Textos sobre Cachorros de Clarice Lispector

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Textos de cachorros de Clarice Lispector. Leia este e outros textos de Clarice Lispector em Poetris.

Vou Voltar para Mim Mesma

Minha vida Ă© um grande desastre. É um desencontro cruel, Ă© uma casa vazia. Mas tem um cachorro dentro latindo. E eu — sĂł me resta latir para Deus. Vou voltar para mim mesma. É lĂĄ que eu encontro uma menina morta sem pecĂșlio. Mas uma noite vou Ă  Secção de Cadastro e ponho fogo em tudo e nas identidades das pessoas sem pecĂșlio. E sĂł entĂŁo fico tĂŁo autĂłnoma que sĂł pararei de escrever depois de morrer. Mas Ă© inĂștil, o lago azul da eternidade nĂŁo pega fogo. Eu Ă© que me incineraria atĂ© meus ossos. Virarei nĂșmero e pĂł. Que assim seja. AmĂ©n. Mas protesto. Protesto Ă  toa como um cĂŁo na eternidade da Seção de Cadastro.

Nunca Aprendi a Viver

De repente eu me vi e vi o mundo. E entendi: o mundo Ă© sempre dos outros. Nunca meu. Sou o pĂĄria dos ricos. Os pobres de alma nada armazenam. A vertigem que se tem quando num sĂșbito relĂąmpago-trovoada se vĂȘ o clarĂŁo do nĂŁo entender. EU NÃO ENTENDO! Por medo da loucura, renunciei Ă  verdade. Minhas idĂ©ias sĂŁo inventadas. Eu nĂŁo me responsabilizo por elas. O mais engraçado Ă© que nunca aprendi a viver. Eu nĂŁo sei nada. SĂł sei ir vivendo. Como o meu cachorro. Eu tenho medo do Ăłtimo e do superlativo. Quando começa a ficar muito bom eu ou desconfio ou dou um passo para trĂĄs. Se eu desse um passo para a frente eu seria enfocada pelo amarelado de esplendor que quase cega.