Sonetos sobre InĂșteis de Florbela Espanca

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Sonetos de inĂșteis de Florbela Espanca. Leia este e outros sonetos de Florbela Espanca em Poetris.

A Minha Tragédia

Tenho Ăłdio Ă  luz e raiva Ă  claridade
Do sol, alegre, quente, na subida.
Parece que a minh’alma Ă© perseguida
Por um carrasco cheio de maldade!

Ó minha vĂŁ, inĂștil mocidade,
Trazes-me embriagada, entontecida! …
Duns beijos que me deste noutra vida,
Trago em meus lĂĄbios roxos, a saudade! …

Eu nĂŁo gosto do sol, eu tenho medo
Que me leiam nos olhos o segredo
De não amar ninguém, de ser assim!

Gosto da Noite imensa, triste, preta,
Como esta estranha e doida borboleta
Que eu sinto sempre a voltejar em mim! …

A Vida

É vĂŁo o amor, o Ăłdio, ou o desdĂ©m;
InĂștil o desejo ou o sentimento…
Lançar um grande amor aos pés de alguém
O mesmo é que lançar flores ao vento!

Todos somos no mundo “Pedro Sem”,
Uma alegria Ă© feita dum tormento,
Um riso Ă© sempre o eco dum lamento,
Sabe-se lĂĄ um beijo de onde vem!

A mais nobre ilusĂŁo morre… desfaz-se…
Uma saudade morta em nĂłs renasce
Que no mesmo momento Ă© jĂĄ perdida…

Amar-te a vida inteira eu nĂŁo podia.
A gente esquece sempre o bem de um dia.
Que queres, meu Amor, se Ă© isto a vida!…

Interrogação

A Guido Batelli

Neste tormento inĂștil, neste empenho
De tornar em silĂȘncio o que em mim canta,
Sobem-me roucos brados Ă  garganta
Num clamor de loucura que contenho.

Ó alma de charneca sacrossanta,
IrmĂŁ da alma rĂștila que eu tenho,
Dize pra onde vou, donde Ă© que venho
Nesta dor que me exalta e me alevanta!

VisÔes de mundos novos, de infinitos,
CadĂȘncias de soluços e de gritos,
Fogueira a esbrasear que me consome!

Dize que mĂŁo Ă© esta que me arrasta?
NĂłdoa de sangue que palpita e alastra…
Dize de que Ă© que eu tenho sede e fome?!

O Meu CondĂŁo

Quis Deus dar-me o condĂŁo de ser sensĂ­vel
Como o diamante Ă  luz que o alumia,
Dar-me uma alma fantĂĄstica, impossĂ­vel:
– Um bailado de cor e fantasia!

Quis Deus fazer de ti a ambrosia
Desta paixĂŁo estranha, ardente, incrĂ­vel!
Erguer em mim o facho inextinguĂ­vel,
Como um cinzel vincando uma agonia!

Quis Deus fazer-me tua… para nada!
– VĂŁos, os meus braços de crucificada,
InĂșteis, esses beijos que te dei!

Anda! Caminha! Aonde?… Mas por onde?…
Se a um gesto dos teus a sombra esconde
O caminho de estrelas que tracei…