Na Tebaida
Chegas, com os olhos Ășmidos, tremente
A voz, os seios nus, como a rainha
Que ao ermo frio da Tebaida vinha
Trazer a tentação do amor ardente.Luto: porém teu corpo se avizinha
Do meu, e o enlaça como uma serpente..
Fujo: porém a boca prendes, quente,
Cheia de beijos, palpitante, Ă minha…Beija mais, que o teu beijo me incendeia!
Aperta os braços mais! que eu tenha a morte,
Preso nos laços de prisão tão doce!Aperta os braços mais, frågil cadeia
Que tanta força tem não sendo forte,
E prende mais que se de ferro fosse!
Sonetos sobre Olhos de Olavo Bilac
11 resultadosXXXI
Longe de ti, se escuto, porventura,
Teu nome, que uma boca indiferente
Entre outros nomes de mulher murmura,
Sobe-me o pranto aos olhos, de repente…Tal aquele, que, mĂsero, a tortura
Sofre de amargo exĂlio, e tristemente
A linguagem natal, maviosa e pura,
Ouve falada por estranha gente…Porque teu nome Ă© para mim o nome
De uma pĂĄtria distante e idolatrada,
Cuja saudade ardente me consome:E ouvi-lo Ă© ver a eterna primavera
E a eterna luz da terra abençoada,
Onde, entre flores, teu amor me espera.
XXXIII
Quando adivinha que vou vĂȘ-Ia, e Ă escada
Ouve-me a voz e o meu andar conhece,
Fica pĂĄlida, assusta-se, estremece,
E não sei por que foge envergonhada.Volta depois. à porta, alvoroçada,
Sorrindo, em fogo as faces, aparece:
E talvez entendendo a muda prece
De meus olhos, adianta-se apressada.Corre, delira, multiplica os passos;
E o chĂŁo, sob os seus passos murmurando,
Segue-a de um hino, de um rumor de festaE ah! que desejo de a tomar nos braços,
O movimento rĂĄpido sustando
Das duas asas que a paixĂŁo lhe empresta.
XI
Todos esses louvores, bem o viste,
NĂŁo conseguiram demudar-me o aspecto:
SĂł me turbou esse louvor discreto
Que no volver dos olhos traduziste…Inda bem que entendeste o meu afeto
E, através destas rimas, pressentiste
Meu coração que palpitava, triste,
E o mal que havia dentro em mim secreto.Ai de mim, se de lĂĄgrimas inĂșteis
Estes versos banhasse, ambicionando
Das nĂ©scias turbas os aplausos fĂșteis!Dou-me por pago, se um olhar lhes deres:
Fi-los pensando em ti, fi-los pensando
Na mais pura de todas as mulheres.
X
Deixa que o olhar do mundo enfim devasse
Teu grande amor que Ă© teu maior segredo!
Que terias perdido, se, mais cedo,
Todo o afeto que sentes se mostrasse?Basta de enganos! Mostra-me sem medo
Aos homens, afrontando-os face a face:
Quero que os homens todos, quando eu passe,
Invejosos, apontem-me com o dedo.Olha: nĂŁo posso mais! Ando tĂŁo cheio
Deste amor, que minh’alma se consome
De te exaltar aos olhos do universo…Ouço em tudo teu nome, em tudo o leio:
E, fatigado de calar teu nome,
Quase o revelo no final de um verso.
Em uma Tarde de Outono
Outono. Em frente ao mar. Escancaro as janelas
Sobre o jardim calado, e as ĂĄguas miro, absorto.
Outono… Rodopiando, as folhas amarelas
Rolam, caem. Viuvez, velhice, desconforto…Por que, belo navio, ao clarĂŁo das estrelas,
Visitaste este mar inabitado e morto,
Se logo, ao vir do vento, abriste ao vento as velas,
Se logo, ao vir da luz, abandonaste o porto?A ĂĄgua cantou. Rodeava, aos beijos, os teus flancos
A espuma, desmanchada em riso e flocos brancos…
Mas chegaste com a noite, e fugiste com o sol!E eu olho o céu deserto, e vejo o oceano triste,
E contemplo o lugar por onde te sumiste,
Banhado no clarĂŁo nascente do arrebol…
Leio-Te: – O Pranto Dos Meus Olhos Rola:
Leio-te: – o pranto dos meus olhos rola:
– Do seu cabelo o delicado cheiro,
Da sua voz o timbre prazenteiro,
Tudo do livro sinto que se evola …Todo o nosso romance: – a doce esmola
Do seu primeiro olhar, o seu primeiro
Sorriso, – neste poema verdadeiro,
Tudo ao meu triste olhar se desenrola.Sinto animar-se todo o meu passado:
E quanto mais as pĂĄginas folheio,
Mais vejo em tudo aquele vulto amado.Ouço junto de mim bater-lhe o seio,
E cuido vĂȘ-la, plĂĄcida, a meu lado,
Lendo comigo a pĂĄgina que leio.
Vita Nuova
Se ao mesmo gozo antigo me convidas,
Com esses mesmos olhos abrasados,
Mata a recordação das horas idas,
Das horas que vivemos apartados!NĂŁo me fales das lĂĄgrimas perdidas,
NĂŁo me fales dos beijos dissipados!
HĂĄ numa vida humana cem mil vidas,
Cabem num coração cem mil pecados!Amo-te! A febre, que supunhas morta,
Revive. Esquece o meu passado, louca!
Que importa a vida que passou? que importa,Se inda te amo, depois de amores tantos,
E inda tenho, nos olhos e na boca,
Novas fontes de beijos e de prantos?!
No Meio Do Caminho
Cheguei. Chegaste. Vinhas fatigada
E triste, e triste e fatigado eu vinha.
Tinhas a alma de sonhos povoada,
E a alma de sonhos povoada eu tinha…E paramos de sĂșbito na estrada
Da vida: longos anos, presa Ă minha
A tua mĂŁo, a vista deslumbrada
Tive da luz que teu olhar continha.Hoje segues de novo… Na partida
Nem o pranto os teus olhos umedece,
Nem te comove a dor da despedida.E eu, solitĂĄrio, volto a face, e tremo,
Vendo o teu vulto que desaparece
Na extrema curva do caminho extremo.
XXVIII
Pinta-me a curva destes cĂ©us … Agora,
Erecta, ao fundo, a cordilheira apruma:
Pinta as nuvens de fogo de uma em uma,
E alto, entre as nuvens, o raiar da aurora.Solta, ondulando, os véus de espessa bruma,
E o vale pinta, e, pelo vale em fora,
A correnteza tĂșrbida e sonora
Do ParaĂba, em torvelins de espuma.Pinta; mas vĂȘ de que maneira pintas …
Antes busques as cores da tristeza,
Poupando o escrĂnio das alegres tintas:– Tristeza sir-gular, estranha mĂĄgoa
De que vejo coberta a natureza,
Porque a vejo com os olhos rasos d’ĂĄgua …
XXII
A Goethe.
Quando te leio, as cenas animadas
Por teu gĂȘnio, as paisagens que imaginas,
Cheias de vida, avultam repentinas,
Claramente aos meus olhos desdobradas.Vejo o céu, vejo as serras coroadas
De gelo, e o sol que o manto das neblinas
Rompe, aquecendo as frĂgidas campinas
E iluminando os vales e as estradas.Ouço o rumor soturno da charrĂșa,
E os rouxinĂłis que, no carvalho erguido,
A voz modulam de ternuras cheia.E vejo, Ă luz tristĂssima da lua,
Hermann que cisma, pĂĄlido, embebido
No meigo olhar da loura DorothĂ©a…