A Imensa Imoralidade da ExistĂȘncia
Viver era como correr em cĂrculo num grande labirinto, esse gĂ©nero de labirinto para crianças que se vĂȘ em certos parques de jogos modernos; em cima de uma pedra no meio do labirinto hĂĄ uma pedra brilhante; os mĂudos chegam com as faces coradas, cheios de uma fĂ© inabalĂĄvel na honestidade do labirinto e começam a correr com a certeza de alcançarem dentro de pouco tempo o seu alvo. Corremos, corremos, e a vida passa, mas continuaremos a correr na convicção de que o mundo acabarĂĄ por se mostrar generoso para quem correr sem desĂŁnimo, e quando por fim descobrimos que o labirinto sĂł aparentemente tende para o ponto central, Ă© tarde demais â de facto, o construtor do labirinto esmerou-se a desenhar vĂĄrias pistas diferentes, das quais sĂł uma conduz Ă pĂ©rola, de modo que Ă© o acaso cego e nĂŁo a justiça lĂșcida o que determina a sorte dos que correm.
Descobrimos que gastĂĄmos todas as nossas forças a realizar um trabalho perfeitamente inĂștil, mas Ă© muito tarde jĂĄ para recuarmos. Por isso nĂŁo Ă© de espantar que os mais lĂșcidos saiam da pista e suprimam algumas voltas inĂșteis para atingirem o centro cortando caminho. Se dissermos que se trata de uma acção imoral e maldosa,
Textos sobre Acaso de Stig Dagerman
2 resultadosO Acaso Introduz e Acaba as Nossas AcçÔes
Ă de um sadismo soberbo pensar que deverĂamos ser julgados pelas nossas boas e mĂĄs acçÔes, uma vez que sĂł de um pequenĂssimo nĂșmero das nossas acçÔes podemos decidir. O acaso cego, que se distingue da justiça cega pelo simples facto de ainda nĂŁo usar venda, introduz e acaba as nossas acçÔes; o que podemos fazer e, bem entendido, o que devemos fazer, em virtude da existĂȘncia tantas vezes negada da nossa consciĂȘncia, Ă© deixarmo-nos arrastar numa certa direcção e mantermo-nos depois nessa direcção enquanto conservamos os olhos abertos e estamos conscientes de que o fim em geral Ă© uma ilusĂŁo, pelo que o fundamental Ă© a direcção que mantivermos, pois sĂł ela se encontra sob o nosso controlo, sob o controlo do nosso miserĂĄvel eu. E a lucidez, sim, a lucidez, os olhos abertos fitando sem medo a nossa terrĂvel situação devem ser a estrela do eu, a nossa Ășnica bĂșssola, uma bĂșssola que cria a direcção, porque sem bĂșssola nĂŁo hĂĄ direcção. Mas se me disponho agora a acreditar na direcção, passo a duvidar dos testemunhos relativos Ă maldade humana, uma vez que no interior de uma mesma direcção â em si mesma excelente â podem existir correntes boas e mĂĄs.