O Convertido
Entre os filhos dum século maldito
Tomei tambĂ©m lugar na Ămpia mesa,
Onde, sob o folgar, geme a tristeza
Duma Ăąnsia impotente de infinito.Como os outros, cuspi no altar avito
Um rir feito de fel e de impureza…
Mas um dia abalou-se-me a firmeza,
Deu-me um rebate o coração contrito!Erma, cheia de tédio e de quebranto,
Rompendo os diques ao represo pranto,
Virou-se para Deus minha alma triste!Amortalhei na FĂ© o pensamento,
E achei a paz na inĂ©rcia e esquecimento…
SĂł me falta saber se Deus existe!
Sonetos sobre TĂ©dio
27 resultadosComo uma Voz de Fonte que Cessasse
Como uma voz de fonte que cessasse
(E uns para os outros nossos vĂŁos olhares
Se admiraram), pâra alĂ©m dos meus palmares
De sonho, a voz que do meu tĂ©dio nasceParou… Apareceu jĂĄ sem disfarce
De mĂșsica longĂnqua, asas nos ares,
O mistério silente como os mares,
Quando morreu o vento e a calma pasce…A paisagem longĂnqua sĂł existe
Para haver nela um silĂȘncio em descida
Pâra o mistĂ©rio, silĂȘncio a que a hora assiste…E, perto ou longe, grande lago mudo,
O mundo, o informe mundo onde hĂĄ a vida…
E Deus, a Grande Ogiva ao fim de tudo…
Em Viagem
Pelo caminho estreito, aonde a custo
Se encontra uma sĂł flor, ou ave, ou fonte,
Mas sĂł bruta aridez de ĂĄspero monte
E os soes e a febre do areal adusto,Pelo caminho estreito entrei sem susto
E sem susto encarei, vendo-os defronte,
Fantasmas que surgiam do horizonte
A acommeter meu coração robusto…Quem sois vĂłs, peregrinos singulares?
Dor, TĂ©dio, Desenganos e Pesares…
Atraz d’eles a Morte espreita ainda…Conheço-vos. Meus guias derradeiros
Sereis vĂłs. Silenciosos companheiros,
Bemvindos, pois, e tu, Morte, bemvinda!
Fogo-FĂĄtuo
Cabelos brancos! dai-me, enfim, a calma
A esta tortura de homem e de artista:
Desdém pelo que encerra a minha palma,
E ambição pelo mais que nĂŁo exista;Esta febre, que o espĂrito me encalma
E logo me enregela; esta conquista
De idéias, ao nascer, morrendo na alma,
De mundos, ao raiar, murchando à vista:Esta melancolia sem remédio,
Saudade sem razão, louca esperança
Ardendo em choros e findando em tédio;Esta ansiedade absurda, esta corrida
Para fugir o que o meu sonho alcança,
Para querer o que nĂŁo hĂĄ na vida!
RĂ©quiem Do Sol
Ăguia triste do TĂ©dio, sol cansado,
Velho guerreiro das batalhas fortes!
Das ilusĂ”es as trĂȘmulas coortes
Buscam a luz do teu clarĂŁo magoado…A tremenda avalanche do Passado
Que arrebatou tantos milhÔes de mortes
Passa em tropel de trĂĄgicos Mavortes
Sobre o teu coração ensangĂŒentado…Do alto dominas vastidĂ”es supremas
Ăguia do TĂ©dio presa nas algemas
Da Legenda imortal que tudo engelha…Mas lĂĄ, na Eternidade, de onde habitas,
Vagam finas tristezas infinitas,
Todo o mistério da beleza velha!
Ănico RemĂ©dio
Como a chama que sobe e que se apaga
Sobem as vidas a espiral de Inferno.
O desespero Ă© como o fogo eterno
Que o campo quieo em convulçÔes alaga…Tudo Ă© veneno, tudo cardo e praga!
E al almas que tĂȘm sede de falerno
Bebem apenas o licor moderno
Do tédio pessimista que as esmaga.Mas a Caveira vem se aproximando,
Vem exótica e nua, vem dançando,
No estrambotismo lĂșgubre vem vindo.E tudo acaba entĂŁo no horror insano –
– Desespero do Inferno e tĂ©dio humano –
Quando, d’esguelha, a Morte surge, rindo…
Ignotus
(A SalomĂŁo SĂĄragga)
Onde te escondes? Eis que em vĂŁo clamamos,
Suspirando e erguendo as mĂŁos em vĂŁo!
Jå a voz enrouquece e o coração
EstĂĄ cansado â e jĂĄ desesperamos…Por cĂ©u, por mar e terras procuramos
O EspĂrito que enche a solidĂŁo,
E sĂł a prĂłpria voz na imensidĂŁo
Fatigada nos volve… e nĂŁo te achamos!CĂ©us e terra, clamai, aonde? aonde? â
Mas o EspĂrito antigo sĂł responde,
Em tom de grande tĂ©dio e de pesar:â NĂŁo vos queixeis, Ăł filhos da ansiedade,
Que eu mesmo, desde toda a eternidade,
TambĂ©m me busco a mim… sem me encontrar!