Sonetos sobre Primavera

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Sonetos de primavera escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Primavera

Ah! quem nos dera que isto, como outrora,
Inda nos comovesse! Ah! quem nos dera
Que inda juntos pudéssemos agora
Ver o desabrochar da primavera!

Saíamos com os pássaros e a aurora.
E, no chão, sobre os troncos cheios de hera,
Sentavas-te sorrindo, de hora em hora:
“Beijemo-nos! amemo-nos! espera!”

E esse corpo de rosa recendia,
E aos meus beijos de fogo palpitava,
Alquebrado de amor e de cansaço.

A alma da terra gorjeava e ria…
Nascia a primavera… E eu te levava,
Primavera de carne, pelo braço!

Há Um Poeta Em Mim Que Deus Me Disse

Há um poeta em mim que Deus me disse…
A Primavera esquece nos barrancos
As grinaldas que trouxe dos arrancos
Da sua efêmera e espectral ledice…

Pelo prado orvalhado a meninice
Faz soar a alegria os seus tamancos…
Pobre de anseios teu ficar nos bancos
Olhando a hora como quem sorrisse…

Florir do dia a capitéis de Luz…
Violinos do silêncio enternecidos…
Tédio onde o só ter tédio nos seduz…

Minha alma beija o quadro que pintou…
Sento-me ao pé dos séculos perdidos
E cismo o seu perfil de inércia e vôo…

À Fragilidade da Vida Humana

Esse baixel nas praias derrotado
Foi nas ondas Narciso presumido;
Esse farol nos céus escurecido
Foi do monte libré, gala do prado.

Esse nácar em cinzas desatado
Foi vistoso pavão de Abril florido;
Esse estio em vesúvios encendido
Foi Zéfiro suave em doce agrado.

Se a nau, o sol, a rosa, a Primavera
Estrago, eclipse, cinza, ardor cruel
Sentem nos auges de um alento vago,

Olha, cego imortal, e considera
Que és rosa, primavera, sol, baixel,
Para ser cinza, eclipse, incêndio, estrago.

O Espírito

Nada a fazer amor, eu sou do bando
Impermanente das aves friorentas;
E nos galhos dos anos desbotando
Já as folhas me ofuscam macilentas;

E vou com as andorinhas. Até quando?
À vida breve não perguntes: cruentas
Rugas me humilham. Não mais em estilo brando
Ave estroina serei em mãos sedentas.

Pensa-me eterna que o eterno gera
Quem na amada o conjura. Além, mais alto,
Em ileso beiral, aí espera:

Andorinha indemne ao sobressalto
Do tempo, núncia de perene primavera.
Confia. Eu sou romântica. Não falto.

O Meu Orgulho

Lembro-me o que fui dantes. Quem me dera
Não me lembrar! Em tardes dolorosas
Lembro-me que fui a Primavera
Que em muros velhos faz nascer as rosas!

As minhas mãos outrora carinhosas
Pairavam como pombas… Quem soubera
Porque tudo passou e foi quimera,
E porque os muros velhos não dão rosas!

O que eu mais amo é que mais me esquece…
E eu sonho: “Quem olvida não merece…”
E já não fico tão abandonada!

Sinto que valho mais, mais pobrezinha:
Que também é orgulho ser sozinha,
E também é nobreza não ter nada!

Até que um Dia…

Meus versos eram rosas, lírios, heras,
borboletas, regatos, cotovias
cantando suas doces melodias,
anjos, sereias, ninfas e quimeras.

Meus versos eram pombas entre as feras
e, na festa das horas e dos dias,
ia dançando penas e alegrias
e o ano tinha quatro primaveras.

E a festa continua… é também festa
o cardo e a urze, o tojo, a murta, a giesta,
a chuva no beiral, o vento Norte,

o gosto a mar, a lágrimas, a sal,
até que um dia a vida, a bem ou mal,
exausta de cantar me empreste à morte.

Romantismo

Quisera repousar desta vida de agora,
e esquecer no silêncio a dor que me lacera…
– não posso ter em mim o ardor da primavera,
– na casa de meu peito uma saudade chora…

E há sempre uma lembrança a recordar de outrora
que me faz sonhador… E há sempre uma quimera,
que ainda vive em minha alma à semelhança da hera
pregada sobre o muro em ruínas que a vigora…

Quisera me afastar do mundo, e a alma selvagem
repousar bem distante à beira de um remanso
entre o beijo do vento e o choro da folhagem…

E esperar sem ninguém o prosseguir da vida…
Depois… chegando a morte, em preito ao meu descanso
deixar a minha cruz na solidão perdida!…

Nada se Pode Comparar Contigo

O ledo passarinho, que gorjeia
D’alma exprimindo a cândida ternura;
O rio transparente, que murmura,
E por entre pedrinhas serpenteia;

O Sol, que o céu diáfano passeia,
A Lua, que lhe deve a formosura,
O sorriso da Aurora, alegre e pura,
A rosa, que entre os Zéfiros ondeia;

A serena, amorosa Primavera,
O doce autor das glórias que consigo,
A Deusa das paixões e de Citera;

Quanto digo, meu bem, quanto não digo,
Tudo em tua presença degenera.
Nada se pode comparar contigo.

5A E 6A Sombras – Cândida E Laura

Como no tanque de um palácio mago,
Dous alvos cisnes na bacia lisa,
Como nas águas que o barqueiro frisa,
Dous nenúfares sobre o azul do lago,

Como nas hastes em balouço vago
Dous lírios roxos que acalenta a brisa,
Como um casal de juritis que pisa
O mesmo ramo no amoroso afago….

Quais dous planetas na cerúlea esfera,
Como os primeiros pâmpanos das vinhas,
Como os renovos nos ramais da hera,

Eu vos vejo passar nas noites minhas,
Crianças que trazeis-me a primavera…
Crianças que lembrais-me as andorinhas! …

XXXI

Longe de ti, se escuto, porventura,
Teu nome, que uma boca indiferente
Entre outros nomes de mulher murmura,
Sobe-me o pranto aos olhos, de repente…

Tal aquele, que, mísero, a tortura
Sofre de amargo exílio, e tristemente
A linguagem natal, maviosa e pura,
Ouve falada por estranha gente…

Porque teu nome é para mim o nome
De uma pátria distante e idolatrada,
Cuja saudade ardente me consome:

E ouvi-lo é ver a eterna primavera
E a eterna luz da terra abençoada,
Onde, entre flores, teu amor me espera.

No Claustro De Celas

Eis quanto resta do idílio acabado,
– Primavera que durou um momento…
Como vão longe as manhãs do convento!
– Do alegre conventinho abandonado…

Tudo acabou… Anêmonas, hidrângeas,
Silindras, – flores tão nossas amigas!
No claustro agora viçam as ortigas,
Rojam-se cobras pelas velhas lájeas.

Sobre a inscrição do teu nome delido!
– Que os meus olhos mal podem soletrar,
Cansados… E o aroma fenecido

Que se evola do teu nome vulgar!
Enobreceu-o a quietação do olvido,
Ó doce, ingênua, inscrição tumular.

Dona Flor

Ela é tão meiga! Em seu olhar medroso
Vago como os crepúsculos do estio,
Treme a ternura, como sobre um rio
Treme a sombra de um bosque silencioso.

Quando, nas alvoradas da alegria,
A sua boca úmida floresce,
Naquele rosto angelical parece
Que é primavera, e que amanhece o dia.

Um rosto de anjo, límpido, radiante…
Mas, ai! sob êsse angélico semblante
Mora e se esconde uma alma de mulher

Que a rir-se esfolha os sonhos de que vivo
– Como atirando ao vento fugitivo
As folhas sem valor de um malmequer…

Paisagens De Inverno I

Ó meu coração, torna para trás.
Onde vais a correr, desatinado?
Meus olhos incendidos que o pecado
Queimou! – o sol! Volvei, noites de paz.

Vergam da neve os olmos dos caminhos.
A cinza arrefeceu sobre o brasido.
Noites da serra, o casebre transido…
Ó meus olhos, cismai como os velhinhos.

Extintas primaveras evocai-as:
– Já vai florir o pomar das maceiras.
Hemos de enfeitar os chapéus de maias.-

Sossegai, esfriai, olhos febris.
-E hemos de ir cantar nas derradeiras
Ladainhas…Doces vozes senis…-

Sonetos

Do som, da luz entre os joviais duetos,
Como uma chusma alada de gaivotas,
Vindos das largas amplidões remotas,
Batem as asas todos os sonetos.

Vão — por estradas, por difíceis rotas,
Quatorze versos — entre dois quartetos
E duas belas e luzidas frotas
Rijas, seguras, de mais dois tercetos.

Com a brunida lâmina da lima,
Vão céus radiosos, horizontes acima,
Pelas paragens límpidas, gentis,

Atravessando o campo das quimeras,
Aberto ao sol das flóreas primaveras,
Todo estrelado de áureos colibris.

Estoicismo

(A Manoel Duarte de Almeida)

Tu que não crês, nem amas, nem esperas,
Espírito de eterna negação,
Teu hálito gelou-me o coração
E destroçou-me da alma as primaveras…

Atravessando regiões austeras,
Cheias de noite e cava escuridão,
Como n’um sonho mau, só oiço um não,
Que eternamente ecoa entre as esferas…

— Porque suspiras, porque te lamentas,
Cobarde coração? Debalde intentas
Opôr á Sorte a queixa do egoísmo…

Deixa aos tímidos, deixa aos sonhadores
A esperança vã, seus vãos fulgores…
Sabe tu encarar sereno o abismo!

Primavera

Passei a Primavera de meus anos
Com maternais desvelos amorosos.
Com meiguices, afagos carinhosos,
Com mimos de solícitos afanos.

Desenfaixado dos primeiros panos,
Pus-me em pé, dei passinhos vagarosos,
Logo corridas, saltos brincalhosos,
Travessuras de meninais enganos.

Nesta idade infantil da Primavera,
Com outros meus iguais brincões folgava.
Ah, quão gostoso, então, o tempo me era!

Inocente brincar só me encantava:
Feliz, se aqui ficando eu conhecera
A força do prazer que desfrutava!

Uma Amiga

Aqueles que eu amei, não sei que vento
Os dispersou no mundo, que os não vejo…
Estendo os bracos e nas trevas beijo
Visões que a noite evoca o sentimento…

Outros me causam mais cruel tormento
Que a saudade dos mortos… que eu invejo…
Passam por mim… mas como que tem pejo
Da minha soledade e abatimento!

Daquela primavera venturosa
Não resta uma flor so, uma so rosa…
Tudo o vento varreu, queimou o gelo!

Tu so foste fiel – tu, como dantes,
Inda volves teus olhos radiantes…
Para ver o meu mal… e escarnece-lo!

Soneto das Metamorfoses

A Edmundo Morais

Carolina, a cansada, fez-se espera
e nunca se entregou ao mar antigo.
Não por temor ao mar, mas ao perigo
de com ela incendiar-se a primavera.

Carolina, a cansada que então era,
despiu, humildemente, as vestes pretas
e incendiou navios e corvetas
já cansada, por fim, de tanta espera.

E cinza fez-se. E teve o corpo implume
escandalosamente penetrado
de imprevistos azuis e claro lume.

Foi quando se lembrou de ser esquife:
abandonou seu corpo incendiado
e adormeceu nas brumas do Recife.

Primavera

Ah! quem nos dera que isso, como outrora,
inda nos comovesse! Ah! quem nos dera
que inda juntos pudéssemos agora
ver o desabrochar da primavera!

Saíamos com os pássaros e a aurora,
e, no chão, sobre os troncos cheios de hera,
sentavas-te sorrindo, de hora em hora:
“Beijemo-nos! amemo-nos! espera!”

E esse corpo de rosa recendia,
e aos meus beijos de fogo palpitava,
alquebrado de amor e de cansaço…

A alma da terra gorjeava e ria…
Nascia a primavera…E eu te levava,
primavera de carne, pelo braço!

À Janela De Garcia De Resende

Janela antiga sobre a rua plana…
Ilumina-a o luar com seu clarão…
Dantes, a descansar de luta insana,
Fui, talvez, flor no poético balcão…

Dantes! Da minha glória altiva e ufana,
Talvez…Quem sabe?…Tonto de ilusão,
Meu rude coração de alentejana
Me palpitasse ao luar nesse balcão…

Mística dona, em outras Primaveras,
Em refulgentes horas de outras eras,
Vi passar o cortejo ao sol doirado…

Bandeiras! Pajens! O pendão real!
E na tua mão, vermelha, triunfal,
Minha divisa: um coração chagado!…