Querer Ă© Poder
Querer alguĂ©m, ou alguma coisa, Ă© muito fácil. Mesmo assim, olhar e sentirmo-nos querer, sem pensar no que estamos a fazer, Ă© uma coisa mais bonita do que se diz. Antes de vermos a pessoa, ou a coisa, nĂŁo sabĂamos que estávamos tĂŁo insatisfeitos. Porque nĂŁo estávamos. Mas, de repente, vemo-la e assalta-nos a falta enorme que ela nos faz. Para nĂŁo falar naquela que nos fez e para sempre há-de fazer. Como foi possĂvel viver sem ela? Foi uma obscenidade. Querer Ă© descobrir faltas secretas, ou inventá-las na magia do momento. NĂŁo há surpresa maior.
O que é bonito no querer é sentirmo-nos subitamente incompletos sem a coisa que queremos. Quanto mais bela ela nos parece, mais feios nos sentimos. Parte da força da nossa vontade vem da força com que se sente que ela nunca poderia querer-nos como nós a queremos. Querer é sempre a humilhação sublime de quem quer. Por que razão não nos sentimos inteiros quando queremos? É porque a outra pessoa, sem querer, levou a parte melhor que havia em nós, aquela que nos faz mais falta. E a parte de nós que olha por nós e que nos reconcilia connosco. Quanto mais queremos outra pessoa,
Textos sobre Belos de Miguel Esteves Cardoso
2 resultadosO Amor PortuguĂŞs nĂŁo Ă© um FenĂłmeno Ternurento
Do carinho e do mimo, toda a gente sabe tudo o que há a saber — e mais um bocado. Do amor, ninguĂ©m sabe nada. Ou pensa-se que se sabe, o que Ă© um bocado menos do que nada. O mais que se pode fazer Ă© procurar saber quem se ama, sem querer saber que coisa Ă© o amor que se tem, ou de que sĂtio vem o amor que se faz.
Do amor Ă© bom falar, pelo menos naqueles intervalos em que nĂŁo Ă© tĂŁo bom amar. Todos os paĂses hĂŁo-de ter a sua prĂłpria cultura amorosa. A portuguesa Ă© excepcional. Nas culturas mais parecidas com a nossa, Ă© muito maior a diferença que se faz entre o amor e a paixĂŁo. Faz-se de conta que o amor Ă© uma coisa — mais tranquila e pura e duradoura — e a paixĂŁo Ă© outra — mais doĂda e complicada e efĂ©mera. Em Portugal, porĂ©m, nĂŁo gostamos de dizer que nos «enamoramos», e o «enamoramento» e outras palavras que contenham a palavra «amor» sĂŁo-nos sempre um pouco estranhas. Quando nĂłs nos perdemos de amores por alguĂ©m, dizemos (e nitidamente sentimos) que nos apaixonamos. Aqui, sabe-se lá por que atavismos atlânticos,