Tomava Daliana Por Vingança
Tomava Daliana por vingança
da culpa do pastor que tanto amava,
casar com Gil vaqueiro; e em si vingava
o erro alheio e pérfida esquivança.A discrição segura, a confiança,
as rosas que seu rosto debuxava,
o descontentamento lhas secava,
que tudo muda ĂŒa ĂĄspera mudança.Gentil planta disposta em seca terra,
lindo fruito de dura mĂŁo colhido,
lembranças dâoutro amor, e fĂ© perjura,tornaram verde prado em dura serra;
interesse enganoso, amor fingido,
fizeram desditosa a fermosura.
Sonetos sobre Terra de LuĂs de CamĂ”es
27 resultadosQuando Se Vir Com Ăgua O Fogo Arder
Quando se vir com ĂĄgua o fogo arder,
e misturar co dia a noite escura,
e a terra se vir naquela altura
em que se vem os Céus prevalecer;o Amor por razão mandado ser,
e a todos ser igual nossa ventura,
com tal mudança, vossa formosura
então a poderei deixar de ver.Porém não sendo vista esta mudança
no mundo (como claro estĂĄ nĂŁo ver-se),
não se espere de mim deixar de ver-vos.Que basta estar em vós minha esperança,
o ganho de minha alma, e o perder-se,
para nĂŁo deixar nunca de querer-vos.
Que Levas, Cruel Morte?- Um Claro Dia.
Que levas, cruel Morte?- Um claro dia.
â A que horas o tomaste?- Amanhecendo.
â Entendes o que levas?- NĂŁo o entendo.
â Pois quem to faz levar?- Quem o entendia.Seu corpo quem o goza?- A terra fria.
â Como ficou sua luz?- Anoitecendo.
â LusitĂąnia que diz?- Fica dizendo:
Enfim, nĂŁo mereci Dona Maria.Mataste quem a viu?- JĂĄ morto estava.
â Que diz o cru Amor?- Falar nĂŁo ousa.
â E quem o faz calar?- Minha vontade.Na corte que ficou?- Saudade brava.
â Que fica lĂĄ que ver?- NenhĂŒa cousa;
mas fica que chorar sua beldade.
A VĂłs Seu Resplendor Deu Sol e Lua
Pelos raros extremos que mostrou
Em såbia Palas, Vénus em formosa,
Diana em casta, Juno em animosa,
Ăfrica, Europa e Ăsia as adorou.Aquele saber grande que juntou
EspĂrito e corpo em liga generosa,
Esta mundana mĂĄquina lustrosa
De sĂł quatro elementos fabricou.Mas fez maior milagre a natureza
Em vĂłs, Senhoras, pondo em cada uma
O que por todas quatro repartiu.A vĂłs seu resplendor deu Sol e Lua:
A vós com viva luz, graça e pureza,
Ar, Fogo, Terra e Ăgua vos serviu.
Quem Jaz no GrĂŁo Sepulcro
Quem jaz no grĂŁo sepulcro, que descreve
TĂŁo ilustres sinais no forte escudo?
Ninguém, que nisso, enfim, se torna tudo;
Mas foi quem tudo pĂŽde e quem tudo teve.Foi Rei? Fez tudo quanto a Rei deve:
PĂŽs na guerra e na paz devido estudo.
Mas quĂŁo pesado foi ao Mouro rudo,
Tanto lhe seja agora a terra leve.Alexandre serå? Ninguém se engane:
Mais que o adquirir, o sustentar estima.
SerĂĄ Adriano grĂŁo senhor do mundo?Mais observante foi da Lei de cima.
Ă Numa? Numa nĂŁo, mas Ă© Joane
De Portugal Terceiro sem Segundo.
Doces Ăguas E Claras Do Mondego
Doces ĂĄguas e claras do Mondego,
doce repouso de minha lembrança,
onde a comprida e pérfida esperança
longo tempo após si me trouxe cego;de vós me aparto; mas, porém, não nego
que inda a memória longa, que me alcança,
me não deixa de vós fazer mudança,
mas quanto mais me alongo, mais me achego.Bem pudera Fortuna este instrumento
dâalma levar por terra nova e estranha,
oferecido ao mar remoto e vento;mas alma, que de cĂĄ vos acompanha,
nas asas do ligeiro pensamento,
para vĂłs, ĂĄguas, voa, e em vĂłs se banha.
O CapitĂŁo Ilustre, e Assinalado, Dom Fernando de Castro
Debaixo desta pedra estĂĄ metido,
Das sanguinosas armas descansado,
O CapitĂŁo ilustre, e assinalado,
Dom Fernando de Castro, e esclarecido.Este por todo o Oriente tĂŁo metido,
Este da prĂłpria inveja tĂŁo cantado,
Este, enfim, raio de Mavorte irado,
Aqui estĂĄ agora em terra convertido.Alegra-te, Ăł guerreira LusitĂąnia,
Por estâoutro Viriato que criaste,
E chora a perda sua eternamente.Exemplo toma nisto de DardĂąnia;
Que se a Roma com ele aniquilaste,
Nem por isso Cartago estĂĄ contente.