Sonetos sobre Palácios

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Sonetos de palácios escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

NĂŁo Desejo Chegar a tal Grandeza

NĂŁo desejo chegar a tal grandeza,
Que aduladores vis cerquem meus lados,
Nem palácios magníficos doirados,
Ricas alfaias, nem polida mesa.

Não me lembram heranças, nem riqueza,
Que me obrigue a pĂ´r nela meus cuidados;
NĂŁo ocupar honrosos magistrados,
Nem outras coisas vĂŁs, que o mundo preza.

Quisera sĂł fugir de tanta estima,
Livrar-me deste pélago profundo,
Mudar da natureza que me anima;

Subir da lua ao globo alto e rotundo,
E depois de apanhar-me lá de cima,
Desatar os calções, cagar no mundo.

5A E 6A Sombras – Cândida E Laura

Como no tanque de um palácio mago,
Dous alvos cisnes na bacia lisa,
Como nas águas que o barqueiro frisa,
Dous nenĂşfares sobre o azul do lago,

Como nas hastes em balouço vago
Dous lĂ­rios roxos que acalenta a brisa,
Como um casal de juritis que pisa
O mesmo ramo no amoroso afago….

Quais dous planetas na cerĂşlea esfera,
Como os primeiros pâmpanos das vinhas,
Como os renovos nos ramais da hera,

Eu vos vejo passar nas noites minhas,
Crianças que trazeis-me a primavera…
Crianças que lembrais-me as andorinhas! …

Renascimento

A Alma nĂŁo fica inteiramente morta!
Vagas Ressurreições do Sentimento
Abrem já, devagar, porta por porta,
Os palácios reais do Encantamento!

Morrer! Findar! Desfalecer! que importa
Para o secreto e fundo movimento
Que a alma transporta, sublimiza e exorta,
Ao grande Bem do grande Pensamento!

Chamas novas e belas vĂŁo raiando,
VĂŁo se acendendo os lĂ­mpidos altares
E as almas vão sorrindo e vão orando…

E pela curva dos longĂ­nquos ares
Ei-las que vĂŞm, como o imprevisto bando
Dos albatrozes dos estranhos mares…

Morte

Num imenso salĂŁo, alto e rotundo,
De caveiras iguais, ossos sem dono,
Perpétua habitação de eterno sono
Que tem por tecto o CĂ©u, por base o mundo:

Bem no meio, em silĂŞncio o mais profundo,
Se levanta da Morte o fatal trono:
Ceptros sem rei, arados sem colono,
SĂŁo os degraus do sĂłlio furibundo.

Lanças, arneses pelo chão, quebrados,
Murchas grinaldas, báculos partidos,
Liras de vates, pastoris cajados,

Algemas, ferros e brasões luzidos,
No terrĂ­vel salĂŁo sĂŁo misturados,
No palácio da Morte confundidos.

Na Mazurka

Morava num palácio — estranha Babilônia
De arcadas colossais, de impávidos zimbórios,
Alcovas de damasco e torreões marmóreos,
Volutas primorais de arquitetura jĂ´nia.

Assim, quando surgia em meio aos peristilos
Descendo, qual mulher de SĂ©fora, vaidosa,
Envolta em ouropéis, em sedas, luxuosa,
Cercam-na do belo os mĂ­sticos sigilos!

E quando nos saraus, assim como um rainĂşnculo,
O lábio lhe tremia e o olhar, vivo carbúnculo,
Vibrava nos salões, como uma adaga turca,

Ou como o sol em cheio e rubro sobre o BĂłsforo,
— nos crânios os Homens sentiam ter mais fósforo…
Ao vê-la escultural no passo da Mazurka…

RuĂ­nas

Se Ă© sempre Outono o rir das Primaveras,
Castelos, um a um, deixa-os cair…
Que a vida Ă© um constante derruir
De palácios do Reino das Quimeras!

E deixa sobre as ruĂ­nas crescer heras,
Deixa-as beijar as pedras e florir!
Que a vida Ă© um contĂ­nuo destruir
De palácios do Reino das Quimeras!

Deixa tombar meus rĂştilos castelos!
Tenho ainda mais sonhos para erguĂŞ-los
Mais alto do que as águias pelo ar!

Sonhos que tombam! Derrocada louca!
SĂŁo como os beijos duma linda boca!
Sonhos!… Deixa-os tombar… Deixa-os tombar.

EpĂ­grafe

De palavras nĂŁo sei. Apenas tento
desvendar o seu lento movimento
quando passam ao longo do que invento
como pre-feitos blocos de cimento.

De palavras nĂŁo sei. Apenas quero
retomar-lhes o peso a consistĂŞncia
e com elas erguer a fogo e ferro
um palácio de força e resistência.

De palavras nĂŁo sei. Por isso canto
em cada uma apenas outro tanto
do que sinto por dentro quando as digo.

Palavra que me lavra. Alfaia escrava.
De mim próprio matéria bruta e brava
– expressão da multidão que está comigo.

Na MĂŁo de Deus

Na mĂŁo de Deus, na sua mĂŁo direita,
Descansou afinal meu coração.
Do palácio encantado da Ilusão
Desci a passo e passo a escada estreita.

Como as flores mortais, com que se enfeita
A ignorância infantil, despojo vão,
Depois do Ideal e da PaixĂŁo
A forma transitĂłria e imperfeita.

Como criança, em lôbrega jornada,
Que a mĂŁe leva ao colo agasalhada
E atravessa, sorrindo vagamente,

Selvas, mares, areias do deserto…
Dorme o teu sono, coração liberto,
Dorme na mĂŁo de Deus eternamente!

Teus Olhos

Olhos do meu Amor! Infantes loiros
Que trazem os meus presos, endoidados!
Neles deixei, um dia, os meus tesoiros:
Meus anéis, minhas rendas, meus brocados.

Neles ficaram meus palácios moiros,
Meus carros de combate, destroçados,
Os meus diamantes, todos os meus oiros
Que trouxe d’Além-Mundos ignorados!

Olhos do meu Amor! Fontes… cisternas..
Enigmáticas campas medievais…
Jardins de Espanha… catedrais eternas…

Berço vinde do céu à minha porta…
Ó meu leite de núpcias irreais!…
Meu sumptuoso túmulo de morta!…

O Palácio da Ventura

Sonho que sou um cavaleiro andante.
Por desertos, por sĂłis, por noite escura,
Paladino do amor, busca anelante
O palácio encantado da Ventura!

Mas já desmaio, exausto e vacilante,
Quebrada a espada já, rota a armadura…
E eis que sĂşbito o avisto, fulgurante
Na sua pompa e aérea formusura!

Com grandes golpes bato Ă  porta e brado:
Eu sou o Vagabundo, o Deserdado…
Abri-vos, portas d’ouro, ante meus ais!

Abrem-se as portas d’ouro, com fragor…
Mas dentro encontro sĂł, cheio de dor,
Silêncio e escuridão – e nada mais!

Nona Sinfonia

É por dentro de um homem que se ouve
o tom mais alto que tiver a vida
a glĂłria de cantar que tudo move
a força de viver enraivecida.

Num palácio de sons erguem-se as traves
que seguram o tecto da alegria
pedras que sĂŁo ao mesmo tempo as aves
mais livres que voaram na poesia.

Para o alto se voltam as volutas
hieráticas    sagradas    impolutas
dos sons que surgem rangem e se somem.

Mas de baixo Ă© que irrompem absolutas
as humanas palavras resolutas.
Por deus não basta. É mais preciso o Homem.

Ela, em meu Sonho

Ela vivia num palácio mouro…
Nas harpas, os seus dedos a espreitarem
como pajens curiosos, a afastarem
os cortinados todos fios de ouro.

As suas mĂŁos, tĂŁo leves como as aves,
ora fugiam volitando, frias,
ora pesam, trĂŞmulas, suaves,
nas cordas, a sonharem melodias…

E os sons que ela tangia, aos seus ouvidos
chegaram, receosos de senti-la,
voltavam a nĂŁo ser nunca tangidos.

É que ela, as suas mãos, as harpas de ouro,
nĂŁo eram mais do que um supor ouvi-la
e o meu julgá-la num palácio mouro.

Conselhos A Qualquer Tolo Para Parecer Fidalgo, Rico E Discreto

Bote a sua casaca de veludo,
E seja capitĂŁo sequer dois dias,
Converse Ă  porta de Domingos Dias,
Que pega fidalguia mais que tudo.

Seja um magano, um pĂ­caro, um cornudo,
Vá a palácio, e após das cortesias
Perca quanto ganhar nas mercancias,
E em que perca o alheio, esteja mudo.

Sempre se ande na caça e montaria,
Dê nova solução, novo epíteto,
E diga-o, sem propĂłsito, Ă  porfia;

Quem em dizendo: “facção, pretexto, efecto”.
Será no entendimento da Bahia
Mui fidalgo, mui rico, e mui discreto.

Nos Campos O VilĂŁo Sem Susto Passa

Nos campos o vilĂŁo sem susto passa
inquieto na corte o nobre mora;
o que Ă© ser infeliz aquele ignora,
este encontra nas pompas a desgraça;

aquele canta e ri, não se embaraça
com essas coisas vĂŁs que o mundo adora;
este (oh cega ambição!) mil vezes chora,
porque não acha bem que o satisfaça;

aquele dorme em paz no chĂŁo deitado,
este no ebĂşrneo leito precioso
nutre, exaspera velador cuidado,

triste, sai do palácio majestoso.
Se hás-de ser cortesão mas desgraçado,
anter ser camponĂŞs e venturoso.

A uma Mulher

Para tristezas, para dor nasceste.
Podia a sorte pôr-te o berço estreito
N’algum palácio e ao pé de régio leito,
Em vez d’este areal onde cresceste:

Podia abrir-te as flores — com que veste
As ricas e as felizes — n’esse peito:
Fazer-te… o que a Fortuna há sempre feito…
Terias sempre a sorte que tiveste!

Tinhas de ser assim… Teus olhos fitos,
Que não são d’este mundo e onde eu leio
Uns mistérios tão tristes e infinitos,

Tua voz rara e esse ar vago e esquecido,
Tudo me diz a mim, e assim o creio,
Que para isto sĂł tinhas nascido!

Loucura

Tudo cai! Tudo tomba! Derrocada
Pavorosa! NĂŁo sei onde era dantes.
Meu solar, meus palácios, meus mirantes!
Não sei de nada, Deus, não sei de nada!…

Passa em tropel febril a cavalgada
Das paixões e loucuras triunfantes!
Rasgam-se as sedas, quebram-se os diamantes!
Não tenho nada, Deus, não tenho nada!…

Pesadelos de insĂłnia, Ă©brios de anseio!
Loucura a esboçar-se, a enegrecer
Cada vez mais as trevas do meu seio!

Ă“ pavoroso mal de ser sozinha!
Ă“ pavoroso e atroz mal de trazer
Tantas almas a rir dentro da minha!

A Sesta De Nero

Fulge de luz banhado, esplĂŞndido e suntuoso,
O palácio imperial de pórfiro luzente
E mármor da Lacônia. O teto caprichoso
Mostra, em prata incrustado, o nácar do Oriente.

Nero no toro ebúrneo estende-se indolente…
Gemas em profusão do estrágulo custoso
De ouro bordado vĂŞem-se. O olhar deslumbra, ardente,
Da púrpura da Trácia o brilho esplendoroso.

Formosa ancila canta. A aurilavrada lira
Em suas mãos soluça. Os ares perfumando,
Arde a mirra da Arábia em recendente pira.

Formas quebram, dançando, escravas em coréia.
E Nero dorme e sonha, a fronte reclinando
Nos alvos seios nus da lúbrica Popéia.