A Ambição Superada
Certo dia uma rica senhora viu, num antiquário, uma cadeira que era uma beleza. Negra, feita de mogno e cedro, custava uma fortuna. Era, porĂ©m, tĂŁo bela, que a mulher nĂŁo titubeou – entrou, pagou, levou para casa.
A cadeira era tão bonita que os outros móveis, antes tão lindos, começaram a parecer insuportáveis à simpática senhora. (Era simpática).
Ela entĂŁo resolveu vender todos os mĂłveis e comprar outros que pudessem se equiparar Ă maravilhosa cadeira. E vendeu-os e comprou outros.
Mas, entĂŁo a casa que antes parecia tĂŁo bonita, ficou tĂŁo bem mobilada que se estabeleceu uma desarmonia flagrante entre casa e mĂłveis. E a senhora começou a achar a casa horrĂvel.
E vendeu a casa e comprou uma outra maravilhosa.
Mas dentro daquela casa magnĂfica, mobilada de maneira esplendorosa, a mulher começou, pouco a pouco, a achar seu marido mesquinho. E trocou de marido.
Mas mesmo assim nĂŁo conseguia ser feliz. Pois naquela casa magnĂfica, com aqueles mĂłveis admiráveis e aquele marido fabuloso, todo mundo começou a achá-la extremamente vulgar.
Textos sobre Casas de MillĂ´r Fernandes
2 resultadosO JuĂzo Final
Chegou o miserável milionário no céu e, impacientemente, esperou a sua vez de ser julgado. Introduziram-no numa sala, noutra sala, noutra sala, até que se viu frente a uma luz ofuscante, na qual pouco a pouco foi dintinguindo a figura santa do pai dos Homens. Em voz tonitroante este, tendo à direita, Pedro, e, à esquerda, uma figura que ele não conhecia, julgou sumariamente dois outros pecadores que estavam à sua frente. E, afinal, dirigiu-se a ele:
– Que fez vocĂŞ de bom na sua vida ?
– Bem, eu nasci, cresci, amei, casei, tive filhos, vivi.
– Ora – disse o Senhor – isso sĂŁo actos sociais e biolĂłgicos a que vocĂŞ estava destinado. Quero saber que bondade especĂfica e determinada vocĂŞ teve para com o seu semelhante.
– Bem – disse o milionário – eu criei indĂşstrias, comprei fazendas, dei emprego a muita gente, melhorei as condições sociais de muita gente.
– NĂŁo, isso nĂŁo serve – disse o Todo-Poderoso – essas acções estavam implĂcitas ao acto de vocĂŞ enriquecer. VocĂŞ as praticou porque precisava viver melhor. NĂŁo foram intrinsecamente boas acções, desprendidas, nĂŁo servem.
O milionário escarafunchou o cérebro e não encontrou nada.