Sonetos sobre Tormento de Abade de Jazente

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Um Rafeiro Fiel de um Pastor Triste

Tó, Mondego, vem cá; pois tu somente
Alivias um pouco o meu cuidado;
Que em parte se consola um desgraçado,
Quando tem quem lhe escute o mal que sente.

Tu firme; tu leal; tu finalmente
Me tens na minha ausĂŞncia acompanhado:
Raro impulso de amor! Porque ao seu lado
Ninguém quer suportar um descontente.

Ora deixa, que em prémio da piedade,
Com que o teu zelo ao meu tormento assiste,
Farei teu nome emblema da amizade.

E os versos meus que um tempo alegre ouviste
CantarĂŁo, para exemplo da lealdade,
Um Rafeiro fiel de um Pastor triste.

Sem Causa a Infância Ri

Sem causa a Infância ri, sem causa chora:
Incauta se despenha a mocidade;
Sacode o jugo, e nela a liberdade,
A caça, o jogo, o amor, tudo a namora.

Das honras o varĂŁo se condecora;
Tudo Ă© nele ilusĂŁo, tudo vaidade:
Junta Tesouros a avarenta idade;
Diz mal do nosso, e ao tempo andado adora.

Tormento Ă© toda a vida, Ă© toda enganos:
Quando uns afectos vence a novos corre,
E tarde reconhece os prĂłprios danos:

Porque enfim se a prudĂŞncia nos socorre,
Ditada na lição dos longos anos,
Quando se sabe, entĂŁo Ă© que se morre.

Amor Ă© um Arder

Amor Ă© um arder que se nĂŁo sente;
É ferida que dói, e não tem cura;
É febre, que no peito faz secura;
É mal, que as forças tira de repente.

É fogo, que consome ocultamente;
É dor, que mortifica a Criatura;
É ânsia, a mais cruel e a mais impura;
É frágoa, que devora o fogo ardente.

É um triste penar entre lamentos;
É um não acabar sempre penando;
É um andar metido em mil tormentos.

É suspiros lançar de quando em quando;
É quem me causa eternos sentimentos.
É quem me mata e vida me está dando.

[Imitando Camões]