Sonetos de Raimundo Correia

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Sonetos de Raimundo Correia. Conheça este e outros autores famosos em Poetris.

Ofélia

Num recesso da selva Ă­nvia e sombria,
Estrelada de flores, vicejante,
Onde um rio entre seixos, espumante,
Cursando o vale, tĂşrgido, fluĂ­a;

A coma esparsa, lĂ­vido o semblante,
Desvairados os olhos, como fria
Aparição dos túmulos, um dia
Surgiu de Hamlet a lacrimosa amante;

SĂ­mplices flores o seu porte lindo
Ornavam… como um pranto, iam caindo
As folhas de um salgueiro na corrente…

E na corrente ela também tombando,
Foi-se-lhe o corpo alvĂ­ssimo boiando
Por sobre as águas indolentemente.

Luiz Gama

A Raul Pompéia

Tantos triunfos te contando os dias,
Iam-te os dias descontando e os anos,
Quando bramavas, quando combatias
Contra os bárbaros, contra os desumanos;

Quando a alma brava e procelosa abrias
Invergável ao pulso dos tiranos,
E Ă­gnea, como os desertos africanos
Dilacerados pelas ventanias…

Contra o inimigo atroz rompeste em guerra,
Grilhões a rebentar por toda a parte,
Por toda a parte a escancarar masmorras.

Morreste!… Embalde, EscravidĂŁo! Por terra
Rolou… Morreu por nĂŁo poder matar-te!
Também não tarda muito que tu morras!

Fetichismo

Homem, da vida as sombras inclementes
Interrogas em vĂŁo: – Que cĂ©us habita
Deus? Onde essa regiĂŁo de luz bendita,
ParaĂ­so dos justos e dos crentes?…

Em vĂŁo tateiam tuas mĂŁos trementes
As entranhas da noite erma, infinita,
Onde a dĂşvida atroz blasfema e grita,
E onde há sĂł queixas e ranger de dentes…

A essa abĂłbada escura, em vĂŁo elevas
Os braços para o Deus sonhado, e lutas
Por abarcá-lo; Ă© tudo em torno trevas…

Somente o vácuo estreitas em teus braços;
E apenas, pávido, um ruído escutas,
Que Ă© o ruĂ­do dos teus prĂłprios passos!…

Julieta

A loura Julieta enamorada,
Triste, lânguida, pálida, abatida,
Aparece radiante na sacada
Dos raios brancos do luar ferida.

Engolfa o olhar na sombra condensada,
Perscruta, busca em torno… e na avenida
Surge Romeu; da valerosa espada
Esplende a clara lâmina polida…

Sente-se o arfar de sĂ´fregos desejos,
Estoura no ar um turbilhĂŁo de beijos,
Mas o dia reponta!… Ă“ indiscreta

Da cotovia matinal garganta!
Ă“ perigo do amor, que o amor quebranta!
Ă“ noites de Verona! Ă“ Julieta!