O Sono
É um braço magro de mulher, uns olhos espectrais
e brilhantes, uma cabeça de esfinge, uma lâmpada
que fumega. Talvez por os não vermos, vejamos rios
que flamejam, jardins sepultos, um antepassadodesconhecido e cinzento que se derrama no quarto,
um portão esvoaçante, uma pequena fenda por onde
se vai até às nuvens nocturnas. Tudo o que
lá possa estar é tudo: a vassoura esquecida,o rosto primordial da mãe, uma torre de cadáveres
ou um modesto banco de madeira onde deixaram
um vaso verídico de gerânios. Talvez um deusvítreo, rútilo ou, pintada de azul, uma virgem ocre
no cume de colina grega. Uma estranha música soa
nas paredes, antes do exílio para onde nos leva o sono.
Sonetos sobre Nuvens de Orlando Neves
2 resultados Sonetos de nuvens de Orlando Neves. Leia este e outros sonetos de Orlando Neves em Poetris.
O Coração – II
A solidão é perfeita como um rasgo entre
as nuvens, ao último sonho. A solidão
que se cala em teu fundo e vai envelhecendo
na terra perdida do som descompassado.Te guardas na intimidade dos armários,
onde a paz é negra e se desagrega a luz.
Nunca foste mais do que uma ficção, matriz
de riso e sombra, um poço verde, teoremade ilusões, engrenagem de poentes roxos.
E, agora, frouxo, já nada designas ou
desenhas. És, apenas, testemunha efémerae longínqua, trovão engolido de Deus,
fingidor ferido de doces cantos, mentira
precária nas cordas de uma harpa febril.