LXXV
Como se moço e não bem velho eu fosse
Uma nova ilusĂŁo veio animar-me.
Na minh’alma floriu um novo carme,
O meu ser para o céu alcandorou-se.Ouvi gritos em mim como um alarme.
E o meu olhar, outrora suave e doce,
Nas ânsias de escalar o azul, tornou-se
Todo em raios que vinham desolar-me.Vi-me no cimo eterno da montanha,
Tentando unir ao peito a luz dos cĂrios
Que brilhavam na paz da noite estranha.Acordei do áureo sonho em sobressalto:
Do cĂ©u tombei aos caos dos meus martĂrios,
Sem saber para que subi tĂŁo alto…
Sonetos sobre Olhar de Alphonsus de Guimaraens
3 resultadosIV
Vagueiam suavemente os teus olhares
Pelo amplo céu franjado em linho:
Comprazem-te as visões crepusculares…
Tu Ă©s uma ave que perdeu o ninho.Em que nichos doirados, em que altares
Repoisas, anjo errante, de mansinho?
E penso, ao ver-te envolta em véus de luares,
Que vês no azul o teu caixão de pinho.És a essência de tudo quanto desce
Do solar das celestes maravilhas…
– Harpa dos crentes, cĂtola da prece…Lua eterna que nĂŁo tivesse fases,
Cintilas branca, imaculada brilhas,
E poeiras de astros nas sandálias trazes…
X
Hirta e branca… Repousa a sua áurea cabeça
Numa almofada de cetim bordada em lĂrios.
Ei-la morta afinal como quem adormeça
Aqui para sofrer AlĂ©m novos martĂrios.De mĂŁos postas, num sonho ausente, a sombra espessa
Do seu corpo escurece a luz dos quatro cĂrios:
Ela faz-me pensar numa ancestral Condessa
Da Idade MĂ©dia, morta em sagrados delĂrios.Os poentes sepulcrais do extremo desengano
VĂŁo enchendo de luto as paredes vazias,
E velam para sempre o seu olhar humano.Expira, ao longe, o vento, e o luar, longinquamente,
Alveja, embalsamando as brancas agonias
Na sonolenta paz desta Câmara-ardente…