Inania Verba
Ah! quem há de exprimir, alma impotente e escrava,
O que a boca nĂŁo diz, o que a mĂŁo nĂŁo escreve?
– Ardes, sangras, pregada a’ tua cruz, e, em breve,
Olhas, desfeito em lodo, o que te deslumbrava…O Pensamento ferve, e Ă© um turbilhĂŁo de lava:
A Forma, fria e espessa, Ă© um sepulcro de neve…
E a Palavra pesada abafa a Idéia leve,
Que, perfume e dano, refulgia e voava.Quem o molde achará para a expressão de tudo?
Ai! quem há de dizer as ânsias infinitas
Do sonho? e o céu que foge à mão que se levanta?E a ira muda? e o asco mudo? e o desespero mudo?
E as palavras de fé que nunca foram ditas?
E as confissões de amor que morrem na garganta?!
Sonetos sobre Forma de Olavo Bilac
4 resultadosAs Ondas
Entre as trĂŞmulas mornas ardentias,
A noite no alto-mar anima as ondas.
Sobem das fundas Ăşmidas Golcondas,
Pérolas vivas, as nereidas frias:Entrelaçam-se, correm fugidias,
Voltam, cruzando-se; e, em lascivas rondas,
Vestem as formas alvas e redondas
De algas roxas e glaucas pedrarias.Coxas de vago Ă´nix, ventres polidos
De alabastro, quadris de argĂŞntea espuma,
Seios de dĂşbia opala ardem na treva;E bocas verdes, cheias de gemidos,
Que o fósforo incendeia e o âmbar perfuma,
Soluçam beijos vĂŁos que o vento leva…
A um Poeta
Longe do estéril turbilhão da rua,
Beneditino, escreve! No aconchego
Do claustro, na paciĂŞncia e no sossego,
Trabalha, e teima, e lima, e sofre, e sua!Mas que na forma de disfarce o emprego
Do esforço; e a trama viva se construa
De tal modo, que a imagem fique nua,
Rica mas sĂłbria, como um templo grego.NĂŁo se mostre na fábrica o suplĂcio
Do mestre. E, natural, o efeito agrade,
Sem lembrar os andaimes do edifĂcio:Porque a Beleza, gĂŞmea da Verdade,
Arte pura, inimiga do artifĂcio,
É a força e a graça na simplicidade.
A Sesta De Nero
Fulge de luz banhado, esplĂŞndido e suntuoso,
O palácio imperial de pórfiro luzente
E mármor da Lacônia. O teto caprichoso
Mostra, em prata incrustado, o nácar do Oriente.Nero no toro ebĂşrneo estende-se indolente…
Gemas em profusão do estrágulo custoso
De ouro bordado vĂŞem-se. O olhar deslumbra, ardente,
Da púrpura da Trácia o brilho esplendoroso.Formosa ancila canta. A aurilavrada lira
Em suas mãos soluça. Os ares perfumando,
Arde a mirra da Arábia em recendente pira.Formas quebram, dançando, escravas em coréia.
E Nero dorme e sonha, a fronte reclinando
Nos alvos seios nus da lúbrica Popéia.