Sonetos sobre Gelo de Antero de Quental

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Sonetos de gelo de Antero de Quental. Leia este e outros sonetos de Antero de Quental em Poetris.

Uma Amiga

Aqueles que eu amei, não sei que vento
Os dispersou no mundo, que os não vejo…
Estendo os bracos e nas trevas beijo
Visões que a noite evoca o sentimento…

Outros me causam mais cruel tormento
Que a saudade dos mortos… que eu invejo…
Passam por mim… mas como que tem pejo
Da minha soledade e abatimento!

Daquela primavera venturosa
Não resta uma flor so, uma so rosa…
Tudo o vento varreu, queimou o gelo!

Tu so foste fiel – tu, como dantes,
Inda volves teus olhos radiantes…
Para ver o meu mal… e escarnece-lo!

Espiritualismo

I

Como um vento de morte e de ruína,
A Dúvida soprou sobre o Universo.
Fez-se noite de súbito, imerso
O mundo em densa e algida neblina.

Nem astro já reluz, nem ave trina,
Nem flor sorri no seu aéreo berço.
Um veneno subtil, vago, disperso,
Empeçonhou a criação divina.

E, no meio da noite monstruosa,
Do silêncio glacial, que paira e estende
O seu sudário, d’onde a morte pende,

Só uma flor humilde, misteriosa,
Como um vago protesto da existência,
Desabroxa no fundo da Consciência.

II

Dorme entre os gelos, flor imaculada!
Luta, pedindo um ultimo clarão
Aos sóis que ruem pela imensidão,
Arrastando uma auréola apagada…

Em vão! Do abismo a boca escancarada
Chama por ti na gélida amplidão…
Sobe do poço eterno, em turbilhão,
A treva primitiva conglobada…

Tu morrerás também. Um ai supremo,
Na noite universal que envolve o mundo,
Ha-de ecoar, e teu perfume extremo

No vácuo eterno se esvairá disperso,
Como o alento final d’um moribundo,
Como o último suspiro do Universo.

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Uma Amiga

Aqueles que eu amei, não sei que vento
Os dispersou no mundo, que os não vejo…
Estendo os braços e nas trevas beijo
Visões que a noite evoca o sentimento…

Outros me causam mais cruel tormento
Que a saudade dos mortos… que eu invejo…
Passam por mim… mas como que tem pejo
Da minha soledade e abatimento!

Daquela primavera venturosa
Não resta uma flor só, uma só rosa…
Tudo o vento varreu, queimou o gelo!

Tu só foste fiel – tu, como dantes,
Inda volves teus olhos radiantes…
Para ver o meu mal… e escarnecê-lo!