Sanhudo, Inexorável Despotismo
Sanhudo, inexorável Despotismo
Monstro que em pranto, em sangue a fúria cevas,
Que em mil quadros horríficos te enlevas,
Obra da Iniquidade e do Ateísmo:Assanhas o danado Fanatismo,
Porque te escore o trono onde te enlevas;
Por que o sol da Verdade envolva em trevas
E sepulte a Razão num denso abismo.Da sagrada Virtude o colo pisas,
E aos satélites vis da prepotência
De crimes infernais o plano gizas,Mas, apesar da bárbara insolência,
Reinas só no ext’rior, não tiranizas
Do livre coração a independência.
Sonetos sobre Fúria de Manuel Maria Barbosa du Bocage
3 resultadosEm louvor do grande Camões
Sobre os contrários o terror e a morte
Dardeje embora Aquiles denodado,
Ou no rápido carro ensanguentado
Leve arrastos sem vida o Teuco forte:Embora o bravo Macedónio corte
Coa fulminante espada o nó fadado,
Que eu de mais nobre estímulo tocado,
Nem lhe amo a glória, nem lhe invejo a sorte:Invejo-te, Camões, o nome honroso;
Da mente criadora o sacro lume,
Que exprime as fúrias de Lieu raivoso:Os ais de Inês, de Vénus o queixume,
As pragas do gigante proceloso,
O céu de Amor, o inferno do Ciúme.
Visão Realizada
Sonhei que a mim correndo o gnídeo nume
Vinha coa Morte, co Ciúme ao lado,
E me bradava: “Escolhe, desgraçado,
Queres a Morte, ou queres o Ciúme?”“Não é pior daquela fouce o gume
Que a ponta dos farpões que tens provado;
Mas o monstro voraz, por mim criado,
Quanto horror há no Inferno em si resume.”Disse; e eu dando um suspiro: “Ah, não m’espantes
Coa a vista dessa fúria!… Amor, clemência!
Antes mil mortes, mil infernos antes!”Nisto acordei com dor, com impaciência;
E não vos encontrando, olhos brilhantes,
Vi que era a minha morte a vossa ausência!