Sonetos sobre Melancolia

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Sonetos de melancolia escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Pôs-se o Sol

Pôs-se o sol… Como já na sombra feia
Do dia pouco a pouco a luz desmaia,
E a parda mão da noite, antes que caia,
De grossas nuvens todo o ar semeia!

Apenas já diviso a minha aldeia;
Já do cipreste não distingo a faia.
Tudo em silêncio está; só lá na praia
Se ouvem quebrar as ondas pela areia.

Co’a mão na face, a vista ao céu levanto;
E cheio de mortal melancolia,
Nos tristes olhos mal sustenho o pranto.

E se inda algum alívio ter podia,
Era ver esta noite durar tanto
Que nunca mais amanhecesse o dia!

Teus Olhos

Teus olhos de tão mística elegia,
resplandecentes de penumbra viva,
Perdem-se em mim: do meu olhar deriva
A luz da mais cristã melancolia!

Possa eu viver em ti, nessa harmonia
De memorante paz meditativa;
Minha alma da tua alma se cativa,
Aspira o teu silêncio que inebria!

Teu vulto no Ar imprime-se em debuxos
De recortada flor; visões perpassam
Nocturnamente nos teus olhos bruxos!

Uma fonte discorre outonos tristes;
Caem flores do Céu; almas esvoaçam;
Estendo as mãos… adeus! Já não existes!

II

Celeste… É assim, divina, que te chamas.
Belo nome tu tens, Dona Celeste…
Que outro terias entre humanas damas,
Tu que embora na terra do céu vieste?

Celeste… E como tu és do céu não amas:
Forma imortal que o espírito reveste
De luz, não temes sol, não temes chamas,
Porque és sol, porque és luar, sendo celeste.

Incoercível como a melancolia,
Andas em tudo: o sol no poente vasto
Pede-te a mágoa do findar do dia.

E a lua, em meio à noite constelada,
Pede-te o luar indefinido e casto
Da tua palidez de hóstia sagrada.

Fogo-Fátuo

Cabelos brancos! dai-me, enfim, a calma
A esta tortura de homem e de artista:
Desdém pelo que encerra a minha palma,
E ambição pelo mais que não exista;

Esta febre, que o espírito me encalma
E logo me enregela; esta conquista
De idéias, ao nascer, morrendo na alma,
De mundos, ao raiar, murchando à vista:

Esta melancolia sem remédio,
Saudade sem razão, louca esperança
Ardendo em choros e findando em tédio;

Esta ansiedade absurda, esta corrida
Para fugir o que o meu sonho alcança,
Para querer o que não há na vida!

Paisagens de Inverno

I

Ó meu coração, torna para trás.
Onde vais a correr, desatinado?
Meus olhos incendidos que o pecado
Queimou! o sol! Volvei, noites de paz.

Vergam da neve os olmos dos caminhos.
A cinza arrefeceu sobre o brasido.
Noites da serra, o casebre transido…
Ó meus olhos, cismai como os velhinhos.

Extintas primaveras evocai-as:
_ Já vai florir o pomar das maceiras.
Hemos de enfeitar os chapéus de maias._

Sossegai, esfriai, olhos febris.
_ E hemos de ir cantar nas derradeiras
Ladainhas…Doces vozes senis…_

II

Passou o outono já, já torna o frio…
_ Outono de seu riso magoado.
llgido inverno! Oblíquo o sol, gelado…
_ O sol, e as águas límpidas do rio.

Águas claras do rio! Águas do rio,
Fugindo sob o meu olhar cansado,
Para onde me levais meu vão cuidado?
Aonde vais, meu coração vazio?

Ficai, cabelos dela, flutuando,
E, debaixo das águas fugidias,
Os seus olhos abertos e cismando…

Onde ides a correr, melancolias?
_ E, refratadas, longamente ondeando,

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Mãe

Olha, meu filho! quando, à aragem fria
De algum torvo crepúsculo, encontrares
Uma árvore velhinha, em modo e em ares
De abandono e outonal melancolia,

Não passes junto dela nesse dia
E nessa hora de bênçãos, sem parares;
Não vás, sem longamente a contemplares:
Vida cansada, trémula e sombria!

Já foi nova e floriu entre esplendores:
Talvez em derredor, dos seus amores
Inda haja filhos que lhe queiram bem…

Ama-a, respeita-a, ampara-a na velhice;
Sorri-lhe com bondade e com meiguice:
— Lembre-te, ao vê-la, a tua própria Mãe!

Soneto de Devoção

Essa mulher que se arremessa, fria
E lúbrica aos meus braços, e nos seios
Me arrebata e me beija e balbucia
Versos, votos de amor e nomes feios.

Essa mulher, flor de melancolia
Que se ri dos meus pálidos receios
A única entre todas a quem dei
Os carinhos que nunca a outra daria.

Essa mulher que a cada amor proclama
A miséria e a grandeza de quem ama
E guarda a marca dos meus dentes nela.

Essa mulher é um mundo! — uma cadela
Talvez… — mas na moldura de uma cama
Nunca mulher nenhuma foi tão bela!