Desenganado da AparĂȘncia Exterior
DESENGANADO DA APARĂNCIA EXTERIOR COM O EXAME INTERIOR E VERDADEIRO
VĂȘs tu este gigante corpulento
que solene e soberbo se reclina?
Pois por dentro Ă© farrapos e faxina,
e Ă© um carregador seu fundamento.Com sua alma vive e Ă© movimento,
e onde ele quer sua grandeza inclina;
mas quem seu modo rĂgido examina
despreza tal figura e ornamento.SĂŁo assim as grandezas aparentes
da presunção vazia dos tiranos:
fantĂĄsticas escĂłrias eminentes.VĂȘs que, em pĂșrpura ardendo, sĂŁo humanos?
As mĂŁos com pedrarias sĂŁo diferentes?
Pois dentro nojo são, terra e gusanos.Tradução de José Bento
Sonetos sobre Gigantes
12 resultadosLVIII
Altas serras, que ao CĂ©u estais servindo
De muralhas, que o tempo nĂŁo profana,
Se Gigantes nĂŁo sois, que a forma humana
Em duras penhas foram confundindo?lĂĄ sobre o vosso cume se estĂĄ rindo
O Monarca da luz, que esta alma engana;
Pois na face, que ostenta, soberana,
O rosto de meu bem me vai fingindo.Que alegre, que mimoso, que brilhante
Ele se me afigura! Ah qual efeito
Em minha alma se sente neste instante!Mas ai! a que delĂrios me sujeito!
Se quando no Sol vejo o seu semblante,
Em vĂłs descubro Ăł penhas o seu peito?
O PĂąntano
Podem vĂȘ-lo, sem dor, meus semelhantes!
Mas, para mim que a Natureza escuto,
Este pĂąntano Ă© o tĂșmulo absoluto,
De todas as grandezas começantes!Larvas desconhecidas de gigantes
Sobre o seu leito de peçonha e luto
Dormem tranqĂŒilamente o sono bruto
Dos superorganismos ainda infantes!Em sua estagnação arde uma raça,
Tragicamente, Ă espera de quem passa
Para abrir-lhe, Ă s escĂąncaras, a porta…E eu sinto a angĂșstia dessa raça ardente
Condenada a esperar perpetuamente
No universo esmagado da ĂĄgua morta!
Gonçalves Dias
(AO PĂ DO MAR)
SE EU PUDESSE cantar a grande histĂłria,
Que envolve ardente o teu viver brilhante…
Filho dos trĂłpicos que – audaz gigante –
Desceste ao tĂșmulo subindo Ă GlĂłria!Teu tĂșmulo colossal – nest’hora eu fito –
Altivo, rugidor, sonoro, extenso –
O mar!… e ……. O sim, teu crĂąnio imenso
SĂł podia conter-se no infinito…E eu – sou louco talvez – mas quando, forte,
Em seu dorso resvala – ardente – norte,
E ele espumante estruge, brada, grita,E em cada vaga uma canção estoura…
Eu – creio ser tu’alma que, sonora,
Em seu seio sem fim – brava – palpita!
CamÔes, Grande CamÔes, quão Semelhante
CamÔes, grande CamÔes, quão semelhante
Acho teu fado ao meu, quando os cotejo!
Igual causa nos fez, perdendo o Tejo,
Arrostar co’o sacrĂlego gigante;Como tu, junto ao Ganges sussurrante,
Da penĂșria cruel no horror me vejo;
Como tu, gostos vĂŁos, que em vĂŁo desejo,
TambĂ©m carpindo estou, saudoso amante.LudĂbrio, como tu, da Sorte dura
Meu fim demando ao CĂ©u, pela certeza
De que sĂł terei paz na sepultura.Modelo meu tu Ă©s, mas… oh, tristeza!…
Se te imito nos transes da Ventura,
NĂŁo te imito nos dons da Natureza.
Depois Da Orgia
O prazer que na orgia a hetaĂra goza
Produz no meu sensorium de bacante
O efeito de uma tĂșnica brilhante
Cobrindo ampla apostema escrofulosa!Troveja! E anelo ter, sĂŽfrega e ansiosa,
O sistema nervoso de um gigante
Para sofrer na minha carne estuante
A dor da força cĂłsmica furiosa.Apraz-me, enfim, despindo a Ășltima alfaia
Que ao comércio dos homens me traz presa,
Livre deste cadeado de peçonha,Semelhante a um cachorro de atalaia
Ăs decomposiçÔes da Natureza,
Ficar latindo minha dor medonha!
Em louvor do grande CamÔes
Sobre os contrĂĄrios o terror e a morte
Dardeje embora Aquiles denodado,
Ou no rĂĄpido carro ensanguentado
Leve arrastos sem vida o Teuco forte:Embora o bravo MacedĂłnio corte
Coa fulminante espada o nĂł fadado,
Que eu de mais nobre estĂmulo tocado,
Nem lhe amo a glória, nem lhe invejo a sorte:Invejo-te, CamÔes, o nome honroso;
Da mente criadora o sacro lume,
Que exprime as fĂșrias de Lieu raivoso:Os ais de InĂȘs, de VĂ©nus o queixume,
As pragas do gigante proceloso,
O cĂ©u de Amor, o inferno do CiĂșme.
Eu Vi Dos PĂłlos O Gigante Alado
Eu vi dos pĂłlos o gigante alado,
Sobre um montĂŁo de pĂĄlidos coriscos,
Sem fazer caso dos bulcÔes ariscos,
Devorando em silĂȘncio a mĂŁo do fado!Quatro fatias de tufĂŁo gelado
Figuravam da mesa entre os petiscos;
E, envolto em manto de fatais rabiscos,
Campeava um sofisma ensangĂŒentado!â “Quem Ă©s, que assim me cercas de episĂłdios?”
Lhe perguntei, com voz de silogismo,
Brandindo um facho de trovĂ”es serĂłdios.â “Eu sou” â me disse, â “aquele anacronismo,
Que a vil coorte de sulfĂșreos Ăłdios
Nas trevas sepultei de um solecismo…”
Sonho Africano
Ei-lo em sua choupana. A lĂąmpada, suspensa
Ao teto, oscila; a um canto, um velho e ervado fimbo;
Entrando, porta dentro, o sol forma-lhe um nimbo
Cor de cinĂĄbrio em torno Ă carapinha densa.Estira-se no chĂŁo… Tanta fadiga e doença!
Espreguiça, boceja… O apagado cachimbo
Na boca, nessa meia escuridĂŁo de limbo,
Mole, semicerrando os dĂșbios olhos, pensa…Pensa na pĂĄtria, alĂ©m… As florestas gigantes
Se estendem sob o azul, onde, cheios de mĂĄgoa,
Vivem negros reptis e enormes elefantes…Calma em tudo. Dardeja o sol raios tranquilos…
Desce um rio, a cantar… Coalham-se Ă tona d’ĂĄgua
Em compacto apertĂŁo, os velhos crocodilos…
Soneto
Ao meu primeiro filho nascido morto com 7 meses incompletos 2 fevereiro 1911.
Agregado infeliz de sangue e cal,
Fruto rubro de carne agonizante,
Filho da grande força fecundante
De minha brĂŽnzea trama neuronial,Que poder embriolĂłgico fatal
Destruiu, com a sinergia de um gigante,
Em tua morfogĂȘnese de infante
A minha morfogĂȘnese ancestral?!Porção de minha plĂĄsmica substĂąncia,
Em que logar irĂĄs passar a infĂąncia,
Tragicamente anĂŽnimo, a feder?!…Ah! Possas tu dormir feto esquecido,
Panteisticamente dissolvido
Na noumenalidade do NĂO SER!
A Segurança Destas Paralelas
A segurança destas paralelas
â a beira da varanda e o horizonte;
assim me pacifico, e Ă© por elas
que subo lentamente cada monte.O tempo arrefecido, e sĂł soprado
por uma brisa tarda que do mar
torna este minuto leve aconchegado,
traz mansas as certezas de se estar.E vĂȘm novos nomes: sĂŁo as fadas,
gigantes e anÔes, que são assim
alegres de o serem â parcos nadasque enchendo de silĂȘncios este sim
dele fazem brinquedos, madrugadas…
Agora eu estou em ti e tu em mim.
A Vida Anterior
Longos anos vivi sob um pĂłrtico alto
De gigantes pilares, nobres, dominadores,
Que a luz, vinda do mar, esmaltava de cores,
Tornando-o semelhante às grutas de basalto.Chegavam até mim os ecos da harmonia
Do orfeĂŁo colossal das ondas chamejantes,
Ligando a sua voz Ă s tintas deslumbrantes
Da luz crepuscular que em meus olhos fugia.Em meio do esplendor do céu, do mar, dos lumes,
Foi-me dado gozar, voluptuosas calmas!
Escravos seminus, rescendendo perfumes,Minha fronte febril refrescavam com palmas,
E tinham por missĂŁo apenas descobrir
A misteriosa dor que eu andava a carpirTradução de Delfim Guimarães