Aprender a Ler
Tive muita dificuldade em aprender a ler. NĂŁo me parecia lĂłgico que a letra «m» se chamasse «éme» e, no entanto, com a vogal seguinte nĂŁo se dissesse «éme» e sim «ma». Era-me impossĂvel ler assim. Por fim, quando cheguei ao Montessori, a professora nĂŁo me ensinou os nomes mas sim os sons das consoantes. Assim pude ler o primeiro livro que encontrei numa arca poeirenta da arrecadação da casa. Estava descosido e incompleto, mas absorveu-me de uma forma tĂŁo intensa que o namorado da Sara, ao passar, deixou cair uma premonição aterradora: «Caramba!, este menino vai ser escritor».
Dito por ele, que vivia de escrever, causou-me uma grande impressĂŁo. Passaram vários anos antes de saber que o livro era «As Mil e Uma Noites». O conto de que mais gostei – um dos mais curtos e o mais simples que li — continuou a parecer-me o melhor para o resto da minha vida, embora agora nĂŁo esteja seguro de que fosse lá que o li nem ninguĂ©m me tenha podido esclarecer. O conto Ă© este: um pescador prometeu a uma vizinha oferecer-lhe o primeiro peixe que pescasse se ela lhe emprestasse um chumbo para a sua rede e,
Textos sobre Contos de Gabriel GarcĂa Márquez
2 resultadosConseguir Escrever
O ofĂcio de escritor Ă© talvez o Ăşnico que se torna mais difĂcil Ă medida que mais se pratica. A facilidade com que me sentei a escrever aquele conto nĂŁo se pode comparar com o trabalho que me dá agora escrever uma página. Quanto ao meu mĂ©todo de trabalho, Ă© bastante coerente com isto que vos estou a dizer. Nunca sei quanto vou poder escrever nem o que vou escrever. Espero que me ocorra alguma coisa e, quando me ocorre uma ideia que ache boa para a escrever, ponho-me a dar-lhe voltas na cabeça e deixo-a ir amadurecendo. Quando a tenho terminada (e Ă s vezes passam muitos anos, como no caso de Cem Anos de SolidĂŁo, que passei dezanove anos a pensar), quando a tenho terminada, repito, entĂŁo sento-me a escrevĂŞ-la e Ă© aĂ que começa a parte mais difĂcil e a que mais me aborrece. Porque o mais delicioso da histĂłria Ă© concebĂŞ-la, ir arredondando-a, dando-lhe voltas e mais voltas, de maneira que na altura de nos sentarmos a escrevĂŞ-la já nĂŁo nos interessa muito, ou pelo menos a mim nĂŁo me interessa muito; a ideia que dá voltas.