Sonetos sobre Seios de Auta de Souza

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Sonetos de seios de Auta de Souza. Leia este e outros sonetos de Auta de Souza em Poetris.

A Minha AvĂł

Minh’alma vai cantar, alma sagrada!
Raio de sol dos meus primeiros dias…
Gota de luz nas regiões sombrias
De minha vida triste e amargurada.

Minh’alma vai cantar, velhinha amada!
Rio onde correm minhas alegrias…
Anjo bendito que me refugias
Nas tuas asas contra a sina irada!

Minh’alma vai cantar… Transforma o seio
N’um cofre santo de carĂ­cias cheio,
Para este livro todo o meu tesouro… –

Eu quero vĂŞ-lo, em desejada calma,
No rico santuário de tu’alma…
– HĂłstia guardada n’um cibĂłrio de ouro! –

Bendita

Bendita sejas, minha mĂŁe, bendito
Seja o teu seio, imaculado e santo,
Onde derrama as gotas de seu pranto
Meu dolorido coração aflito.

Ă“ minha mĂŁe, Ăł anjo sacrossanto,
Bendito seja o teu amor, bendito!
Ouve do CĂ©u o amargurado grito
Cheio da dor de quem soluça tanto.

E deixa que repouse em teus joelhos
A minha fronte, ouvindo os teus conselhos
Longe do mundo, Ăł sempiterna dita!

Envia lá do céu no teu sorriso
A morte que levou-te ao ParaĂ­so…
Bendita sejas, minha mĂŁe, bendita!

Pobre Flor!

Deu-m’a um dia antiga companheira
De tempinho feliz de adolescente;
E os meus lábios roçaram docemente
Pelas folhas da nĂ­vea feiticeira.

Como se apaga uma ilusĂŁo primeira,
Um sonho estremecido e resplendente,
Eu beijei-lhe a corola, rescendente
Inda mais que a da flor da laranjeira.

E como amava o seu formoso brilho!
Tinha-lhe quase essa afeição sagrada
Da jovem mĂŁe ao seu primeiro filho.

Dei-lhe no seio uma pousada franca…
Mas, ai! depressa ela murchou, coitada!
Doce e mĂ­sera flor, cheirosa e branca!

Ă€ Alma De Minha MĂŁe

Partiu-se o fio branco e delicado
Dos sonhos de minh’alma desditosa…
E as contas do rosário assim quebrado
CaĂ­ram como folhas de uma rosa.

Debalde eu as procuro lacrimosa,
Estas doces relĂ­quias do Passado,
Para guardá-las na urna perfumosa,
Do meu seio no cofre imaculado.

AĂ­! se eu ao menos uma sĂł pudesse
D’estas contas achar que me fizesse
Lembrar um mundo de alegrias doidas…

Feliz seria… Mas minh’alma atenta
Em vĂŁo procura uma continha benta:
Quando partiste m’as levaste todas!

Noites Amadas

Ă“ noites claras de lua cheia!
Em vosso seio, noites chorosas,
Minh’alma canta como a sereia,
Vive cantando n’um mar de rosas;

Noites queridas que Deus prateia
Com a luz dos sonhos das nebulosas,
Ă“ noites claras de lua cheia,
Como eu vos amo, noites formosas!

VĂłs sois um rio de luz sagrada
Onde, sonhando, passa embalada
Minha Esperança de mágoas nua…

Ă“ noites claras de lua plena
Que encheis a terra de paz serena,
Como eu vos amo, noites de lua!

Página Triste

Há muita dor por este mundo a fora
Muita lágrima à toa derramada;
Muito pranto de mĂŁe angustiada
Que vem saudar o despontar da aurora!

Alma inocente sĂł de amor cercada
A criancinha a soluçar descora,
Talvez no berço onde o menino chora
Também, oh Dor, tu queiras, desolada,

Erguer um trono, procurar guarida…
Foge do berço! Não magoes a vida
D’esta ave implume, lirial botĂŁo…

Queres um ninho, um carinhoso abrigo?
Pois bem! Procura-o neste seio amigo,
Dentro em minh’alma, aqui no coração!

Clarisse

“NĂŁo sei o que Ă© tristeza,” ela me disse…
E a sua boca virginal sorria:
Ninho de estrelas, concha de ambrosia
Cheia de rosas que do CĂ©u caĂ­sse!

E eu docemente murmurei: Clarisse,
Será possĂ­vel que tu’alma fria
Ouvindo o choro da Melancolia
O ressábio do fel nunca sentisse?

Será possível que o teu seio, rosa,
Nunca embalasse a lágrima formosa?
Ah! nĂŁo Ă©s rosa, pois nĂŁo tens espinho!

E os olhos teus, dois templos de esperança,
Nunca viram sofrer uma criança,
Nunca viram morrer um passarinho!

Noite Cruel

A meu irmĂŁo Henrique

Morrer… morrer… morrer… Fechar na terra os olhos
A tudo o que se ama, a tudo o que se adora;
E nunca mais ouvir a mĂşsica sonora
Da ilusĂŁo a cantar da vida nos refolhos…

Sentir o coração ferir-se nos escolhos
De tormentoso mar, – pobre vaga que chora! –
E no arranco final da derradeira hora,
Soluçando morrer num oceano de abrolhos.

Nem ao menos beijar – Ăł supremo desgosto! –
A mĂŁo doce e fiel que nos enxuga o rosto
Mostrando-nos o CĂ©u suspenso de uma Cruz…

E perguntar a Deus na agonia e nas trevas:
Onde fica, Senhor, a terra a que nos levas,
Com as mĂŁos postas no seio e os dois olhos sem luz?!

Irineu

Num dia turvo assim foi que partiste
Cheio de dor e de tristeza cheio.
Eu fiquei a chorar num doido anseio
Olhando o espaço merencório, triste.

Não sei se mágoa mais profunda existe
Que esta saudade que me oprime o seio,
Pois a amargura que ferir-me veio
Naquele dia, Ăł meu irmĂŁo! persiste.

Os anos que se foram! Entanto, eu cismo
A todo o instante, no profundo abismo
Que veio a morte entre nĂłs dois abrir.

Mas cada noite, n’asa de uma prece,
Ou num raio de sol quando amanhece,
Vejo tu’alma para o cĂ©u subir…

Noemi

Eu quisera saber em que ela pensa,
Esta mimosa e santa criatura
Quando indeciso o seu olhar procura
Alguma estrela pelo Azul suspensa;

E que tristeza, indefinida, imensa,
Do seu olhar na flama, ardente e pura,
Intérmina e suave se condensa
Como as brumas no CĂ©u em noite escura.

Pobre criança! Que infinita mágoa
Punge-te o seio e te anuvia os olhos
– Benditos olhos sempre rasos d’água! –

Choras… E o mundo te oferece flores…
Deixa os espinhos, lágrimas e abrolhos,
Só para mim, que só conheço dores!

Mistério

Ă€ memĂłria do pequeno Alberto.

Sei que tu’alma carinhosa e mansa
Voou, sorrindo, para o Azul celeste;
Sei que teu corpo virginal descansa
Aqui da terra n’um cantinho agreste.

Tudo isto sei: mas tu nĂŁo me disseste
Se lá no Céu, na pátria da Esperança,
Ou aqui no mundo, Ă  sombra do cipreste,
Deixaste o coração, loura criança!

Desceu acaso com o corpo Ă  terra
Ele tĂŁo puro e que sĂł luz encerra?
NĂŁo creio n’isso e ninguĂ©m crĂŞ de certo…

Entanto, eu cismo que, num vale ameno,
Talvez o seio de um jasmim pequeno
Sirva de berço ao coração de Alberto.