Soneto VIII – O Tempo
Deus pede estrita conta de meu tempo,
É forçoso do tempo já dar conta;
Mas, como dar sem tempo tanta conta,
Eu que gastei sem conta tanto tempo?Para ter minha conta feita a tempo
Dado me foi bem tempo e nĂŁo foi conta.
NĂŁo quis sobrando tempo fazer conta,
Quero hoje fazer conta e falta tempo.Oh! vĂłs que tendes tempo sem ter conta
NĂŁo gasteis esse tempo em passatempo:
Cuidai enquanto Ă© tempo em fazer conta.Mas, oh! se os que contam com seu tempo
Fizessem desse tempo alguma conta,
NĂŁo choravam como eu o nĂŁo ter tempo.
Sonetos sobre Hoje de Laurindo Rabelo
3 resultadosSoneto VII – Ă€ Mesma Senhora
AlcĂone, perdido o esposo amado,
Ao céu o esposo sem cessar pedia;
Porém as ternas preces surdo ouvia
O cĂ©u, de seus amores descuidado.Em vĂŁo o pranto seu d’alma arrancado
Tenta a pedra minar da campa fria;
A morte de seu pranto escarnecia,
De seu cruel penar se ria o fado.Mas ah! — não fora assim, se a voz tivera
TĂŁo bela, tĂŁo gentil, tĂŁo doce e clara,
Daquela que hoje neste palco impera.Se assim cantasse, o tĂşmulo abalara
Do bem querido; e, branda a morte fera,
Vivo o extinto esposo lhe entregara.
Soneto IX
Para do mundo dar completo cabo,
Lá do negro recinto o soberano
Meditava a forjar horrĂvel plano
Coçando a grenha, sacudindo o rabo.Merecedor enfim de imenso gabo,
Eis o que assim disse muito ufano:
Para a missão cumprir — digesto humano
Quero fazer — que nasça hoje um diabo.E o 23 de maio nisso raia…
TeotĂ´nio nasceu, e a fama soa
Jamais ter visto infame dessa laia.Pois para SatĂŁ ser mesmo em pessoa,
Traja, qual bruxa velha, negra saia,
Como o rei dos bandalhos tem coroa.