A ExistĂȘncia Baseada Em JustificaçÔes
NinguĂ©m aqui gera mais do que a sua possibilidade espiritual de viver; pouco importa que dĂȘ a aparĂȘncia de trabalhar para se alimentar, para se vestir, etc.; com cada bocada visĂvel uma invisĂvel lhe Ă© estendida, com cada vestimenta visĂvel uma invisĂvel vestimenta. EstĂĄ nisso a justificação de cada homem. Parece fundamentar a sua existĂȘncia com justificaçÔes ulteriores, mas essa Ă© apenas a imagem invertida que oferece o espelho da psicologia, de facto erege a sua vida sobre as suas justificaçÔes. Ă verdade que cada homem deve poder justificar a sua vida (ou a sua morte, o que vem dar no mesmo), nĂŁo pode furtar-se a essa tarefa.
Textos sobre AparĂȘncia de Franz Kafka
5 resultadosA Motivação do Ser Humano
Desde o pecado original fomos essencialmente iguais para conhecer o bem e o mal; no entanto, Ă© exactamente neste ponto que buscamos as nossas vantagens particulares. Mas Ă© sĂł alĂ©m desse conhecimento que começam as verdadeiras diferenças. A aparĂȘncia recĂproca Ă© provocada pelo seguinte: ninguĂ©m consegue contentar-se apenas com o conhecimento, mas tem de lutar para agir de acordo com ele. Contudo, nĂŁo lhe foi atribuĂda a força para fazer isso; em consequĂȘncia, ele tem de se destruir, mesmo correndo o risco de nĂŁo adquirir com isso o poder necessĂĄrio, mas nĂŁo lhe resta nada senĂŁo essa Ășltima tentativa. (Ă este tambĂ©m o sentido da ameaça de morte associada Ă proibição de comer da ĂĄrvore do conhecimento; talvez tambĂ©m o sentido original da morte natural). Ora, ele tem uma tentativa; prefere revogar o conhecimento do bem e do mal; (a expressĂŁo «pecado original» tem origem nesse medo) mas o que aconteceu nĂŁo pode ser suprimido, apenas turvado. Ă com esse objectivo que as motivaçÔes vĂȘm Ă tona; com efeito, todo o mundo visĂvel talvez nĂŁo seja outra coisa senĂŁo uma motivação do ser humano para a sua vontade de descansar um momento. Uma tentativa de falsear o facto do conhecimento,
A ExigĂȘncia Prejudicial
NinguĂ©m pode exigir o que no fundo lhe Ă© prejudicial. Se tal Ă© na verdade a aparĂȘncia pelo menos do homem tomado isoladamente – e Ă© talvez essa a aparĂȘncia que oferece sempre -, isso explica-se por alguĂ©m no homem procurar qualquer coisa que, sem dĂșvida, Ă© Ăștil a alguĂ©m, mas que lesa gravemente um segundo alguĂ©m, mais ou menos chamado a julgar do caso. Se o homem se tivesse colocado desde o princĂpio e nĂŁo somente desde o julgamento ao lado do segundo alguĂ©m, o primeiro alguĂ©m ter-se-ia extinguido e com ele a exigĂȘncia.
Tudo Ă© Engano
Tudo Ă© engano: buscar o mĂnimo de ilusĂŁo, permanecer no nĂvel usual, ou buscar o mĂĄximo. No primeiro caso, engana-se o bem, na medida em que se deseja tornar fĂĄcil demais a sua conquista; e o mal, na medida em que Ă© colocado em condiçÔes de luta excessivamente desfavorĂĄveis. No segundo caso, o bem Ă© enganado na medida em que nĂŁo se luta para alcançå-lo, nem mesmo naquilo que Ă© terreno. No terceiro caso, engana-se o bem na medida em que a esperança Ă© tornĂĄ-lo impotente na sua mĂĄxima intensidade. Seria preferĂvel, nisto tudo, o segundo caso, pois ainda assim engana-se o bem e nĂŁo o mal; neste caso, pelo menos em aparĂȘncia.
O Horror da SolidĂŁo
Antes de adormecer.
Parece tĂŁo horrĂvel ser solteiro, envelhecer lutando por manter a dignidade enquanto se pede um convite sempre que se deseja passar o serĂŁo em companhia, tendo de levar a refeição para casa, incapaz de esperar alguĂ©m com um sentimento de lassidĂŁo e de calma confiança, apenas capaz de, com dificuldade e vexame, dar um presente a alguĂ©m, tendo de dizer boa noite Ă porta de casa, nunca podendo subir as escadas a correr ao lado da mulher, nĂŁo tendo outra consolação quando estiver doente que a vista da janela, se se puder sentar na cama, tendo somente portas ao lado que dĂŁo para salas de estar de outras pessoas, sentindo-se afastado da prĂłpria famĂlia, com quem sĂł pelo casamento se pode manter laços de intimidade, primeiro pelo casamento dos pais, depois, passado o efeito deste casamento, pelo prĂłprio, tendo de admirar os filhos dos outros e nĂŁo lhe sendo sequer permitido continuar a dizer: «Eu nĂŁo tenho nenhum», nunca se sentindo envelhecer uma vez que nĂŁo hĂĄ gente da famĂlia a crescer Ă volta, formando-se na aparĂȘncia e no comportamento segundo os modelos de uma ou duas pessoas solteiras que conheceu na juventude. Tudo isto Ă© verdade,