Gomes Leal
Sangra, sinistro, a alguns o astro baço.
Seus três anéis irreversíveis são
A desgraça, a tristeza, a solidão.
Oito luas fatais fitam no espaço.Este, poeta, Apolo em seu regaço
A Saturno entregou. A plúmbea mão
Lhe ergueu ao alto o aflito coração.
E, erguido, o apertou, sangrando lasso.Inúteis oito luas da loucura
Quando a cintura tríplice denota
Solidão e desgraça e amargura!Mas da noite sem fim um rastro brota,
Vestígios de maligna formosura:
É a lua além de Deus, álgida e ignota.
Sonetos sobre Espaço de Fernando Pessoa
3 resultadosHá Um País Imenso Mais Real
Há um país imenso mais real
Do que a vida que o mundo mostra Ter
Mais do que a Natureza natural
À verdade tremendo de viver.Sob um céu uno e plácido e normal
Onde nada se mostra haver ou ser
Onde nem vento geme, nem fatal
A idéias de uma nuvem se faz crer,Jaz – uma terra não – não há um solo
Mas estranha, gelando em desconsolo
À alma que vê esse país sem véu,Hirtamente silente nos espaços
Uma floresta de escarnados braços
Inutilmente erguidos para o céu.
Emissário de um Rei Desconhecido
Emissário de um rei desconhecido,
Eu cumpro informes instruções de além,
E as bruscas frases que aos meus lábios vêm
Soam-me a um outro e anômalo sentido…Inconscientemente me divido
Entre mim e a missão que o meu ser tem,
E a glória do meu Rei dá-me desdém
Por este humano povo entre quem lido…Não sei se existe o Rei que me mandou.
Minha missão será eu a esquecer,
Meu orgulho o deserto em que em mim estou…Mas há! Eu sinto-me altas tradições
De antes de tempo e espaço e vida e ser…
Já viram Deus as minhas sensações…