O Grito
Corria pela rua acima quando a sĂşbita explosĂŁo dum grito o fez parar instantaneamente. Todo o seu corpo estremeceu. O que ele desde sempre receara acabara de ocorrer: algures, nesse momento, uma caneta começara a deslizar sobre uma folha de papel, dando assim corpo Ă quele grito que de há muito, como as esculturas no interior da pedra, se mantinha na expectativa desse simples gesto dum escritor para atingir a realidade. Tapou os ouvidos com as mĂŁos. O grito mais nĂŁo era que um sinal, mas o que esse sinal lhe transmitia deixava-o aterrado. Acabara de ser posta a funcionar uma engrenagem que a partir de agora nada nem ninguĂ©m, e muito menos ele, iria alguma vez poder travar, um mecanismo de que ele prĂłprio iria inapelavelmente ser a maior vĂtima. Mais tarde ou mais cedo isso teria de se dar, mas agora que, sem qualquer aviso prĂ©vio, se soubera propulsado para outra dimensĂŁo da sua vida, como se os fios que a governavam tivessem repentinamente mudado de mĂŁos, o facto de há longo tempo o pressentir nĂŁo o impediu de olhar Ă sua volta com estranheza, uma estranheza que antes de mais nascia de tudo Ă primeira vista ter ficado como estava,
Textos sobre Caminhos de LuĂs Miguel Nava
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