Qualquer outro Bem Julgo por Vento
Quando da bela vista e doce riso
Tomando estĂŁo meus olhos mantimento,
TĂŁo elevado sinto o pensamento,
Que me faz ver na terra o ParaĂso.Tanto do bem humano estou diviso,
Que qualquer outro bem julgo por vento:
Assim que em termo tal, segundo sento,
Pouco vem a fazer quem perde o siso.Em louvar-vos, Senhora, nĂŁo me fundo;
Porque quem vossas graças claro sente,
SentirĂĄ que nĂŁo pode conhecĂȘ-las.Pois de tanta estranheza sois ao mundo,
Que nĂŁo Ă© de estranhar, dama excelente,
Que quem vos fez, fizesse céu e estrelas.
Sonetos sobre Graça de LuĂs de CamĂ”es
10 resultadosEstĂĄ Se A Primavera Trasladando
EstĂĄ se a Primavera trasladando
em vossa vista deleitosa e honesta;
nas lindas faces, olhos, boca e testa,
boninas, lĂrios, rosas debuxando.De sorte, vosso gesto matizando,
Natura quanto pode manifesta
que o monte, o campo, o rio e a floresta
se estĂŁo de vĂłs, Senhora, namorando.Se agora nĂŁo quereis que quem vos ama
possa colher o fruito destas flores,
perderão toda a graça vossos olhos.Porque pouco aproveita, linda Dama,
que semeasse Amor em vĂłs amores,
se vossa condição produze abrolhos.
Diana Prateada, Esclarecia
Diana prateada, esclarecia
com a luz que do claro Febo ardente,
por ser de natureza transparente,
em si, como em espelho, reluzia.Cem mil milhĂ”es de graças lhe influĂa,
quando me apareceu o excelente
raio de vosso aspecto, diferente
em graça e em amor do que soĂa.Eu, vendo-me tĂŁo cheio de favores,
e tĂŁo propĂnquo a ser de todo vosso,
louvei a hora clara, e a noite escura,Sois nela destes cor a meus amores;
donde colijo claro que nĂŁo posso
de dia para vĂłs jĂĄ ter ventura.
Presença Bela, Angélica Figura
Presença bela, angélica figura,
em quem, quanto o CĂ©u tinha, nos tem dado;
gesto alegre, de rosas semeado,
entre as quais se estĂĄ rindo a Fermosura;olhos, onde tem feito tal mistura
em cristal branco o preto marchetado,
que vemos jĂĄ no verde delicado
não esperança, mas enveja escura;brandura, aviso e graça, que aumentando
a natural beleza cum desprezo,
com que, mais desprezada, mais se aumenta;são as prisÔes de um coração que, preso,
seu mal ao som dos ferros vai cantando,
como faz a sereia na tormenta.
Pelos Extremos Raros Que Mostrou
Pelos extremos raros que mostrou
em saber, Palas, VĂ©nus em fermosa,
Diana em casta, Juno em animosa,
Ăfrica, Europa e Asia as adorou.Aquele saber grande que ajuntou
esprito e corpo em liga generosa,
esta mundana mĂĄquina lustrosa,
de sĂł quatro Elementos fabricou.Mas mor milagre fez a natureza
em vĂłs, Senhoras, pondo em cada ĂŒa
o que por todas quatro repartiu.A vĂłs seu resplandor deu Sol e LĂŒa,
a vós com viva luz, graça e pureza,
Ar, Fogo, Terra e Ăgua vos serviu.
Se Agora nĂŁo Quereis quem vos Ama
EstĂĄ-se a Primavera trasladando
Em vossa vista deleitosa e honesta;
Nas belas faces, e na boca e testa,
Cecéns, rosas, e cravos debuxando.De sorte, vosso gesto matizando,
Natura quanto pode manifesta,
Que o monte, o campo, o rio, e a floresta,
Se estĂŁo de vĂłs, Senhora, namorando.Se agora nĂŁo quereis que quem vos ama
Possa colher o fruto destas flores,
Perderão toda a graça os vossos olhos.Porque pouco aproveita, linda Dama,
Que semeasse o Amor em vĂłs amores,
Se vossa condição produz abrolhos.
A VĂłs Seu Resplendor Deu Sol e Lua
Pelos raros extremos que mostrou
Em sĂĄbia Palas, VĂ©nus em formosa,
Diana em casta, Juno em animosa,
Ăfrica, Europa e Ăsia as adorou.Aquele saber grande que juntou
EspĂrito e corpo em liga generosa,
Esta mundana mĂĄquina lustrosa
De sĂł quatro elementos fabricou.Mas fez maior milagre a natureza
Em vĂłs, Senhoras, pondo em cada uma
O que por todas quatro repartiu.A vĂłs seu resplendor deu Sol e Lua:
A vós com viva luz, graça e pureza,
Ar, Fogo, Terra e Ăgua vos serviu.
Diversos DÔes Reparte O Céu Benino
Diversos dÔes reparte o Céu benino,
e quer que cada ĂŒa um sĂł possua;
assi, ornou de casto peito a LĂŒa,
ornamento do assento cristalino.De graça, a Mãe fermosa do Minino,
que nessa vista tem perdido a sua;
Palas, de discrição, que imite a tua;
do valor, Juno, só de império dino.Mas junto agora o mesmo Céu derrama
em ti o mais que tinha, e foi o menos,
em respeito do Autor da natureza;que, a seu pesar, te dĂŁo, fermosa Dama,
Diana, honestidade, e graça, Vénus,
Palas o aviso seu, Juno a nobreza.
Num Jardim Adornado De Verdura
Num jardim adornado de verdura,
a que esmaltam por cima vĂĄrias flores,
entrou um dia a deusa dos amores,
com a deusa da caça e da espessura.Diana tomou logo ĂŒa rosa pura,
VĂ©nus um roxo lĂrio, dos milhores;
mas excediam muito Ă s outras flores
as violas, na graça e fermosura.Perguntam a Cupido, que ali estava,
qual daquelas trĂȘs flores tomaria,
por mais suave, pura e mais fermosa?Sorrindo se, o Minino lhe tornava:
todas fermosas sĂŁo, mas eu queria
V i o l ‘a n t e s que lĂrio, nem que rosa.
De Quantas Graças Tinha, A Natureza
De quantas graças tinha, a Natureza
fez um belo e riquĂssimo tesouro;
e com rubis e rosas, neve e ouro,
Formou sublime e angélica beleza.PÎs na boca os rubis, e na pureza
do belo rostro as rosas, por quem mouro;
no cabelo o valor do metal louro;
no peito a neve em que a alma tenho acesa.Mas nos olhos mostrou quanto podia,
e fez deles um sol, onde se apura
a luz mais clara que a do claro dia.Enfim, Senhora, em vossa compostura
ela a apurar chegou quanto sabia
de ouro, rosas, rubis, neve e luz pura.