Sonetos sobre Escuro

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Sonetos de escuro escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Quarenta Anos

Sim! como um dia de verĂŁo, de acesa
Luz, de acesos e cálidos fulgores,
Como os sorrisos da estação das flores,
Foi passando também tua beleza.

Hoje, das garras da descrença presa,
Perdes as ilusões. Vão-se-te as cores
Da face. E entram-te n’alma os dissabores,
Nublam-te o olhar as sombras da tristeza.

Expira a primavera, O sol fulgura
Com o brilho extremo. . . E aĂ­ vĂŞm as noites frias,
AĂ­ vem o inverno da velhice escura…

Ah! pudesse eu fazer, novo Ezequias,
Que o sol poente dessa formosura
Volvesse Ă  aurora dos primeiros dias!

Minha Alegria

Minha alegria foi no teu caixĂŁo;
Deitou-se ao pé de ti, na sepultura,
A fim de acalentar teu coração
E tornar-te mais branda a terra dura.

Por isso, é para mim consolação
Esta sombria dĂ´r que me tortura!
E ponho-me a cantar na solidĂŁo,
Meu cantico esculpido em noite escura!

Consola-me saber minha alegria
Longe de mim, perto de ti, na fria
Cova a que tu baixaste apoz a morte.

FĂ´ste tu que m’a deste, meu amĂ´r;
Agora, dou-t’a eu: Ă© a minha flĂ´r;
Eu quero que ela soffra a tua sorte.

7A Sombra – Dulce

Se houvesse ainda talismĂŁ bendito
Que desse ao pântano – a corrente pura,
Musgo – ao rochedo, festa – Ă  sepultura,
Das águias negras – harmonia ao grito…,

Se alguém pudesse ao infeliz precito
Dar lugar no banquete da ventura…
E tocar-lhe o velar da insĂ´nia escura
No poema dos beijos – infinito…,

Certo. . . serias tu, donzela casta,
Quem me tomasse em meio do Calvário
A cruz de angĂşstias que o meu ser arrasta!. . .

Mas ,se tudo recusa-me o fadário,
Na hora de expirar, Ăł Dulce, basta
Morrer beijando a cruz de teu rosário!…

Vem, oh Noite Sombria

Vem, oh noite sombria, e revolvendo
O longo açoite, que à carreira acende
As fuscas Éguas, sobre a terra estende
De sombras carregado o manto horrendo:

Vem: e as brancas papoilas espremendo,
Em letárgico sono os mortais prende;
Que a minha bela Aglaia hoje me atende,
A meu amor mil glĂłrias prometendo.

Se às minhas vozes dás benigno ouvido,
Encobrindo com teu escuro manto
Os suaves delĂ­rios de amor cego;

Imolar-te prometo agradecido
Um negro galo, que em contĂ­nuo canto
Se atreve a perturbar o teu sossego.

A Ronda Noturna

Noite cerrada, tormentosa, escura,
Lá fora. Dormem em trevas o convento.
Queda imoto o arvoredo. NĂŁo fulgura
Uma estrela no torvo firmamento.

Dentro é tudo mudez. Flébil murmura,
De espaço a espaço, entanto, a voz do vento:
E há um rasgar de sudários pela altura,
Passo de espectros pelo pavimento…

Mas, de sĂşbito, os gonzos das pesadas
Portas rangem… Ecoa surdamente
Leve rumor de vozes abafadas.

E, ao clarão de uma lâmpada tremente,
Do claustro sob as tácitas arcadas
Passa a ronda noturna, lentamente…

Amor Fero e Cruel, Fortuna Escura

Grão tempo há já que soube da Ventura
A vida que me tinha destinada,
Que a longa experiĂŞncia da passada
Me dava claro indĂ­cio da futura.

Amor fero e cruel, Fortuna escura,
Bem tendes vossa força exprimentada;
Assolai, destruĂ­, nĂŁo fique nada;
Vingai-vos desta vida, que inda dura.

Soube Amor da Ventura que a nĂŁo tinha,
E por que mais sentisse a falta dela,
De imagens impossĂ­veis me mantinha.

Mas vĂłs, Senhora, pois que minha estrela
NĂŁo foi melhor, vivei nesta alma minha,
Que nĂŁo tem a Fortuna poder nela.

RelĂ­quia

Era de minha mĂŁe: Ă© um pobre xale
que tem pra mim uma carĂ­cia de asa.
Vou-lhe pedir ainda que me fale
da que ele agasalhou em nossa casa.

Na sua trama já puída e lassa
deixo os meus dedos pra senti-la ainda;
e Ela vem, é Ela que me abraça,
fala de coisas que a saudade alinda.

É a minha mãe mais perto, mais pertinho,
que eu sinto quando toco o velho xale,
que guarda um nĂŁo sei quĂŞ do seu carinho.

E quando a vida mais me dĂłi, no escuro,
sinto ao tocá-lo como alguém que embale
e beije a minha sede de amor puro.

XXXII

Se os poucos dias, que vivi contente,
Foram bastantes para o meu cuidado,
Que pode vir a um pobre desgraçado,
Que a idéia de seu mal não acrescente!

Aquele mesmo bem, que me consente,
Talvez propĂ­cio, meu tirano fado,
Esse mesmo me diz, que o meu estado
Se há de mudar em outro diferente.

Leve pois a fortuna os seus favores;
Eu os desprezo já; porque é loucura
Comprar a tanto preço as minhas dores:

Se quer, que me nĂŁo queixe, a sorte escura,
Ou saiba ser mais firme nos rigores,
Ou saiba ser constante na brandura.