Sonetos sobre TĂ©dio

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Sonetos de tédio escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

O Convertido

Entre os filhos dum século maldito
Tomei também lugar na ímpia mesa,
Onde, sob o folgar, geme a tristeza
Duma Ăąnsia impotente de infinito.

Como os outros, cuspi no altar avito
Um rir feito de fel e de impureza…
Mas um dia abalou-se-me a firmeza,
Deu-me um rebate o coração contrito!

Erma, cheia de tédio e de quebranto,
Rompendo os diques ao represo pranto,
Virou-se para Deus minha alma triste!

Amortalhei na FĂ© o pensamento,
E achei a paz na inĂ©rcia e esquecimento…
SĂł me falta saber se Deus existe!

Como uma Voz de Fonte que Cessasse

Como uma voz de fonte que cessasse
(E uns para os outros nossos vĂŁos olhares
Se admiraram), p’ra alĂ©m dos meus palmares
De sonho, a voz que do meu tédio nasce

Parou… Apareceu jĂĄ sem disfarce
De mĂșsica longĂ­nqua, asas nos ares,
O mistério silente como os mares,
Quando morreu o vento e a calma pasce…

A paisagem longĂ­nqua sĂł existe
Para haver nela um silĂȘncio em descida
P’ra o mistĂ©rio, silĂȘncio a que a hora assiste…

E, perto ou longe, grande lago mudo,
O mundo, o informe mundo onde hĂĄ a vida…
E Deus, a Grande Ogiva ao fim de tudo…

Em Viagem

Pelo caminho estreito, aonde a custo
Se encontra uma sĂł flor, ou ave, ou fonte,
Mas sĂł bruta aridez de ĂĄspero monte
E os soes e a febre do areal adusto,

Pelo caminho estreito entrei sem susto
E sem susto encarei, vendo-os defronte,
Fantasmas que surgiam do horizonte
A acommeter meu coração robusto…

Quem sois vĂłs, peregrinos singulares?
Dor, TĂ©dio, Desenganos e Pesares…
Atraz d’eles a Morte espreita ainda…

Conheço-vos. Meus guias derradeiros
Sereis vĂłs. Silenciosos companheiros,
Bemvindos, pois, e tu, Morte, bemvinda!

Fogo-FĂĄtuo

Cabelos brancos! dai-me, enfim, a calma
A esta tortura de homem e de artista:
Desdém pelo que encerra a minha palma,
E ambição pelo mais que não exista;

Esta febre, que o espĂ­rito me encalma
E logo me enregela; esta conquista
De idéias, ao nascer, morrendo na alma,
De mundos, ao raiar, murchando Ă  vista:

Esta melancolia sem remédio,
Saudade sem razão, louca esperança
Ardendo em choros e findando em tédio;

Esta ansiedade absurda, esta corrida
Para fugir o que o meu sonho alcança,
Para querer o que nĂŁo hĂĄ na vida!

RĂ©quiem Do Sol

Águia triste do Tédio, sol cansado,
Velho guerreiro das batalhas fortes!
Das ilusĂ”es as trĂȘmulas coortes
Buscam a luz do teu clarĂŁo magoado…

A tremenda avalanche do Passado
Que arrebatou tantos milhÔes de mortes
Passa em tropel de trĂĄgicos Mavortes
Sobre o teu coração ensangĂŒentado…

Do alto dominas vastidÔes supremas
Águia do Tédio presa nas algemas
Da Legenda imortal que tudo engelha…

Mas lĂĄ, na Eternidade, de onde habitas,
Vagam finas tristezas infinitas,
Todo o mistério da beleza velha!

Único RemĂ©dio

Como a chama que sobe e que se apaga
Sobem as vidas a espiral de Inferno.
O desespero Ă© como o fogo eterno
Que o campo quieo em convulçÔes alaga…

Tudo Ă© veneno, tudo cardo e praga!
E al almas que tĂȘm sede de falerno
Bebem apenas o licor moderno
Do tédio pessimista que as esmaga.

Mas a Caveira vem se aproximando,
Vem exótica e nua, vem dançando,
No estrambotismo lĂșgubre vem vindo.

E tudo acaba entĂŁo no horror insano –
– Desespero do Inferno e tĂ©dio humano –
Quando, d’esguelha, a Morte surge, rindo…

Ignotus

(A SalomĂŁo SĂĄragga)

Onde te escondes? Eis que em vĂŁo clamamos,
Suspirando e erguendo as mĂŁos em vĂŁo!
Jå a voz enrouquece e o coração
EstĂĄ cansado — e jĂĄ desesperamos…

Por céu, por mar e terras procuramos
O EspĂ­rito que enche a solidĂŁo,
E sĂł a prĂłpria voz na imensidĂŁo
Fatigada nos volve… e nĂŁo te achamos!

CĂ©us e terra, clamai, aonde? aonde? —
Mas o EspĂ­rito antigo sĂł responde,
Em tom de grande tédio e de pesar:

— Não vos queixeis, ó filhos da ansiedade,
Que eu mesmo, desde toda a eternidade,
TambĂ©m me busco a mim… sem me encontrar!