Sonetos sobre Peito de Manuel Maria Barbosa du Bocage

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Sonetos de peito de Manuel Maria Barbosa du Bocage. Leia este e outros sonetos de Manuel Maria Barbosa du Bocage em Poetris.

O autor aos seus versos

Chorosos versos meus desentoados,
Sem arte, sem beleza e sem brandura,
Urdidos pela mĂŁo da Desventura,
Pela baça Tristeza envenenados:

Vede a luz, nĂŁo busqueis, desesperados,
No mudo esquecimento a sepultura;
Se os ditosos vos lerem sem ternura,
Ler-vos-ão com ternura os desgraçados:

NĂŁo vos inspire, Ăł versos, cobardia
Da sĂĄtira mordaz o furor louco,
Da maldizente voz e tirania:

Desculpa tendes, se valeis tĂŁo pouco,
Que nĂŁo pode cantar com melodia
Um peito de gemer cansado e rouco.

O CĂ©u, de Opacas Sombras Abafado

O céu, de opacas sombras abafado,
Tornando mais medonha a noite fea,
Mugindo sobre as rochas, que saltea,
O mar, em crespos montes levantado;

Desfeito em furacÔes o vento irado;
Pelos ares zunindo a solta area;
O pĂĄssaro nocturno, que vozea
No agoireiro cipreste além pousado;

Formam quadro terrĂ­vel, mas aceito,
Mas grato aos olhos meus, grato Ă  fereza
Do ciĂșme e saudade, a que ando afeito.

Quer no horror igualar-me a Natureza;
Porém cansa-se em vão, que no meu peito
HĂĄ mais escuridade, hĂĄ mais tristeza.

Neste HorrĂ­vel Sepulcro Da ExistĂȘncia

Neste horrĂ­vel sepulcro da existĂȘncia
O triste coração de dor se parte;
A mesquinha razĂŁo se vĂȘ sem arte,
Com que dome a frenĂ©tica impaciĂȘncia:

Aqui pela opressĂŁo, pela violĂȘncia
Que em todos os sentidos se reparte,
TransitĂłrio poder que imitar-te,
Eterna, vingadora omnipotĂȘncia!

Aqui onde o peito abrange, e sente,
Na mais ampla expressĂŁo acha estreiteza,
Negra idéia do abismo assombra a mente.

Difere acaso da infernal tristeza
Não ver terra, nem céu, nem mar, nem gente,
Ser vivo, e nĂŁo gozar da Natureza ?

Por esta SolidĂŁo, que nĂŁo Consente

Por esta solidĂŁo, que nĂŁo consente
Nem do sol, nem da lua a claridade,
Ralado o peito pela saudade
Dou mil gemidos a MarĂ­lia ausente:

De seus crimes a mancha inda recente
Lava Amor, e triunfa da verdade;
A beleza, apesar da falsidade,
Me ocupa o coração, me ocupa a mente:

Lembram-me aqueles olhos tentadores,
Aquelas mĂŁos, aquele riso, aquela
Boca suave, que respira amores…

Ah! Trazei-me, ilusÔes, a ingrata, a bela!
Pintai-me vĂłs, oh sonhos, entre as flores
Suspirando outra vez nos braços dela!

És dos CĂ©us o Composto Mais Brilhante

Marília, nos teus olhos buliçosos
Os Amores gentis seu facho acendem;
A teus lĂĄbios, voando, os ares fendem
TernĂ­ssimos desejos sequiosos.

Teus cabelos subtis e luminosos
Mil vistas cegam, mil vontades prendem;
E em arte aos de Minerva se nĂŁo rendem
Teus alvos, curtos dedos melindrosos.

Reside em teus costumes a candura,
Mora a firmeza no teu peito amante,
A razĂŁo com teus risos se mistura.

És dos CĂ©us o composto mais brilhante;
Deram-se as mĂŁos Virtude e Formosura,
Para criar tua alma e teu semblante.

Negra Fera, Que A Tudo As Garras Lanças

Negra fera, que a tudo as garras lanças,
JĂĄ murchaste, insensĂ­vel a clamores,
Nas faces de TirsĂĄlia as rubras flores,
Em meu peito as viçosas esperanças.

Monstro, que nunca em teus estragos cansas,
VĂȘ as trĂȘs Graças, vĂȘ os nus Amores
Como praguejam teus cruéis furores,
Ferindo os rostos, arrancando as tranças!

DomicĂ­lio da noute, horror sagrado,
Onde jaz destruĂ­da a formosura,
Abre-te, då lugar a um desgraçado.

Eis desço, eis cinzas palpo… Ah, Morte dura!
Ah, TirsĂĄlia! Ah, meu bem, rosto adorado!
Torna, torna a fechar-te, Ăł sepultura!