Soneto Da Mulher Inútil
De tanta graça e de leveza tanta
Que quando sobre mim, como a teu jeito
Eu tão de leve sinto-te no peito
Que o meu próprio suspiro te levanta.To contra quem me esbato liquefeito
Rocha branca! brancura que me espanta
Brancos seios azuis, nívea garganta
Branco pássaro fiel com que me deito.Mulher inútil, quando nas noturnas
Celebrações, náufrago em teus delírios
Tenho-te toda, branca, envolta em brumasSão teus seios tão tristes como urnas
São teus braços tão finos como lírios
É teu corpo tão leve como plumas.
Sonetos sobre Suspiro
41 resultados1A Sombra – Marieta
Como o gênio da noite, que desata
O véu de , rendas sobre a espádua nua,
Ela solta os cabelos… Bate a lua
Nas alvas dobras de um lençol de prataO seio virginal que a mão recata,
Embalde o prende a mão… cresce, flu
Sonha a moça ao relento… Além na
Preludia um violão na serenata!…… Furtivos passos morrem no lajedo…
Resvala a escada do balcão discreta…
Matam lábios os beijos em segredo…Afoga-me os suspiros, Marieta!
Oh surpresa! oh palor! oh pranto! oh medo!
Ai! noites de Romeu e Julieta…
Pouco te Ama
Na metade do Céu subido ardia
O claro, almo Pastor, quando deixavam
O verde pasto as cabras, e buscavam
A frescura suave da água fria.Com a folha das árvores, sombria,
Do raio ardente as aves se amparavam;
O módulo cantar, de que cessavam,
Só nas roucas cigarras se sentia.Quando Liso Pastor, num campo verde,
Natércia, crua Ninfa, só buscava
Com mil suspiros tristes que derrama.Porque te vás de quem por ti se perde,
Para quem pouco te ama? (suspirava)
E o eco lhe responde: Pouco te ama.
Cogitação
Ah! mas então tudo será baldado?!
Tudo desfeito e tudo consumido?!
No Ergástulo d’ergástulos perdido
Tanto desejo e sonho soluçado?!Tudo se abismará desesperado,
Do desespero do Viver batido,
Na convulsão de um único Gemido
Nas entranhas da Terra concentrado?!nas espirais tremendas dos suspiros
A alma congelará nos grandes giros,
Ratejará e rugirá rolando?!Ou entre estranhas sensações sombrias,
Melancolias e melancolias,
No eixo da alma de Hamlet irá girando?!
O Suspiro
Voai, brandos meninos tentadores,
Filhos de Vénus, deuses da ternura,
Adoçai-me a saudade amarga e dura,
Levai-me este suspiro aos meus amores:Dizei-lhe que nasceu dos dissabores
Que influi nos corações a formosura;
Dizei-lhe que é penhor da fé mais pura,
Porção do mais leal dos amadores:Se o fado para mim sempre mesquinho,
A outro of’rece o bem de que me afasta,
E em ais lhe envia Ulina o seu carinho:Quando um deles soltar na esfera vasta,
Trazei-o a mim, torcendo-lhe o caminho;
Eu sou tão infeliz, que isso me basta.
Soneto XVIII
Quem quiser que seus ais o vento leve,
Quem quiser levantar nas águas torre,
Quem semear nas praias onde morre
E onde jamais ser o trigo teve.Morra por vós, que na constância breve
Sois como folha, que c’o vento corre
Só constante em meu mal, porque me forre
De cuidar que sereis ‘té nisto leve.Suspiros de minha alma a quem vos dei,
Dei-vos suspiros meus ao leve vento?
Que foi de vós ó lágrimas cansadas?Assaz pago fiquei com meu tormento,
Já que outro bem por vós não alcancei,
O bem me fica de vos ter choradas.
Lassidão
Ah, por favor, doçura, doçura, doçura!
Acalma esses arroubos febris, minha bela.
Mesmo em grandes folguedos, a amante só deve
Mostrar o abandono calmo da irmã pura.Sê lânguida, adormece-me com os teus afagos,
Iguais aos teus suspiros e ao olhar que embala.
O abraço do ciúme, o espasmo impaciente
Não valem um só beijo, mesmo quando mente!Mas dizes-me, criança, em teu coração de ouro
A paixão mais selvagem toca o seu clarim!…
Deixa-a trombetear à vontade, a impostora!Chega essa testa à minha, a mão também, assim,
E faz-me juramentos pra amanhã quebrares,
Chorando até ser dia, impetuosa amada!Tradução de Fernando Pinto do Amaral
LIV
Ninfas gentis, eu sou, o que abrasado
Nos incêndios de Amor, pude alguma hora,
Ao som da minha cítara sonora,
Deixar o vosso império acreditado.Se vós, glórias de amor, de amor cuidado,
Ninfas gentis, a quem o mundo adora,
Não ouvis os suspiros, de quem chora,
Ficai-vos; eu me vou; sigo o meu fado.Ficai-vos; e sabei, que o pensamento
Vai tão livre de vós, que da saudade
Não receia abrasar-se no tormento.Sim; que solta dos laços a vontade,
Pelo rio hei de ter do esquecimento
Este, aonde jamais achei piedade.
Que Amor Fez sem Remédio, o Tempo, os Fados?
Depois de tantos dias mal gastados,
Depois de tantas noites mal dormidas,
Depois de tantas lágrimas vertidas,
Tantos suspiros vãos vãmente dados,Como não sois vós já desenganados,
Desejos, que de cousas esquecidas
Quereis remediar mortais feridas,
Que amor fez sem remédio, o tempo, os Fados?Se não tivéreis já longa exp’riência
Das sem-razões de Amor a quem servistes,
Fraqueza fora em vós a resistência.Mas pois por vosso mal seus males vistes,
Que o tempo não curou, nem larga ausência,
Qual bem dele esperais, desejos tristes?
Vou de Suspiros Todo este Ar Enchendo
Vou de suspiros todo est’ ar enchendo,
vou a terra de lágrimas regando,
mais água aos rios, mais às fontes dando,
e com meu fogo em tudo fogo acendo.E quando os olhos meus, senhora, estendo
para onde o Amor e vós m’estais chamando,
as altas serras em qu’ os vou quebrando
da vista me tolher s’ estão doendo.Mas nisto acode Amor, que sempre voa;
eu pelas asas, eu pelo arco o tenho,
té me levar consigo onde desejo.E jurarei, senhora, que vos vejo,
jurarei qu’ essa doce voz me soa.
Nesta imaginação só me sostenho.
Aonde, Amor Cruel, aonde me Guias?
Aonde, amor cruel, aonde me guias?
São estes os teus bosques consagrados
Onde só vejo peitos lacerados,
Corações em extremas agonias?Só respondem as duras penedias
A míseros gemidos em vão dados;
Olhos formosos, rostos delicados
São ministros das tuas tiranias.Já me rasgam o peito em mil pedaços:
Marcia me disparou acerbos tiros,
Lá vai fugindo com velozes passos.Suspende, ó ninfa, os apressados giros,
Deixa cruel, ao menos, que em teus braços
Amintas lance os últimos suspiros.
Da Oração
Doce quietação de quem vos ama,
Em serviços, Senhor, que tanto quanto
Amado sois, tão longe o fim de tanto,
Subindo mais, e mais, mais se derrama:Ardendo por arder em viva chama
De amor do vosso amor, a voz levanto;
Sinto, suspiro, choro, colho, e planto
Ao som doutra suave que me chama.Onde se vai, Senhor, quem vos ofende?
Donde levais, Deus meu, a quem vos segue?
Onde fugir se pode uma de duas?Morto por quem o mata que pretende,
Ou que extremos de amor há que nos negue
Quem culpas nossas chama ofensas suas?
Por Decoro
Quando me esperas, palpitando amores,
E os grossos lábios úmidos me estendes,
E do teu corpo cálido desprendes
Desconhecido olor de estranhas flores;Quando, toda suspiros e fervores,
Nesta prisão de músculos te prendes,
E aos meus beijos de sátiro te rendes,
Furtando as rosas as púrpureas cores;Os olhos teus, inexpressivamente,
Entrefechados, lânguidos, tranquilos,
Olham, meu doce amor, de tal maneira,Que, se olhassem assim, publicamente,
Deveria, perdoa-me, cobri-los
Uma discreta folha de parreira.
Proposição das rimas do poeta
Incultas produções da mocidade
Exponho a vossos olhos, ó leitores:
Vede-as com mágoa, vede-as com piedade,
Que elas buscam piedade, e não louvores:Ponderai da Fortuna a variedade
Nos meus suspiros, lágrimas e amores;
Notai dos males seus a imensidade,
A curta duração de seus favores:E se entre versos mil de sentimento
Encontrardes alguns cuja aparência
Indique festival contentamento,Crede, ó mortais, que foram com violência
Escritos pela mão do Fingimento,
Cantados pela voz da Dependência.
Redenção
I
Vozes do mar, das árvores, do vento!
Quando às vezes, n’um sonho doloroso,
Me embala o vosso canto poderoso,
Eu julgo igual ao meu vosso tormento…Verbo crepuscular e íntimo alento
Das cousas mudas; psalmo misterioso;
Não serás tu, queixume vaporoso,
O suspiro do mundo e o seu lamento?Um espírito habita a imensidade:
Uma ânsia cruel de liberdade
Agita e abala as formas fugitivas.E eu compreendo a vossa língua estranha,
Vozes do mar, da selva, da montanha…
Almas irmãs da minha, almas cativas!II
Não choreis, ventos, árvores e mares,
Coro antigo de vozes rumorosas,
Das vozes primitivas, dolorosas
Como um pranto de larvas tumulares…Da sombra das visões crepusculares
Rompendo, um dia, surgireis radiosas
D’esse sonho e essas ânsias afrontosas,
Que exprimem vossas queixas singulares…Almas no limbo ainda da existência,
Acordareis um dia na Consciência,
E pairando, já puro pensamento,Vereis as Formas, filhas da Ilusão,
Cair desfeitas, como um sonho vão…
E acabará por fim vosso tormento.
Quem aos Olhos Dar-me-á uma Vertente
Quem aos olhos dar-me-á uma vertente
de lágrimas, que manem noite e dia?
Ao menos a alma, enfim, respiraria,
chorando, ora o passado, ora o presente.Quem me dará, longe de toda gente,
suspiros, que me valham na agonia
já longa, que o afã tanto encobria?
Sucedeu-me depois tanto acidente!Quem me dará palavras com que iguale
tanto agravo que amor já me tem feito,
pois que tão pouco o sofrimento vale?Ah! quem ao meio me abra este meu peito,
onde jaz tanto mal, por que se exale
tamanha coita minha e meu despeito?
Amor é um Arder
Amor é um arder que se não sente;
É ferida que dói, e não tem cura;
É febre, que no peito faz secura;
É mal, que as forças tira de repente.É fogo, que consome ocultamente;
É dor, que mortifica a Criatura;
É ânsia, a mais cruel e a mais impura;
É frágoa, que devora o fogo ardente.É um triste penar entre lamentos;
É um não acabar sempre penando;
É um andar metido em mil tormentos.É suspiros lançar de quando em quando;
É quem me causa eternos sentimentos.
É quem me mata e vida me está dando.[Imitando Camões]
Eu Cantarei um Dia da Tristeza
Eu cantarei um dia da tristeza
por uns termos tão ternos e saudosos,
que deixem aos alegres invejosos
de chorarem o mal que lhes não pesa.Abrandarei das penhas a dureza,
exalando suspiros tão queixosos,
que jamais os rochedos cavernosos
os repitam da mesma natureza.Serras, penhascos, troncos, arvoredos,
ave, ponte, montanha, flor, corrente,
comigo hão-de chorar de amor enredos.Mas ah! que adoro uma alma que não sente!
Guarda, Amor, os teus pérfidos segredos,
que eu derramo os meus ais inutilmente.
VI
Brandas ribeiras, quanto estou contente
De ver nos outra vez, se isto é verdade!
Quanto me alegra ouvir a suavidade,
Com que Fílis entoa a voz cadente!Os rebanhos, o gado, o campo, a gente,
Tudo me está causando novidade:
Oh como é certo, que a cruel saudade
Faz tudo, do que foi, mui diferente!Recebei (eu vos peco) um desgraçado,
Que andou té agora por incerto giro
Correndo sempre atrás do seu cuidado:Este pranto, estes ais, com que respiro,
Podendo comover o vosso agrado,
Façam digno de vós o meu suspiro.
Os Versos, que Cantei Importunado
Os versos, que cantei importunado
Da mocidade cega a quem seguia,
Queimei (como vergonha me pedia)
Chorando, por haver tão mal cantado.Se nestes não ficar tão desculpado
Quanto mais alto estilo merecia,
Não me podem negar a melhoria
Da mudança, que diz dum noutro estado.Que vai que sejam bem ou mal aceitos?
Pois não os escrevi para louvores
Humanos, pelo menos perigosos,Senão para plantar em tenros peitos
Desejos de colher divinas flores
À força de suspiros saudosos.