O Lamento Das Coisas
Triste, a escutar, pancada por pancada,
A sucessividade dos segundos,
Ouço, em sons subterrâneos, do Orbe oriundos,
O choro da Energia abandonada!É a dor da Força desaproveitada
– O cantochão dos dínamos profundos,
Que, podendo mover milhões de mundos,
jazem ainda na estática do Nada!É o soluço da forma ainda imprecisa…
Da transcendência que se não realiza…
Da luz que não chegou a ser lampejo…E é em suma, o subconsciente ai formidando
Da Natureza que parou, chorando,
No rudimentarismo do Desejo!
Sonetos sobre Forma de Augusto dos Anjos
7 resultadosMater Originalis
Forma vermicular desconhecida
Que estacionaste, mísera e mofina,
Como quase impalpável gelatina,
Nos estados prodrômicos da vida;O hierofante que leu a minha sina
Ignorante é de que és, talvez, nascida
Dessa homogeneidade indefinida
Que o insigne Herbert Spencer nos ensina.Nenhuma ignota união ou nenhum nexo
A contingência orgânica do sexo
A tua estacionária alma prendeu…Ah! de ti foi que, autônoma e sem normas,
Oh! Mãe original das outras formas,
A minha forma lúgubre nasceu!
Revelação
I
Escafandrista de insondado oceano
Sou eu que, aliando Buda ao sibarita,
Penetro a essência plásmica infinita,
-Mãe promíscua do amor e do ódio insano!Sou eu que, hirto, auscultando o absconso arcano,
Por um poder de acústica esquisita,
Ouço o universo ansioso que se agita
Dentro de cada pensamento humano!No abstrato abismo equóreo, em que me Inundo,
Sou eu que, revolvendo o ego profundo
E a ódio dos cérebros medonhos,Restituo triunfalmente à esfera calma
Todos os cosmos que circulam na alma
Sob a forma embriológica de sonhos!
Anseio
Que sou eu, neste ergástulo das vidas
Danadamente, a soluçar de dor?!
– Trinta triliões de células vencidas,
Nutrindo uma efeméride inferior.Branda, entanto, a afagar tantas feridas,
A áurea mão taumitúrgica do Amor
Traça, nas minhas formas carcomidas,
A estrutura de um mundo superior!Alta noite, esse mundo incoerente
Essa elementaríssima semente
Do que hei de ser, tenta transpor o Ideal…Grita em meu grito, alarga-se em meu hausto,
E, ai! como eu sinto no esqueleto exausto
Não poder dar-lhe vida material!
Louvor A Unidade
“Escafandros, arpões, sondas e agulhas
“Debalde aplicas aos heterogêneos
“Fenômenos, e, há inúmeros milênios,
“Num pluralismo hediondo o olhar mergulhas!“Une, pois, a irmanar diamantes e hulhas,
“Com essa intuição monística dos gênios,
“À hirta forma falaz do are perennius
“A transitoriedade das fagulhas!”– Era a estrangulação, sem retumbância,
Da multimilenária dissonância
Que as harmonias siderais invade…Era, numa alta aclamação, sem gritos,
O regresso dos átomos aflitos
Ao descanso perpétuo da Unidade!
Insânia De Um Simples
Em cismas patológicas insanas,
É-me grato adstringir-me, na hierarquia
Das formas vivas, à categoria
Das organizações liliputianas;Ser semelhante aos zoófitos e às lianas,
Ter o destino de uma larva fria,
Deixar enfim na cloaca mais sombria
Este feixe de células humanas!E enquanto arremedando Eolo iracundo,
Na orgia heliogabálica do mundo,
Ganem todos os vícios de uma vez,Apraz-me, adstricto ao triângulo mesquinho
De um delta humilde, apodrecer sozinho
No silêncio de minha pequenez!
O Meu Nirvana
No alheamento da obscura forma humana,
De que, pensando, me desencarcero,
Foi que eu, num grito de emoção, sincero
Encontrei, afinal, o meu Nirvana!Nessa manumissão schopenhauereana,
Onde a Vida do humano aspecto fero
Se desarraiga, eu, feito força, impero
Na imanência da Idéa Soberana!Destruída a sensação que oriunda fora
Do tacto – ínfima antena aferidora
Destas tegumentárias mãos plebéas –Gozo o prazer, que os anos não carcomem,
De haver trocado a minha forma de homem
Pela imortalidade das Idéas!