Razões
“Razões…”
I
Pensarás que é mentira e é no entanto verdade
– mas me afasto de ti, propositadamente,
pelo estranho prazer de sentir que a saudade
ainda torna maior o coração da gente…Parto! Bem sei que parto sem necessidade!
Quero ver os teus olhos turvos, de repente,
embora não compreenda essa felicidade
que assim te faz sofrer comigo inutilmente!Quero ouvir-te na hora da despedida
que eu volte bem depressa para a tua vida,
– quero no último beijo um soluço interior…Que enquanto ficas só, e enquanto vou sozinho,
sabemos que a saudade vai tecendo o ninho
que há de aquecer na volta o nosso eterno amor!
Sonetos sobre Mentira de J. G. de Araújo Jorge
9 resultadosDesfolhando
Essa boca, pequena, e assim vermelha,
que ao botão de uma rosa se assemelha,
– quanta vez provocava os meus desejos
desabrochando em flor entre os meus beijos…Essa boca, pequena e mentirosa,
que diz, tanta mentira cor-de-rosa,
– era a taça de amor onde eu saciava
toda a ansiedade da minha alma escrava …Beijando-a, compreendia que eras minha…
Meu amor transformava-te em rainha,
teu amor me fazia mais que um rei…Agora, tu fugiste… E eu sofro, quando
vejo um outro em teus lábios desfolhando
a mesma rosa que eu desabrochei!…
Incoerência ?
Achas-me indiferente… e até crês que há desdém
quando falo de amor em palavras singelas…
– pensas que as juras todas que já ouviste, aquelas
juras, a outras mulheres vou fazer também…Dizes que não te quero… E eu te pergunto: – a quem
devo tudo o que fiz, as poesias mais belas?
– outras dirão talvez que as fiz pensando nelas,
mas todas te pertencem mais do que a ninguém!Não vês que o que te cerca é a mentira da vida…
– nem sabes descobrir essa paixão imensa
que o meu orgulho torna egoísta e dolorida…Não vês que o meu viver é falso, – e se resume
em te amar como um louco em minha indiferença,
e fingir que amo as outras para teu ciúme!
Mentira
Tanta cousa passou… E, no entanto, vivemos
noutros tempos, felizes, como namorados…
– Nossa vida… ora a vida, era um barco sem remos,
levando-nos ao léu… a sonhar acordados…Ontem juntos, felizes… hoje, separados,
– (não pensei que este amor chegasse a tais extremos…)
E sorrimos em vão… sorrimos conformados
na mentira cruel de que a tudo esquecemos. . .Cruzamos nossos passos muita vez: – é a vida!
– eu, volto o rosto (fraco à paixão que ainda sinto),
tu, recalcando o amor, nem me olhas, distraída…Mentira inútil, cruel… se ontem, tal como agora,
tu sabes que padeço, sabes quanto eu minto,
e eu sei quanto este amor te atormenta e devora!
Solitário
Longe de ti, do mundo – solitário.
sem o riso das falsas alegrias
vou desfiando, um a um, todos os dias,
como contas de dor, no meu rosário…E assim – sem Ter ninguém – oh, quantas vezes!
– no amor que já deixei fico a pensar…
E as semanas se escoam sem parar:
a primeira… outra mais… mais outra… e os meses…O outono já chegou, e as folhas solta…
E eu, sem querer, nostálgico, me ponho
a pensar que esse amor aos poucos volta…Mentira!… Vã mentira que me ilude!…
Como é triste a ilusão mesmo num sonho,
Eu que na vida me iludir não pude!…
Amor De Mentiras
“Amor… De Mentiras…”
I
Eram beijos de fogo, eram de lavas,
e sabiam a sonhos e ambrosias.
Como pensar que a boca com que os dava
era a mesma afinal com que mentias?Se eras as mais humilde das escravas
em dádivas, anseios, alegrias,
– como prever que o amor que me juravas
seria mais uma das tuas heresias ?Como supor ser tudo um falso jogo?
E crer que se extinguisse aquele fogo
que acendia em teus olhos duas piras?E descobrir, – no instante em que me amavas, –
que em tua boca ansiosa misturavas
ao mesmo tempo beijos e mentiras ?
Tua Carta
A carta que escreveste é a oração que repito
todas as noites, sempre, antes de me deitar,
à hora em que abro a janela ao azul do infinito
e me ausento de tudo… e me esqueço a sonhar…Eu, descrente da terra e dos homens, descrente
mais ainda dos céus, com bem maior razão,
murmuro a tua carta religiosamente
pois fiz do teu amor a minha religião…Tua carta, nem sei… releio-a a todo instante,
ela acende em meus olhos tristes alegrias
e me faz esquecer que te encontras distante…Paradoxos talvez, mentiras!… Não te esqueço
se toda noite assim ( há não sei quantos dias ),
com teu nome em meus lábios… rezando adormeço!…
Fui Gostar De Você
“Fui Gostar de Você”
I
Fui gostar de você, – isso foi quando
julguei que ainda podia ser feliz. . .
Ilusão!… Hoje as pedras vou tirando
do castelo de amor que eu mesmo fiz…Conformo-me no entanto, – mesmo estando
como estou, da loucura, por um triz…
E procuro do peito ir apagando
a cor de um vulto de mulher que eu quis…Quanto sonho fatal! Quanta cegueira
fez com que eu me iludisse com as safiras
de uns olhos lindos de mulher brejeira…Fui gostar. . . e gostei … Sofri portanto
ao descobrir as múltiplas mentiras
que eram do amor o seu supremo encanto
Amor De Mentiras
“Amor… De Mentiras…”
II
Eram brancas as mãos, brancas e puras,
mãos de lã, de pelúcia, mãos amadas…
Como prever, vendo-as fazer ternuras,
que nas unhas traziam emboscadas ?Era tão doce o olhar… em conjeturas
felizes, e em promessas impensadas…
Como enxergar, portanto, as amarguras
e as frias traições nele guardadas ?Como pensar em duas, se somente
uma eu tinha em meus braços, e adorava,
e a outra, – uma impostora, – se mantinha ausente.E, afinal, como ver, nessa alegria,
que o amor que tanta Vida me ofertava
seria o mesmo que me mataria ?