Sonetos sobre PĂ©s de Teixeira de Pascoaes

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Sonetos de pés de Teixeira de Pascoaes. Leia este e outros sonetos de Teixeira de Pascoaes em Poetris.

Sobresalto

Quantas horas passava contemplando
Seu pequenino Vulto. Era um Anjinho
Dentro de nossa casa, abençoando…
Era uma FlĂ´r, um Astro, um Amorzinho.

Um dia, em que ele, ao pé de mim, sósinho
Brincava, estes meus olhos inundando
De graça, de inocencia e de carinho,
De tudo o que Ă© celeste, alegre e brando,

Vi tremer sua Imagem, de repente,
No ar, como se fôra Aparição.
E para mim eu disse tristemente:

“Pertences a outro mundo, a um cĂ©u mais alto;
Partirás dentro em breve.” E desde entĂŁo
Eu fiquei num constante sobresalto!

MĂŁe Dolorosa

Vi-o doente, ouvi os seus gemidos;
Sinto a memoria negra, ao recordá-lo!
A MĂŁe baixava os olhos doloridos
Sobre o Filho. E era a Dôr a contemplá-lo!

Depois, nesses instantes esquecidos,
Ou lhe falava ou punha-se a beijá-lo…
Mas, retomando, subito, os sentidos,
Estremecia toda em grande abalo!

Fugia de ao pé dele suffocada,
A sua escura trança desgrenhada,
Os seus olhos abertos de terror!

E entĂŁo, num desespĂŞro, a MĂŁe chorava,
E, por entre gemidos, sĂł gritava:
AmĂ´r! amĂ´r! amĂ´r! amĂ´r! amĂ´r!

Trágica Recordação

Meu Deus! meu Deus! quando me lembro agora
De o ver brincar, e avisto novamente
Seu pequenino Vulto transcendente,
Mas tĂŁo perfeito e vivo como outrora!

Julgo que ele ainda vive; e que, lá fóra,
Fala em voz alta e brinca alegremente,
E volve os olhos verdes para a gente,
Dois berços de embalar a luz da aurora!

Julgo que ele ainda vive, mas já perto
Da Morte: sombra escura, abysmo aberto…
PesadĂŞlo de treva e nevoeiro!

Ó visão da Creança ao pé da Morte!
E a da MĂŁe, tendo ao lado a negra sorte
A calcular-lhe o golpe traiçoeiro!

Encantamento

Quantas vezes, ficava a olhar, a olhar
A tua dĂ´ce e angelica Figura,
Esquecido, embebido num luar,
Num enlêvo perfeito e graça pura!

E á força de sorrir, de me encantar,
Deante de ti, mimosa Creatura,
Suavemente sentia-me apagar…
E eu era sombra apenas e ternura.

Que inocencia! que aurora! que alegria!
Tua figura de Anjo radiava!
Sob os teus pés a terra florescia,

E até meu proprio espirito cantava!
Nessas horas divinas, quem diria
A sorte que já Deus te destinava!

A MĂŁe e o Filho

Teu sĂŞr tragicamente enternecido,
Em desespero de alma transformado,
Vae através do espaço escurecido
E pousa no seu tumulo sagrado.

E ele acorda, sentindo-o; e, comovido,
Chora ao vĂŞr teu espirito adorado,
Assim tĂŁo sĂł na noite e arrefecido
E todo de ĂŞrmas lagrimas molhado!

E eis que ele diz: “Ă“ MĂŁe, nĂŁo chores mais!
Em vez dos teus suspiros, dos teus ais,
Quero que venha a mim tua alegria!”

E só nas horas em que a Mãe descança,
É que ele inclina a fronte de creança
E dorme ao pé de ti, Virgem Maria!

Minha Alegria

Minha alegria foi no teu caixĂŁo;
Deitou-se ao pé de ti, na sepultura,
A fim de acalentar teu coração
E tornar-te mais branda a terra dura.

Por isso, é para mim consolação
Esta sombria dĂ´r que me tortura!
E ponho-me a cantar na solidĂŁo,
Meu cantico esculpido em noite escura!

Consola-me saber minha alegria
Longe de mim, perto de ti, na fria
Cova a que tu baixaste apoz a morte.

FĂ´ste tu que m’a deste, meu amĂ´r;
Agora, dou-t’a eu: Ă© a minha flĂ´r;
Eu quero que ela soffra a tua sorte.