inteira se reparte,

– e a perceber em meu estranho ardor,
que há uma luta entre o efêmero e o eterno,
entre um demônio e um anjo em todo Amor!

Corpo

VII

Pompas e pompas, pompas soberanas
Majestade serene da escultura
A chama da suprema formosura,
A opulência das púrpuras romanas.

As formas imortais, claras e ufanas,
Da graça grega, da beleza pura,
Resplendem na arcangélica brancura
Desse teu corpo de emoções profanas.

Cantam as infinitas nostalgias,
Os mistérios do Amor, melancolias,
Todo o perfume de eras apagadas…

E as águias da paixão, brancas, radiantes,
Voam, revoam, de asas palpitantes,
No esplendor do teu corpo arrebatadas!

O Coração

O coração é a sagrada pira
Onde o mistério do sentir flameja.
A vida da emoção ele a deseja
como a harmonia as cordas de uma lira.

Um anjo meigo e cândido suspira
No coração e o purifica e beija…
E o que ele, o coração, aspira, almeja
É o sonho que de lágrimas delira.

É sempre sonho e também é piedade,
Doçura, compaizão e suavidade
E graça e bem, misericórdia pura.

Uma harmonia que dos anjos desce,
Que como estrela e flor e som floresce
Maravilhando toda criatura!

Quatro Sonetos De Meditação – III

O efêmero. Ora, um pássaro no vale
Cantou por um momento, outrora, mas
O vale escuta ainda envolto em paz
Para que a voz do pássaro não cale.

E uma fonte futura, hoje primária
No seio da montanha, irromperá
Fatal, da pedra ardente, e levará
À voz a melodia necessária.

O efêmero. E mais tarde, quando antigas
Se fizerem as flores, e as cantigas
A uma nova emoção morrerem, cedo

Quem conhecer o vale e o seu segredo
Nem sequer pensará na fonte, a sós…
Porém o vale há de escutar a voz.

Espírito Imortal

Espírito imortal que me fecundas
Com a chama dos viris entusiasmos,
Que transformas em gládios os sarcasmos
Para punir as multidões profundas!

Ó alma que transbordas, que me inundas
De brilhos, de ecos, de emoções, de pasmos
E fazes acordar de atros marasmos
Minh’alma, em tédios por charnecas fundas.

Força genial e sacrossanta e augusta,
Divino Alerta para o Esquecimento,
Voz companheira, carinhosa e justa.

Tens minha Mão, num doce movimento,
Sobre essa Mão angélica e robusta,
Espírito imortal do Sentimento!

Supremo Verbo

– Vai, Peregrino do caminho santo,
Faz da tu’alma lâmpada do cego,
Iluminando, pego sobre pego,
As invisíveis amplidões do Pranto.

Ei-lo, do Amor o Cálix sacrossanto!
Bebe-o, feliz, nas tuas mãos o entrego…
És o filho leal, que eu não renego,
Que defendo nas dobras do meu manto.

Assim ao Poeta a Natureza fala!
Enquanto ele estremece ao escutá-la,
Transfigurado de emoção, sorrindo…

Sorrindo a céus que vão se desvendando,
A mundos que vão se multiplicando,
A portas de ouro que vão se abrindo!

Dedicatória

Se acaso uma alma se fotografasse
de sorte que, nos mesmos negativos,
A mesma luz pusesse em traços vivos
O nosso coração e a nossa face;

E os nossos ideais, e os mais cativos
De nossos sonhos… Se a emoção que nasce
Em nós, também nas chapas se gravasse
Mesmo em ligeiros traços fugitivos;

Amigo! tu terias com certeza
A mais completa e insólita surpresa
Notando – deste grupo bem no meio –

Que o mais belo, o mais forte, o mais ardente
Destes sujeitos é precisamente
O mais triste, o mais pálido, o mais feio.

Tudo quanto Sonhei se Foi Perdido

O que sonhei e antes de vivido
Era perfeito e lúcido e divino,
Tudo quanto sonhei se foi perdido
Nas ondas caprichosas do destino.

Que os fados em mim mesmo depuseram
Razões de ser e de não ser, contrárias,
Nas emoções que, dentro em mim, cresceram
Tumultuosas, carinhosas, várias.

Naqueles seres que fui dentro de um ser,
Que viveram de mais para eu viver
A minha vida luminosa e calma,

Se desdobraram gestos de menino
E rudes arremedos de assassino.
Foram almas de mais numa só alma.

Prece

Bendita sejas tu em meu caminho!
Bendita sejas tu, pela coragem
com que fizeste de um amor selvagem
esse amor que se humilha ao teu carinho!

Bendita sejas, porque a tua imagem
suaviza toda angústia e todo espinho…
Já não maldigo a insipidez da viagem,
nem me sinto só, nem vou sozinho…

Bendita sejas tantas vezes quantas
são as aves no céu; e são as plantas
na terra; e são as horas de emoção

em que juntos ficamos, de mãos dadas,
como se nossas vidas irmanadas
vivessem por um mesmo coração!

Uma Palavra

Meu canto busca sempre uma palavra
que seja companheira na canção
da minha voz que canta e se declara:
viver a vida inteira de emoção.

Uma palavra só não se prepara
puxando outra palavra sem razão
na vida que se encanta e se dispara
no claro tiro cego de paixão.

Viver a arte que procura ver
os lábios desbotados da linguagem
deixando a claridade me envolver

no sopro que me leva na paisagem
amaciando a pena ao escrever
teu nome, meu amor, minha viagem

A Dança Da Psiquê

A dança dos encéfalos acesos
Começa. A carne é fogo. A alma arde. A espaços
As cabeças, as mãos, os pés e os braços
Tombara, cedendo à ação de ignotos pesos!

É então que a vaga dos instintos presos
– Mãe de esterilidades e cansaços –
Atira os pensamentos mais devassos
Contra os ossos cranianos indefesos.

Subitamente a cerebral coréa
Pára. O cosmos sintético da Idéa
Surge. Emoções extraordinárias sinto…

Arranco do meu crânio as nebulosas.
E acho um feixe de forças prodigiosas
Sustentando dois monstros: a alma e o instinto!

Volúpia

Quisera te associar à pureza e à candura
quando pensasse em ti… Mas a emoção, teimosa,
transforma sem querer toda a minha ternura
numa estranha lembrança ardente voluptuosa…

Não poderei dizer apenas que és formosa
quando a própria beleza em ti se transfigura,
– e pela tua carne há pétalas de rosa
e no teu corpo há um canto fresco de água pura!

Um sincero pudor vislumbro em teus enleios,
mas se disser que te amo com pureza, eu minto,
– no olhar trago tatuada a visão de teus seios…

E em vão tento associar-te ao céu, à fonte, à flor!
Quando falo de ti, penso em teu corpo, e sinto
que ainda estremece em mim teu último estertor!

O Coração

Que jogo jogas, comédia ou lágrima? Cor
suspensa. Prodígio doendo. Enganador
relâmpago. Donde se enreda esta coragem
que chora ao riso e ri à dor? Quatro são

as pedras mestras do teu jogo. Dois cavalos
e os reis. Melancólicos actores. Vazia, a
plateia. O tempo ferido. O peão fugitivo.
A emoção real do presságio. O aceno

cordial do outro lado do jogo. Inscrição
única do pólen, jogada que se arrasta.
Gota de tédio na lonjura das casas.

O fecho do jogo se conclui. Muda o rosto a
visão possível. Cordato, o lance destrói
a memória do que já não vejo ou sei.

Que Importa?…

Eu era a desdenhosa, a indif’rente.
Nunca sentira em mim o coração
Bater em violências de paixão
Como bate no peito à outra gente.

Agora, olhas-me tu altivamente,
Sem sombra de Desejo ou de emoção,
Enquanto a asa loira da ilusão
Dentro em mim se desdobra a um sol nascente.

Minh’alma, a pedra, transformou-se em fonte;
Como nascida em carinhoso monte
Toda ela é riso, e é frescura, e graça!

Nela refresca a boca um só instante…
Que importa?… Se o cansado viandante
Bebe em todas as fontes… quando passa?…

Está Cheio De Ti Meu Coração

Está cheio de ti meu coração
como a noite de estrelas está cheia,
tão cheia, que ao se olhar para a amplidão
o olhar de luz se inunda e se incendeia…

Está cheio de ti meu coração
como de ondas o mar que o dorso alteia,
como a praia que estende sobre o chão
milhões de grãos do seu lençol de areia…

Está cheio de ti meu coração,
como uma taça, erguida, transbordante,
num momento de amor e de emoção,

– como o meu canto enquanto eu viva e eu cante
como o meu pensamento a todo instante
está cheio de ti meu coração!

A Lanterna

O sabio antigo andou pelas ruas d’Athenas,
Com a lanterna accesa, errante, à luz do dia,
Buscando o varão forte e justo da Utopia,
Privado de paixões e d’emoções terrenas.

Eu tambem que aborreço as cousas vãs, pequenas
E que mais alto puz a sã Philosophia,
Ha muito busco em vão–ha muito, quem diria!
O mais cruel ideal das concepções serenas.

Tenho buscado em balde, e em vão por todo o mundo;
Esconde-se o ideal no sitio mais profundo,
No mar, no inferno, em tudo, aonde existe a dôr!…

De sorte que hoje emfim, descrente, resignado,
Concentrei-me em mim só, n’um tedio indignado,
E apaguei a lanterna – É só um sonho o Amor!

Encarnação

Carnais, sejam carnais tantos desejos,
Carnais, sejam carnais tantos anseios,
Palpitações e frêmitos e enleios,
Das harpas da emoção tantos arpejos…

Sonhos, que vão, por trêmulos adejos,
A noite, ao luar, intumescer os seios
Lácteos, de finos e azulados veios
De virgindade, de pudor, de pejos…

Sejam carnais todos os sonhos brumos
De estranhos, vagos, estrelados rumos
Onde as Visões do amor dormem geladas…

Sonhos, palpitações, desejos e ânsias
Formem, com claridades e fragrâncias,
A encarnação das lívidas Amadas!

Glória

Florescimentos e florescimentos!
Glória às estrelas, glória às aves, glória
À natureza! Que a minh’alma flórea
Em mais flores flori de sentimentos.

Glória ao Deus invisível dos nevoentos
Espaços! glória à lua merencória,
Glória à esfera dos sonhos, à ilusória
Esfera dos profundos pensamentos.

Glória ao céu, glória à terra, glória ao mundo!
Todo o meu ser é roseiral fecundo
De grandes rosas de divino brilho.

Almas que floresceis no Amor eterno!
Vinde gozar comigo este falerno,
Esta emoção de ver nascer um filho!

Meu Céu Interior

Se esses teus olhos, no meu livro, imersos,
encontrarem diversas emoções,
– não tentes decifrar… – mil corações
nós os temos num só, todos diversos…

Os meus poemas aqui, vivem dispersos,
como as estrelas… e as constelações…
– no céu das minhas íntimas visões,
no”meu céu interior…”cheio de versos.

Não procures o poeta compreender…
– Os versos que umas cousas nos desnudam,
Outras cousas, ocultam, sem querer…

Uns, são felizes… Outros, ao contrário…
– No rosário da vida, as contas mudam,
e os versos são contas de um rosário!…

O Meu Nirvana

No alheamento da obscura forma humana,
De que, pensando, me desencarcero,
Foi que eu, num grito de emoção, sincero
Encontrei, afinal, o meu Nirvana!

Nessa manumissão schopenhauereana,
Onde a Vida do humano aspecto fero
Se desarraiga, eu, feito força, impero
Na imanência da Idéa Soberana!

Destruída a sensação que oriunda fora
Do tacto – ínfima antena aferidora
Destas tegumentárias mãos plebéas –

Gozo o prazer, que os anos não carcomem,
De haver trocado a minha forma de homem
Pela imortalidade das Idéas!