É o Hábito Que Nos Persuade
É preciso nĂŁo nos conhecermos mal: somos autĂłmato, tanto quanto espĂrito, donde resulta que o instrumento pelo qual se faz a persuasĂŁo nĂŁo Ă© unicamente a demonstração. QuĂŁo poucas sĂŁo as coisas demonstradas! As provas nĂŁo convencem senĂŁo o espĂrito. O hábito dá-nos provas mais fortes e mais crĂveis; inclina o autĂłmato, que arrasta o espĂrito, sem que ele o saiba. Quem demonstrou que amanhĂŁ será dia, e que morremos? E que existirá de mais crĂvel? É, portanto, o hábito que nos persuade; Ă© ele que faz tantos cristĂŁos, que faz os maometanos, os pagĂŁos, os artesĂŁos, os soldados, etc.
Enfim, Ă© preciso recorrer a ele depois de o espĂrito ter visto onde está a verdade, para nos dessedentar e nos impregnar dessa crença que nos escapa a todo o momento; pois ter as provas sempre presentes Ă© por demais penoso. É mister adquirir uma crença mais fácil – a do hábito -, que, sem violĂŞncia, sem artifĂcio, sem argumento, nos faz crer nas coisas e predispõe todas as nossas faculdades para essa crença, de sorte que a nossa alma nela mergulhe naturalmente.NĂŁo basta crer pela força da convicção, quando o autĂłmato está predisposto a crer o contrário. É preciso fazer com que as nossas duas partes creiam: o espĂrito,
Textos sobre EspĂrito de Blaise Pascal
2 resultadosO EspĂrito Coxo
Porque será que um coxo nĂŁo nos irrita, e um espĂrito coxo nos irrita? Porque um coxo reconhece que andamos direito, enquanto um espĂrito coxo diz que somos nĂłs que coxeamos; se assim nĂŁo fosse, terĂamos pena e nĂŁo raiva. Epicteto pergunta com muito mais força: «Porque Ă© que nĂŁo nos zangamos se se diz que nos dĂłi a cabeça, e nos zangamos se se diz que raciocinamos mal, ou que escolhemos mal?». 0 que origina isto Ă© o estarmos certos de que nĂŁo nos dĂłi a cabeça e de que nĂŁo somos coxos; mas nĂŁo estamos assim tĂŁo seguros de que escolhemos a verdade. De maneira que, nĂŁo estando certos senĂŁo porque o vemos com os nossos olhos, quando outro vĂŞ com os seus olhos o contrário, pomo-nos em suspenso e espantamo-nos, e ainda mais quando mil outros se riem da nossa escolha; pois Ă© preciso preferir as nossas luzes Ă s de tantos outros, o que Ă© temerário e difĂcil. Nunca há esta contradição no que concerne a um coxo.