Sonetos sobre Longe de Manuel Maria Barbosa du Bocage

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Eu Deliro, GertrĂşria, eu Desespero

Eu deliro, GertrĂşria, eu desespero
No inferno de suspeitas e temores.
Eu da morte as angĂşstias e os horrores
Por mil vezes sem morrer tolero.

Pelo CĂ©u, por teus olhos te assevero
Que ferve esta alma em cândidos amores;
Longe o prazer de ilĂ­citos favores!
Quero o teu coração, mais nada quero.

Ah! não sejas também qual é comigo
A cega divindade, a Sorte dura.
A vária Deusa, que me nega abrigo!

Tudo perdi: mas valha-me a ternura
Amor me valha, e pague-me contigo
Os roubos que me faz a má ventura.

Esperança Amorosa

Grato silêncio, trémulo arvoredo,
Sombra propĂ­cia aos crimes e aos amores,
Hoje serei feliz! – Longe, temores,
Longe, fantasmas, ilusões do medo.

Sabei, amigos ZĂ©firos, que cedo
Entre os braços de Nise, entre estas flores,
Furtivas glórias, tácitos favores,
Hei-de enfim possuir: porém segredo!

Nas asas frouxos ais, brandos queixumes
Não leveis, não façais isto patente,
Quem nem quero que o saiba o pai dos numes:

Cale-se o caso a Jove omnipotente,
Porque, se ele o souber, terá ciúmes,
Vibrará contra mim seu raio ardente.

Apenas Vi Do Dia A Luz Brilhante

Apenas vi do dia a luz brilhante
Lá de Túbal no empório celebrado,
Em sanguíneo carácter foi marcado
Pelos Destinos meu primeiro instante.

Aos dois lustros a morte devorante
Me roubou, terna mĂŁe, teu doce agrado;
Segui Marte depois, e em fim meu fado
Dos irmĂŁos e do pai me pĂ´s distante.

Vagando a curva terra, o mar profundo,
Longe da pátria, longe da ventura,
Minhas faces com lágrimas inundo.

E enquanto insana multidĂŁo procura
Essas quimeras, esses bens do mundo,
Suspiro pela paz da sepultura.