Sonetos sobre Indícios de Luís de CamÔes

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Trocou Finita Vida por Divina, Infinita e Clara Fama

− Não passes, caminhante! − Quem me chama?
− Uma memória nova e nunca ouvida,
De um que trocou finita e humana vida
Por divina, infinita e clara fama.

− Quem Ă© que tĂŁo gentil louvor derrama?
− Quem derramar seu sangue não duvida
Por seguir a bandeira esclarecida
De um capitĂŁo de Cristo, que mais ama.

− Ditoso fim, ditoso sacrifício,
Que a Deus se fez e ao mundo juntamente!
Apregoando direi tĂŁo alta sorte.

− Mais poderás contar a toda a gente
Que sempre deu na vida claro indĂ­cio
De vir a merecer tĂŁo santa morte.

[...]

Um Mover D’olhos, Brando E Piadoso

Um mover d’olhos, brando e piadoso,
sem ver de quĂȘ; um riso brando e honesto,
quase forçado; um doce e humilde gesto,
de qualquer alegria duvidoso;

um despejo quieto e vergonhoso;
um repouso gravĂ­ssimo e modesto;
ĂŒa pura bondade, manifesto
indĂ­cio da alma, limpo e gracioso;

um encolhido ousar; ĂŒa brandura;
um medo sem ter culpa; um ar sereno;
um longo e obediente sofrimento;

esta foi a celeste fermosura
da minha Circe, e o mĂĄgico veneno
que pĂŽde transformar meu pensamento.

[...]

O MĂĄgico Veneno

Um mover de olhos, brando e piedoso,
Sem ver de quĂȘ; um riso brando e honesto,
Quase forçado; um doce e humilde gesto,
De qualquer alegria duvidoso;

Um despejo quieto e vergonhoso;
Um repouso gravĂ­ssimo e modesto;
Uma pura bondade, manifesto
IndĂ­cio da alma, limpo e gracioso;

Um encolhido ousar; uma brandura;
Um medo sem ter culpa; um ar sereno;
Um longo e obediente sofrimento;

Esta foi a celeste formosura
Da minha Circe, e o mĂĄgico veneno
Que pĂŽde transformar meu pensamento.

[...]

Amor Fero e Cruel, Fortuna Escura

GrĂŁo tempo hĂĄ jĂĄ que soube da Ventura
A vida que me tinha destinada,
Que a longa experiĂȘncia da passada
Me dava claro indĂ­cio da futura.

Amor fero e cruel, Fortuna escura,
Bem tendes vossa força exprimentada;
Assolai, destruĂ­, nĂŁo fique nada;
Vingai-vos desta vida, que inda dura.

Soube Amor da Ventura que a nĂŁo tinha,
E por que mais sentisse a falta dela,
De imagens impossĂ­veis me mantinha.

Mas vĂłs, Senhora, pois que minha estrela
NĂŁo foi melhor, vivei nesta alma minha,
Que nĂŁo tem a Fortuna poder nela.

[...]