Sonetos sobre Sonhos de Manuel Bandeira

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Sonetos de sonhos de Manuel Bandeira. Leia este e outros sonetos de Manuel Bandeira em Poetris.

Soneto Italiano

Frescuras das sereias e do orvalho,
Graça dos brancos pes dos pequeninos,
Voz das anhãs cantando pelos sinos,
Rosa mais alta no mais alto galho:

De quem me valerei, se não me valho
De ti, que tens a chave dos destinos
Em que arderam meus sonhos cristalinos
Feitos cinza que em pranto ao vento espalho?

Também te vi chorar… Também sofreste
A dor de ver secarem pela estrada
As fontes da esperança… E não cedeste!

Antes, pobre, despida e trespassada,
Soubeste dar à vida, em que morreste,
Tudo – à vida, que nunca te deu nada!

Vita Nuova

De onde e veio esse tremor de ninho
A alvorecer na morta madrugada?
Era todo o meu ser… Não era nada,
Senão na pele a sombra de um carinho.

Ah, bem velho carinho! Um desalinho
De dedos tontos no painel da escada…
Batia a minha cor multiplicada,
– Era o sangue de Deus mudado em vinho!

Bandeiras tatalavam no alto mastro
Do meu desejo. No fervor da espera
Clareou à distância o súbito alabastro.

E na memória, em nova primavera,
Revivesceu, candente como um astro,
A flor do sonho, o sonho da quimera.

Sonho Branco

Não pairas mais aqui. Sei que distante
Estás de mim, no grêmio de Maria
Desfrutando a inefável alegria
Da alta contemplação edificante.

Mas foi aqui que ao sol do eterno dia
Tua alma, entre assustada e confiante,
Viu descender à paz purificante
Teu corpo, ainda cansado da agonia.

Senti-te as asas de anjo em mesto arranco
Voejar aqui, retidas pelo aceno
Do irmão, saudoso de teu riso franco.

Quarenta anos lá vão. De teu moreno
Encanto hoje resta? O eco pequeno,
Pequeno de teu sonho – um sonho branco!