A Inutilidade do Viajar
Que utilidade pode ter, para quem quer que seja, o simples facto de viajar? NĂŁo Ă© isso que modera os prazeres, que refreia os desejos, que reprime a ira, que quebra os excessos das paixões erĂłticas, que, em suma, arranca os males que povoam a alma. NĂŁo faculta o discernimento nem dissipa o erro, apenas detĂ©m a atenção momentaneamente pelo atractivo da novidade, como a uma criança que pasma perante algo que nunca viu! AlĂ©m disso, o contĂnuo movimento de um lado para o outro acentua a instabilidade (já de si considerável!) do espĂrito, tornando-o ainda mais inconstante e incapaz de se fixar. Os viajantes abandonam ainda com mais vontade os lugares que tanto desejavam visitar; atravessam-nos voando como aves, vĂŁo-se ainda mais depressa do que vieram. Viajar dá-nos a conhecer novas gentes, mostra-nos formações montanhosas desconhecidas, planĂcies habitualmente nĂŁo visitadas, ou vales irrigados por nascentes inesgotáveis; proporciona-nos a observação de algum rio de caracterĂsticas invulgares, como o Nilo extravasando com as cheias de VerĂŁo, o Tigre, que desaparece Ă nossa vista e faz debaixo de terra parte do seu curso, retomando mais longe o seu abundante caudal, ou ainda o Meandro, tema favorito das lucubrações dos poetas, contorcendo-se em incontáveis sinuosidades,
Textos sobre Desconhecidos de SĂ©neca
3 resultadosO Valor do Tempo
Fico sempre surpreendido quando vejo algumas pessoas a exigir o tempo dos outros e a conseguir uma resposta tĂŁo servil. Ambos os lados tĂŞm em vista a razĂŁo pela qual o tempo Ă© solicitado e nenhum encara o tempo em si – como se nada estivesse a ser pedido e nada a ser dado. EstĂŁo a esbanjar o mais precioso bem da vida, sendo enganados por ser uma coisa intangĂvel, nĂŁo aberta Ă inspecção, e, portanto, considerada muito barata – de facto, quase sem qualquer valor. As pessoas ficam encantadas por aceitar pensões e favores, pelos quais empenham o seu labor, apoio ou serviços. Mas ninguĂ©m percebe o valor do tempo; os homens usam-no descontraidamente como se nada custasse.
Mas se a morte ameaça estas mesmas pessoas, vê-las-ás a recorrer aos seus médicos; se estiverem com medo do castigo capital, vê-las-ás preparadas para gastarem tudo o que têm para se manterem vivas. Tão inconsistentes são nos seus sentimentos! Mas se cada um de nós pudesse ter um vislumbre dos seus anos futuros, como podemos fazer em relação aos anos passados, como ficariam alarmados os que só podem ver com alguns anos de antecedência e como seriam cuidadosos a utilizá-los!
Não há Sabedoria sem Esforço
Certos vĂcios, temos o hábito de atribuĂ-los aos condicionalismos do lugar e do tempo, mas o certo Ă© que, para onde quer que vamos, esses vĂcios nos acompanham. (…) Para quĂŞ iludirmo-nos? O nosso mal nĂŁo vem do exterior, está dentro de nĂłs, enraizado nas nossas vĂsceras, e, como ignoramos o mal de que sofremos, sĂł com dificuldade recuperamos a saĂşde. E mesmo que já tenhamos iniciado o tratamento, quando nos será possĂvel levar de vencida a enorme virulĂŞncia de tĂŁo numerosas enfermidades? Nem sequer solicitamos a presença do mĂ©dico, quando afinal Ă© mais fácil tratar uma doença ainda no inĂcio. Almas ainda frescas e inexperientes obedecem sem tardar a quem lhes indique o justo caminho. SĂł Ă© difĂcil reconduzir Ă via da natureza quem deliberadamente dela se apartou. Parece que temos vergonha de aprender a sabedoria! Pelos deuses, se acharmos que Ă© vergonhoso buscar um mestre, entĂŁo podemos perder a esperança de obter as vantagens da sabedoria por obra do acaso. A sabedoria sĂł se obtĂ©m pelo esforço.
Para dizer a verdade, nem sequer é necessário grande esforço se, como disse, começarmos a formar e a corrigir a nossa alma antes que as más tendências cristalizem. Mas mesmo já empedernidas,