Humanismo e Liberalismo
O termo humanismo é infelizmente uma palavra que serve para designar as correntes filosóficas, não somente em dois sentidos, mas em três, quatro, cinco ou seis. Toda a gente é humanista na hora que passa, até mesmo certos marxistas que se descobrem racionalistas clássicos, são humanistas num enfadonho sentido, derivado das ideias liberais do último século, o dum liberalismo refractado através de toda a crise actual. Se os marxistas podem pretender ser humanistas, as diferentes religiões, os cristãos, os hindus, e muitos outros afirmam-se também antes de mais humanistas, como por sua vez o existencialista, e de um modo geral, todas as filosofias. Actualmente muitas correntes políticas se reivindicam igualmente um humanismo. Tudo isso converge para uma espécie de tentativa de restabelecimento duma filosofia que, apesar da sua pretensão, recusa no fundo comprometer-se, e recusa comprometer-se, não somente no ponto de vista político e social, mas também num sentido filosófico profundo.
Se o cristianismo se pretende antes de tudo humanista, é porque ele não pode comprometer-se, quer dizer participar na luta das forças progressivas, porque se mantém em posições reaccionárias frente a esta revolução. Quando os pseudomarxistas ou os liberais se reclamam da pessoa antes do mais, é porque eles recuam diante das exigências da situação presente no mundo.
Textos sobre Cinco de Vergílio Ferreira
3 resultadosPergunta e Interrogação
Uma pergunta não interroga: uma pergunta diz a resposta. Porque uma pergunta está do lado do problema a resolver, do ainda simplesmente desconhecido; e a interrogação está do lado do insondável. A pergunta desenvolve-se na clara horizontalidade; a interrogação, na obscura verticalidade.
Como em jogo de cabra-cega, em que há seres à nossa volta, a pergunta orienta-se entre os que lhe não pertencem até achar o que procura. Mas a interrogação não encontra, porque nada há para achar. O limite da sua esperança está menos no triunfo de um encontro, do que no cansaço, na resignação, ou na evidência natural do que nos coube, como nos é evidente e tranquilo o termos cinco sentidos e não mais. Mas até lá o caminho é longo e inimaginável na imobilidade desta noite. Verdadeiramente é única a sorte que nos visitou. Legaram-nos a tradição da pergunta-e-resposta como o passatempo de um jogo. Porque até mesmo o interrogar degenerou depressa em pergunta.
Morre-se Agora Muito Tarde
Pensando bem, vale mais morrer já, morre-se agora muito tarde. Quero dizer, muito depois de ter morrido muita coisa à nossa volta e dentro de nós. A vida humana estendeu-se e o que havia nela encolheu. A vida humana é assim vagarosa, «objectivamente» vagarosa, mas o que acontece dentro dela é rapidíssimo (…) Porque aos vinte e cinco anos, digamos aos trinta, temos o farnel pronto para a viagem. Antigamente dava para a viagem toda, agora temos de nos abastecer outra vez – com quê?
Temos a bagagem pronta, o amor, as ideias, o corte das camisas e do cabelo, tudo na mala – como aguentar até aos setenta sem mudar de mala nem de camisas? Mesmo que as camisas sejam novas. Imagina agora tu a usares o coco do teu avô.