Sonetos sobre Lados

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Sonetos de lados escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Tudo Nada

É isso mesmo a vida, – eu que tenho ao meu lado
a espera do primeiro gesto
mulheres que desprezo e que me tem paixĂŁo,
– imploro o teu amor, de joelhos, desprezado…

– És feliz, dizem uns; Ă©s querido e admirado;
outros dizem; – no entanto, eu sinto o coração
vazio, e ninguém sabe que em minha alma estão
presos, – um grande amor e um sonho imensurado…

– Podes ter aos teus pĂ©s o mundo e o que quiseres;
afirmam-me… E eu sorrio, amargurado e mudo
ante a oferta de amor de inĂșmeras mulheres…

Tanta cousa!… E a minha alma triste e amargurada!
– Que me adianta esse amor, esse mundo, isso tudo,
Se Tudo para mim, sem teu amor, Ă© o Nada!…

Com Os Mortos

Os que amei, onde estĂŁo? Idos, dispersos,
arrastados no giro dos tufÔes,
Levados, como em sonho, entre visÔes,
Na fuga, no ruir dos universos…

E eu mesmo, com os pés também imersos
Na corrente e Ă  mercĂȘ dos turbilhĂ”es,
Só vejo espuma lívida, em cachÔes,
E entre ela, aqui e ali, vultos submersos…

Mas se paro um momento, se consigo
Fechar os olhos, sinto-os a meu lado
De novo, esses que amei vivem comigo,

Vejo-os, ouço-os e ouvem-me também,
Juntos no antigo amor, no amor sagrado,
Na comunhĂŁo ideal do eterno Bem.

Indiferença

Hoje, voltas-me o rosto, se ao teu lado
passo. E eu, baixo os meus olhos se te avisto.
E assim fazemos, como se com isto,
pudéssemos varrer nosso passado.

Passo esquecido de te olhar, coitado!
Vais, coitada, esquecida de que existo.
Como se nunca me tivesses visto,
como se eu sempre nĂŁo te houvesse amado

Mas, se Ă s vezes, sem querer nos entrevemos,
se quando passo, teu olhar me alcança
se meus olhos te alcançam quando vais.

Ah! SĂł Deus sabe! SĂł nĂłs dois sabemos.
Volta-nos sempre a pålida lembrança.
Daqueles tempos que nĂŁo voltam mais!

Buscando A Cristo

A vós correndo vou, braços sagrados,
Nessa cruz sacrossanta descobertos
Que, para receber-me, estais abertos,
E, por nĂŁo castigar-me, estais cravados.

A vĂłs, divinos olhos, eclipsados
De tanto sangue e lĂĄgrimas abertos,
Pois, para perdoar-me, estais despertos,
E, por nĂŁo condenar-me, estais fechados.

A vós, pregados pés, por não deixar-me,
A vĂłs, sangue vertido, para ungir-me,
A vĂłs, cabeça baixa, p’ra chamar-me

A vĂłs, lado patente, quero unir-me,
A vĂłs, cravos preciosos, quero atar-me,
Para ficar unido, atado e firme.

Beijos Do CĂ©u

Sonhei-te assim, Ăł minha amante, um dia:
– Vi-te no cĂ©u; e, anamoradamente,
De beijos, a falange resplendente
Dos serafins, teu corpo inteiro ungia…

Santos e anjos beijavam-te… Eu bem via
Beijavam todos o teu lĂĄbio ardente;
E, beijando-te, o prĂłprio Onipotente,
O próprio Deus nos braços te cingia!

Nisto, o ciĂșme – fera que eu nĂŁo domo –
Despertou-me do sonho, repentino
Vi-te a dormir tĂŁo plĂĄcida a meu lado…

E beijei-te tambĂ©m, beijei-te… e, ai! como
Achei doce o teu lĂĄbio purpurino.
Tantas vezes assim no céu beijado!

A Visita

Hontem dormia Ă  noute – e, eis que desperto
Sacudido d’um vento agudo e forte,
Como um homem tocado pela Morte,
Ou varrido d’um vento do deserto.

Accordei – era Deus, que de mim perto,
Me dizia: Alma sceptica e sem norte!
É preciso que creias e te importe
Adorar o Deus Uno, Eterno, e Certo!

É preciso que a fĂ© cresça em tua alma
Como no inutil saibro a verde palma,
Verme! filho da Duvida–Eis-me aqui!

Eu sou a Espada o Antigo, o Omnipotente!
CrĂȘ barro vil! – Mas eu, descortezmente,
Voltei-me do outro lado e adormeci.

Pensando Nela

Neste instante em que escrevo, estou pensando nela,
longe de mim, no entanto, em que estarĂĄ pensando ?
– quem sabe se a sonhar, debruçada Ă  janela
recorda nosso amor, a sorrir, vez em quando…

Ou terå tal como eu, esse ar de alguém que vela
um sonho que estivesse em nosso olhar flutuando ?
Ou quem sabe se dorme, e adormecida e bela
o luar lhe vai beijar os lĂĄbios, suave e brando…

Invejaria o luar… É tarde, estou sozinho,
ela dorme talvez, e nĂŁo sabe que ao lado
do seu leito, a minha alma ronda de mansinho…

Nem vĂȘ meu pensamento entrar pela janela
e ir na ponta dos pés murmurar ajoelhado
este verso de amor que fiz, pensando nela!

Caminho III

Fez-nos bem, muito bem, esta demora:
Enrijou a coragem fatigada…
Eis os nossos bordÔes da caminhada,
Vai jĂĄ rompendo o sol: vamos embora.

Este vinho, mais virgem do que a aurora,
TĂŁo virgem nĂŁo o temos na jornada…
Enchamos as cabaças: pela estrada,
Daqui inda este nĂ©ctar avigora!…

Cada um por seu lado!… Eu vou sozinho,
Eu quero arrostar sĂł todo o caminho,
Eu posso resistir Ă  grande calma!…

Deixai-me chorar mais e beber mais,
Perseguir doidamente os meus ideais,
E ter fĂ© e sonhar – encher a alma.

O Último NĂșmero

Hora da minha morte. Hirta, ao meu lado,
A idĂ©ia estertorava-se… No fundo
Do meu entendimento moribundo
jazia o Ășltimo nĂșmero cansado.

Era de vĂȘ-lo, imĂłvel, resignado,
Tragicamente de si mesmo oriundo,
Fora da sucessĂŁo, estranho ao mundo,
Com o reflexo fĂșnebre do Increado:

Bradei: – Que fazes ainda no meu crĂąnio?
E o Ășltimo nĂșmero, atro e subterrĂąneo,
Parecia dizer-me: “É tarde, amigo!

Pois que a minha ontogĂȘnica Grandeza
Nunca vibrou em tua lĂ­ngua presa,
NĂŁo te abandono mais! Morro contigo!”

A Luz

Ela veio…( E a minha alma tinha a porta
aberta, e ela entrou…Casa vazia
e estranha, esta que em plena luz do dia
lembrava a tumba de uma noite morta…)

Que ela havia chegado, eu nem sabia…
Mas, pouco a pouco, e a data nĂŁo importa,
minha alma, por encanto, se conforta,
e hĂĄ risos pela casa…E hĂĄ alegria…

Quem abrira as janelas? Quem levara
o fantasma da dor sempre ao meu lado?
Os antigos retratos, quem rasgara?

E acabei por fazer a descoberta:
– ela espantara as sombras do passado
e a luz entrara pela porta aberta!

Fui Gostar De VocĂȘ

“Fui Gostar de VocĂȘ”
II
Fui gostar de vocĂȘ – facilitei
no poder de seus olhos… Que loucura! …
– Nunca pensei que um dia esta figura
havia de fazer… Nunca pensei…

Bem triste a pantomima. . . E o que nem sei
Ă© como hei de aturar esta tortura,
de ver vocĂȘ e alguĂ©m numa ventura
que sonhei para mim – que em vĂŁo sonhei

Fui gostar de vocĂȘ – e agora vejo
que este amor viverĂĄ num sonho apenas,
– na renĂșncia suprema do que almejo…

É inĂștil meu viver… Hoje, ao seu lado
sou alguém que sepulta as próprias penas
no orgulho triste de quem foi deixado.

Colegial

Gosto de vĂȘ-la, assim… Quando Ă  tarde ela vem
fisionomia suave, ingenuamente franca…
Toda a rua se alegra, e eu me alegro também
com o seu vulto feliz: saia azul, blusa branca…

Quantos nadas de sonho o seu olhar contém!
A luz viva do olhar ninguém talvez lhe arranca.
– Gosto de ve-la, sim… E ficam-lhe tĂŁo bem
aquela saia azul, e aquela blusa branca…

Azul: – azul Ă© a cor da vida que ela sonha!
E branca: – branca Ă© a cor da sua alma de criança
onde ela prĂłpria se olha irrequieta e risonha

Feliz… NĂŁo tem presente e ainda nem tem passado…
SĂł o futuro, – e o futuro Ă© uma imensa esperança
um mundo que ainda fica oculto do outro lado!

Ciganos em Viagem

A tribo que prevĂȘ a sina dos viventes
Levantou arraiais hoje de madrugada;
Nos carros, as mulher’, c’o a torva filharada
Às costas ou sugando os mamilos pendentes;

Ao lado dos carrÔes, na pedregosa estrada,
Vão os homens a pé, com armas reluzentes,
Erguendo para o céu uns olhos indolentes
Onde jĂĄ fulgurou muita ilusĂŁo amada.

Na buraca onde estĂĄ encurralado, o grilo,
Quando os sente passar, redobra o meigo trilo;
Cibela, com amor, traja um verde mais puro,

Faz da rocha um caudal, e um vergel do deserto,
Para assim receber esses p’ra quem ‘stĂĄ aberto
O império familiar das trevas do futuro!

Tradução de Delfim Guimarães

Senhora I

No calmo colo pouso meus segredos
Senhora que sabeis minhas fraquezas.
convoco sĂł convosco o que antecedo
na lira ensimesmada da incerteza.

NĂŁo sei se o vero verso do degredo
vem albergado ou presa de represa
das frias ĂĄguas Ă­ntimas do medo
lavando o frĂĄgil lado da tristeza.

A depressiva face nĂŁo mostrada
esplende em vosso espelho que me abriga
lambendo o sal dos olhos da geada.

Águas que são do orvalho da fadiga
de recorrentes gotas espalhadas
regando as vossas mĂŁos de amada e amiga

Namorados

Um ao lado do outro, – assim juntinhos,
mãos enlaçadas num enlevo infindo,
– seguem… a imaginar que estĂŁo seguindo
o mais suave de todos os caminhos…

Com gravetos de sonho vĂŁo construindo
na terra, como no ar os passarinhos,
a esplĂȘndida ilusĂŁo de um mundo lindo,
entre beijos, sorrisos e carinhos…

Nada tolda os seus olhos… Nem um vĂ©u…
Andam sem ver os lados, vendo o fim
e o fim que vĂȘem Ă© o azul do cĂ©u…

Ah! se a gente, tal como namorados,
pudesse eternamente andar assim
pela vida a sonhar de braços dados!

Luva Abandonada

Uma só vez calçar-vos me foi dado,
Dedos claros! A escura sorte minha,
O meu destino, como um vento irado,
Levou-vos longe e me deixou sozinha!

Sobre este cofre, desta cama ao lado,
Murcho, como uma flor, triste e mesquinha,
Bebendo ĂĄvida o cheiro delicado
Que aquela mĂŁo de dedos claros tinha.

CĂĄlix que a alma de um lĂ­rio teve um dia
Em si guardada, antes que ao chĂŁo pendesse,
Breve me hei de esfazer em poeira, em nada…

Oh! em que chaga viva tocaria
Quem nesta vida compreender pudesse
A saudade da luva abandonada!

Caminho

I

Tenho sonhos cruĂ©is; n’alma doente
Sinto um vago receio prematuro.
Vou a medo na aresta do futuro,
Embebido em saudades do presente…

Saudades desta dor que em vĂŁo procuro
Do peito afugentar bem rudemente,
Devendo, ao desmaiar sobre o poente,
Cobrir-me o coração dum vĂ©u escuro!…

Porque a dor, esta falta d_harmonia,
Toda a luz desgrenhada que alumia
As almas doidamente, o cĂ©u d’agora,

Sem ela o coração é quase nada:
Um sol onde expirasse a madrugada,
Porque Ă© sĂł madrugada quando chora.

II

Encontraste-me um dia no caminho
Em procura de quĂȘ, nem eu o sei.
d Bom dia, companheiro, te saudei,
Que a jornada Ă© maior indo sozinho

É longe, Ă© muito longe, hĂĄ muito espinho!
Paraste a repousar, eu descansei…
Na venda em que poisaste, onde poisei,
Bebemos cada um do mesmo vinho.

É no monte escabroso, solitário.
Corta os pés como a rocha dum calvårio,
E queima como a areia!… Foi no entanto

Que choramos a dor de cada um…

Continue lendo…

A Alma Dos Vinte Anos

A alma dos meus vinte anos noutro dia
Senti volver-me ao peito, e pondo fora
A outra, a enferma, que lĂĄ dentro mora,
Ria em meus lĂĄbios, em meus olhos ria.

Achava-me ao teu lado entĂŁo, Luzia,
E da idade que tens na mesma aurora;
A tudo o que jĂĄ fui, tornava agora,
Tudo o que ora nĂŁo sou, me renascia.

Ressenti da paixĂŁo primeira e ardente
A febre, ressurgiu-me o amor antigo
Com os seus desvarios e com os seus enganos…

Mas ah! quando te foste, novamente
A alma de hoje tornou a ser comigo,
E foi contigo a alma dos meus vinte anos.

O Redentor Chorando

Se considero o triste abatimento
Em que me faz jazer minha desgraça,
A desesperação me despedaça,
No mesmo instante, o frĂĄgil sofrimento.

Mas sĂșbito me diz o pensamento,
Para aplacar-me a dor que me traspassa,
Que Este que trouxe ao mundo a Lei da Graça,
Teve num vil presepe o nascimento.

Vejo na palha o Redentor chorando,
Ao lado a MĂŁe, prostrados os pastores,
A milagrosa estrela os reis guiando.

Vejo-O morrer depois, Ăł pecadores,
Por nĂłs, e fecho os olhos, adorando
Os castigos do CĂ©u como favores.

Enquanto Dormes

NĂŁo consigo dormir… A meu lado, ressonas
em completo abandono, tranqĂŒila, confiante,
e eu me ponho a pensar em nossas vidas, nossas
vidas, juntas no sonho, como em nosso leito.

E me deixo ficar assim, na leve insĂŽnia
que me traz à lembrança tantas coisas, tantas,
que fizeram de nĂłs, de nossos passos, uma
rede em que duas linhas sĂŁo como uma sĂł.

E sem querer percebo que o que estou pensando
tem jeito de poesia, em versos simples, versos
sem rimas, e levanto-me, e venho escrever

a observar-te Ă  distĂąncia, a ressonar, feliz,
sem poderes sequer calcular que a teu lado
um poeta te ama e sonha, e faz versos de amor.