Sonetos sobre Hoje de Laurindo Rabelo

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Sonetos de hoje de Laurindo Rabelo. Leia este e outros sonetos de Laurindo Rabelo em Poetris.

Soneto VIII – O Tempo

Deus pede estrita conta de meu tempo,
É forçoso do tempo já dar conta;
Mas, como dar sem tempo tanta conta,
Eu que gastei sem conta tanto tempo?

Para ter minha conta feita a tempo
Dado me foi bem tempo e nĂŁo foi conta.
NĂŁo quis sobrando tempo fazer conta,
Quero hoje fazer conta e falta tempo.

Oh! vĂłs que tendes tempo sem ter conta
NĂŁo gasteis esse tempo em passatempo:
Cuidai enquanto Ă© tempo em fazer conta.

Mas, oh! se os que contam com seu tempo
Fizessem desse tempo alguma conta,
NĂŁo choravam como eu o nĂŁo ter tempo.

Soneto VII – Ă€ Mesma Senhora

AlcĂ­one, perdido o esposo amado,
Ao céu o esposo sem cessar pedia;
Porém as ternas preces surdo ouvia
O céu, de seus amores descuidado.

Em vĂŁo o pranto seu d’alma arrancado
Tenta a pedra minar da campa fria;
A morte de seu pranto escarnecia,
De seu cruel penar se ria o fado.

Mas ah! — não fora assim, se a voz tivera
TĂŁo bela, tĂŁo gentil, tĂŁo doce e clara,
Daquela que hoje neste palco impera.

Se assim cantasse, o tĂşmulo abalara
Do bem querido; e, branda a morte fera,
Vivo o extinto esposo lhe entregara.

Soneto IX

Para do mundo dar completo cabo,
Lá do negro recinto o soberano
Meditava a forjar horrĂ­vel plano
Coçando a grenha, sacudindo o rabo.

Merecedor enfim de imenso gabo,
Eis o que assim disse muito ufano:
Para a missão cumprir — digesto humano
Quero fazer — que nasça hoje um diabo.

E o 23 de maio nisso raia…
TeotĂ´nio nasceu, e a fama soa
Jamais ter visto infame dessa laia.

Pois para SatĂŁ ser mesmo em pessoa,
Traja, qual bruxa velha, negra saia,
Como o rei dos bandalhos tem coroa.